Luanda - O Estado de Direito é uma conquista das revoluções liberais que varreram a Europa e os Estados Unidos na segunda metade do século XVIII.

Fonte: JA


Mas a coisa já vinha de trás. Ou seja, as concepções filosóficas que vão sustentar mais tarde o pensamento liberal que serve de alimento às revoluções liberais começa a desabrochar a partir do século XVII.


John Locke, o barão Charles-Louis de Montesquieu e Jean Jacques Rousseau vão ser os expoentes das ideias que nessa época impulsionam o surgimento do Estado Liberal de Direito.


A revolução francesa (1789-1799) vai marcar de modo indelével esse período em que se põe em causa o poder absoluto do Rei. “Eu quero, eu posso, eu faço, o Estado sou eu”, era a divisa das monarquias absolutas.
O Estado de Direito aparece precisamente como contestação a esse tipo de pensamento e como resultado de várias técnicas jurídicas de limitação do poder político em benefício de um conjunto de direitos reconhecidos ao cidadão, nascidas com o constitucionalismo moderno.


Desse rasgo de inspiração, vale referir aqui a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, votada pela Assembleia Nacional francesa, em que se proclama que “Qualquer sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos, nem estabelecida a separação dos poderes, não tem Constituição”.


O Estado Liberal de Direito evoluiu para o Estado Social de Direito e este deu lugar ao Estado de Direito Democrático, fruto das diversas situações políticas e sociais que o homem foi vivendo e para as quais foi encontrando soluções mais condizentes com os seus interesses. As designações traduzem essa preocupação mas, o mais importante, e que importa sublinhar, é que o Estado de Direito, hoje em dia, postula a democracia representativa e pluralista.


O império da lei, a separação de poderes (legislativo, executivo e judicial), a legalidade da administração e a garantia jurídico-formal e efectiva realização material dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos, são os requisitos para que se possa dizer que estamos em presença de um Estado de Direito.


Todavia não basta que esses requisitos estejam formalmente estabelecidos para se ter o Estado de Direito. A sua realização no plano material é condição para que o Estado de Direito possa realmente ter vida própria. É nesse campo que ganha vitalidade e vai, de modo natural, plantando os seus valores e moldando a sociedade àquilo que são os seus princípios.


Ora, dito de outra maneira, os cidadãos precisam sentir no seu dia-a-dia a existência do Estado de Direito. E isso porque todos os dias se colocam aos cidadãos problemas aos quais esse mesmo Estado tem de dar resposta. E os problemas tendem às vezes a ser maiores quanto maiores forem as dificuldades económicas.


É bom dizer que este novo ciclo político nasce com a promessa feita pelo Presidente da República de a Justiça jogar um papel de relevo na moralização do sistema social, político e económico e capaz de responder aos grandes desafios do combate à corrupção e à impunidade.


Com efeito, temos estado a assistir, quer a Procuradoria-Geral da República quer os Tribunais, a pautarem a sua actuação por uma maior intervenção. O tratamento de casos que antes fugiam da sua alçada dá bem a ideia da importância que o sistema judicial joga no âmbito da reforma do Estado e da criação de um novo ambiente social e político (e até mesmo económico), mais de acordo com os fundamentos de um Estado de Direito.


A constituição de arguidos, a notificação do cidadão para prestar declarações, o julgamento de réus envolvidos no cometimento de infracções criminais, sendo alguns desses casos de grande visibilidade mediática e cujas sentenças, por isso mesmo, têm o condão de produzir na sociedade o sentimento de que, mais do que ter sido feita justiça, a Justiça está realmente a funcionar e as coisas estão a entrar, aos poucos, nos eixos, não podiam ser senão a melhor forma de o sistema judicial se posicionar e transmitir à sociedade, com firmeza, que estamos a construir um novo paradigma.


Aos operadores da justiça, tal como aos de outras áreas de prestação de serviços para bem servir o cidadão, de acordo com o que estabelece a lei - é disso que trata o Estado de Direito -, têm a obrigação de instituir, pelo seu trabalho e pelo seu exemplo, uma nova cultura jurídica, de que o país tanto carece para se refazer das práticas que foram corroendo a autoridade estadual.


O Estado de Direito Democrático não é um ente destinado a produzir apenas benefícios, é também e acima de tudo um colectivo ao qual é preciso prestar contas regularmente, como resultado dos compromissos que cada indivíduo tem para com o mesmo.


PS: Uma falha na verificação ortográfica do texto da semana passada levou a deixar passar a expressão “radicalismo geográfico ou territorial”, quando o correcto é “gradualismo geográfico ou territorial”. Coisas do “computador inteligente”, que “põe na nossa boca (entenda-se sugere para o texto)”, palavras que não queremos ou quereríamos dizer, apesar da insistência em eliminá-las…


* Director Nacional de Publicidade. A sua opinião no engaja o Ministério da Comunicação Social