Luanda - Um Filosofo Venezuelano, Rodríguez, mestre do Simon Bolívar (1783-1830) que andava sempre com um exemplar do Émile de Rousseau no bolso e toda a sorte de panaceias políticas e sociais na cabeça, caracterizava a pessoa humana em duas dimensões contraditórias, sendo: “A santidade do corpo e a estupidez do espírito humano.” Neste contexto, para demostrar a santidade do seu próprio corpo aos estúpidos espíritos dos contemporâneos, de vez em quanto aparecia em público ao natural.


Fonte: Club-k.net

 

Acima de tudo, o Filosofo Rodríguez ensinava o Simon Bolívar a essência de possuir o Corpo saudável para uma luta espiritual na arena da vida. Para o efeito, era imperativo pautar por uma preparação antecipada, por um trabalho aturado e por uma visão objectiva, transparente e equilibrada. Cuidar-se do paradoxo entre a ética e a vida real. Aperceber-se bem da problemática do princípio de dois pesos e duas medidas que caracteriza a impostura da natureza humana. Tendo em conta a sua natureza intrínseca que separa, de certo grau, o Pensamento, a Moral e a Prática. A pessoa humana é uma incógnita dentro de si; tendo apenas uma ínfima parte da sua consciência que deixa transparecer ao seu meio ambiente.

 

De todas formas, os factores internos de um fenómeno é que determinam a sua transformação, conjugados com as circunstâncias envolventes. O rigor de carácter do Rodríguez e a profundeza da sua sabedoria o levava a fazer ensaios e exercícios sociopsicológicos a fim de apurar a idiossincrasia da ética e da moral espiritual da sociedade contemporânea. Aliás, ele era tratado, em certos círculos, de utopista meio maluco, vagabundo filosofo, percursor do nudismo. Na realidade, a nudeza, o estado natural da pessoa, na vida privada, reflecte o íntimo da ternura e da paixão mais intensa do amor entre a mulher e o homem. Na praia a pessoa humana comporta-se de forma diferente; enquanto numa Gala a sua postura é outra. Dupla Personalidades encarnadas na mesma Pessoa – Contradizendo-se diametralmente.

 

Reunindo em torno de si um grupo de jovens audaciosos, o Rodríguez tivera tornado num constante incomodo e numa inquietação para os convencionais Magistrados e Negociantes de Caracas. A sua Visão da vida, embora contraditória, revela um certo grau de realidade que vivemos diariamente neste Mundo quanto aos Valores e aos Ideais da Cultura moderna. Pois, o Homem tem a fragilidade mental que sempre o leva ao egocentrismo, violando os Direitos e Liberdades dos outros. Convinha tirarmos uma Lição do Rodríguez para sermos justos para connosco mesmos. Isso significa que, não façamos aos outros aquilo que nós próprios não gostássemos que os outros nos fizessem.

 

No dia 29 de Abril de 2011, o Tribunal de Recurso de Paris passou a Sentença que pôs termo ao Processo de Angola Gate. Tendo reduzido as penas do Pierre Falcone e do Arcady Gaidamak, ambos mentores do tráfico de armas para o Regime de Luanda, em flagrante violação do Embargo de armas para (ambas partes) Angola, decretada, na altura, pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas.

 

Este acontecimento foi recebido de júbilo e de festejos na Classe Governante de Luanda. Clamando por um reparo, em termos de indemnização, pelos danos morais causados ao Regime, sobretudo à imagem do Presidente da República, Eng. José Eduardo dos Santos. Seja qual for, esta Sentença demonstra, mais uma vez, a eficácia do Poder Judiciário Francês e a sua independência dos Órgãos Legislativo e Executivo; numa clara afirmação de um Estado Democrático e de Direito. Confirma o Princípio da Supremacia da Lei e da Igualdade de toda gente perante ela. Neste caso específico, assistimos a condenação do Estado Francês pelo seu próprio Órgão de Soberania – a Justiça.

 

Se formos justos para connosco mesmos, então tenhamos cautela nas nossas críticas contra o Estado Francês. É natural, num Processo Judicial, quem perde a Causa, deve acarretar consequências deste género. Mas, devemos reflectir um pouco, se o que acabou de acontecer com a Justiça Francesa é possível isso acontecer em Angola? Condenar o Estado Angolano a favor de um Sujeito Estrangeiro! A nossa Justiça terá Autonomia, Poder e Audácia suficiente para tomar uma Decisão, tão complexa, como esta? Num País cujo Recorde em termos da Justiça e de Direitos Humanos é dos piores do Mundo!


Ora bem! A França levou à Barra dos Tribunais, os Dirigentes Francês, apanhados neste Processo que envolveu grandes somas de dinheiro. No meio disso figurava dois Agentes, Pierre Falcone e Arcady Gaidamak, com múltiplas nacionalidades, ao serviço de muita gente, nos Negócios obscuros de tráfico de armas no Mercado Internacional, com dimensões complexas. O Governo Angolano abraçou esses indivíduos duvidosos e que projectou como heróis da Pátria Angolana, pelos serviços prestados na violação do Embargo de Armas para Angola, decretado pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas.

 

Convinha reconhecer o facto de que, em todo percurso da Guerra Civil Angolana, a Soberania e a Integridade Territorial de Angola nunca fora posta em causa pelos três Beligerantes. Pois, Angola encontrava-se em plena Guerra Civil desde 1975, entre os irmãos desavindos. Em busca da paz e da reconciliação nacional, o Conselho de Segurança das Nações Unidas decretou o Embargo de armas às ambas partes do conflito armado. A França é Membro Permanente do Conselho de Segurança da ONU. Não ficaria com as mãos cruzadas perante a violação do Embargo.

 


Na verdade, naquela altura, as armas afluíram aos dois Beligerantes, vindo de origens diversas, em violação flagrante do Embargo. Logo, se as armas não passaram fisicamente pela França; a verdade é que uma soma avultada de dinheiro tivera o itinerário da Embaixada Angolana em Paris, que se destacava de pivô das Operações. Todo mundo que acompanhou de perto este Processo sabe muito bem desta realidade. Não basta o exercício de mistificação e manipulação dos factos. O Conceito da Soberania da Idade Média, do Absolutismo, não funciona Hoje. Os Cidadãos, individual ou colectivamente, têm o Direito de fazer Recurso ao Princípio sagrado de Autodefesa. É neste contexto que a UNITA fez Recurso à Resistência Armada contra o Sistema Totalitário.

 

Desde 1975 o País tivera sido mergulhado na Ditadura do Partido Único, que baniu outros dois Movimentos (FNLA &UNITA) de Libertação Nacional. O Multipartidarismo e o Regime Representativo através do sufrágio universal directo, consagrado nos Acordos de Alvor, foram anulados arbitrariamente. Graças à Resistência dos Angolanos que está tornando possível conquistar paulatinamente os Ideais democráticos, obstinadamente combatidos pelo MPLA.

 

O que assistimos, neste Processo, é uma palhaçada que ridiculariza a nossa própria imagem perante o Mundo. Angola tem um Recorde crítico de violação dos Direitos Fundamentais do Homem. A nossa Lei não tem eficácia em termos de Igualdade de todos Cidadãos perante ela. A Lei apenas serve os interesses da Classe governante. Quanto se trata dos súbditos, ela recua e declina-se injusta e arbitrariamente. A Justiça Angolana é privatizada e dominada por uma Pessoa que exerce todos Poderes dos três Órgãos de Soberania do Estado, centralizados e concentrados nele. Ele passa por cima de todos.

 

Os Juízes têm as mãos atadas e submetidos aos ditames do Comité de Especialidade de Juristas, politicamente orientado e conduzido pelo MPLA. Os Processos complexos, que envolvem o Estado, as suas decisões são previamente decididas neste fórum, do qual emana as recomendações ao Presidente do MPLA, que por sua vez dita as Regras do Jogo. A Liberdade e Autonomia de Acção dos Juízes, dos Magistrados e dos Advogados são bastante questionáveis. Há uma espécie de conluio entre esses na tramitação e no julgamento dos Processos.

 

O Princípio de detenção antecipada como forma de inquirir e imputar crimes contra inocentes faz parte da Doutrina Jurídica do Regime Angolano. A Lei Preventiva não é respeitada; em determinadas circunstâncias ela serve apenas de instrumento para prender, molestar e castigar os inocentes. A celeridade da Justiça não é tida em conta e os detidos padecem nas cadeias fora dos prazos estabelecidos pela Lei. Muita gente tem estando a sucumbir-se nas Cadeias sem julgamento e sem culpas formadas. No fim das Prisões injustas, o Estado não procede ao reparo e à indemnização pelos danos morais e físicos causados pelas Autoridades.

 


A Lei de Imunidades é discriminatória na sua efectivação. Se não pertencer à Classe dominante o usufruto dela é bastante restringido. O nosso Regime Político é semelhante ao Sistema Colonial Português, quanto à protecção da Lei às diversas Comunidades socioculturais prevalecente no País. Em pleno exercício de funções, se não for membro do Partido no Poder, como usufrutuário de Imunidades pode ser detido e encarcerado, sem estar na condição de flagrante delito e sem passar pelos trâmites legais. A Assembleia Nacional, por exemplo, apenas desempenha o Papel paliativo, sem a capacidade institucional de exercer o Papel de Checks and Balances, como um Mecanismo de Contrapoder e de Equilíbrio.
Na verdade, em Angola debate-se com a Injustiça e com Crimes hediondos praticados pelo próprio Estado contra os seus Cidadãos. Quanta gente foram assassinados barbaramente pelos Agentes do Estado sem trazê-los às Barras da Justiça? Quantos Processos judiciais ficam nas Gavetas indefinidamente sem merecer Justiça? Quantos Casos de violação dos Direitos Humanos que anda por aí sem ser prestados devidos tratamentos?


No fim de contas, a Sentença do Tribunal de Apelação de Paris, no caso de AngolaGate, constitui para o Governo Angolano uma faca de dois gumes. Aliás, representa um grande desafio para as Autoridades da Justiça Angolana. Haverá, nesta fase, uma mudança significativa no perfil da Justiça em Angola no que diz respeito a igualdade, a humanização, a autonomia, a transparência, a imparcialidade, a eficácia e a celeridade da tramitação dos processos?

 

O cerne do problema reside no seguinte, após 32 Anos consecutivos no Poder, o Presidente José Eduardo dos Santos não terá a vontade política de fazer Reformas profundas da Doutrina política que ele próprio inspirou e edificou. Para que isso seja viável terá que desmantelar os Pilares fundamentais do Sistema Totalitário que prevalece, a fim de despartidarizar as Instituições Publicas, nos moldes da Democracia multipartidária, representativa e participativa. Só assim que tornar-se-á viável a Separação efectiva dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Sem isso, a Justiça Angolana não poderá libertar-se do jugo do Poder político actual. 


No entanto, Angola terá que ainda trilhar um caminho difícil e sinuoso até que o Advento da mudança que sopra pelo Mundo venha afirmar-se implacavelmente no País. A indemnização que virá de Paris é bem-vinda. Pode ser um sinal positivo que poderá chicotear as nossas consciências sobre a essência deste facto: Cada pessoa humana lhe cabe o direito de exigir o Reparo e a Indemnização quando os seus Direitos e Liberdades fundamentais estiverem violados pelo Estado.

 

Nestes termos, o Governo Angolano tem em sua frente grandes desafios por transpor de modo a poder melhorar o perfil da sua imagem desgastada por imensas irregularidades. Enquanto isso, as Mentes clarividentes dos Angolanos estarão sempre empenhados na busca da dignidade humana e no combate contra o culto de personalidade, a arbitrariedade, a impunidade e a injustiça social que estão na origem do estado crítico da pobreza, da fome, da corrupção e da segregação social, económica, cultural e política.


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