Lisboa - Solidariedade e democracia foram duas palavras muito repetidas na “vigília por Angola” que, ao final da tarde desta quarta-feira, juntou cerca de 50 pessoas no Rossio, em Lisboa. “O objectivo não era ter muita gente”, era “despertar consciências” e impedir que os recentes acontecimentos no país degenerem em mais violência.

Fonte: Publico

“Não podemos deixar que o nosso silêncio permita banhos de sangue em Angola”, disse ao PÚBLICO Jorge Silva, vice-presidente da associação Solidariedade Imigrante, uma das entidades organizadoras da vigília. “Está na hora de José Eduardo dos Santos e o MPLA respeitarem os direitos democráticos do povo angolano.”

 

A 3 de Setembro, reivindicações idênticas nas ruas de Luanda levaram 18 pessoas a serem detidas e mais tarde condenadas a penas de prisão de 45 dias a três meses, por desobediência, resistência e ofensas corporais.

 

”O MPLA pode manifestar-se, mas um punhado de jovens faz tremer o regime ao ponto de o fazer usar uma violência desmedida”, lamentou Jorge Silva. “É importante erguer a nossa voz para que em Angola não se continue a reprimir. As manifestações têm de se fazer antes de haver um banho de sangue – e não depois”, observou.

 

As prisões “não foram um bom sinal”, sublinha José Eduardo Agualusa. O escritor angolano, que esteve no Rossio, alertou para a “possibilidade duma explosão de violência, grande e descontrolada”. “Angola é mais instável do que era a Líbia ou o Egipto. A situação é mais dramática – o fosso [entre ricos e pobres] é maior.”

 

José Eduardo Agualusa acredita que há algumas semelhanças com os países das revoltas árabes. Eduardo dos Santos (o líder há mais anos no poder, 33), defendeu, “ainda vai a tempo de abandonar o poder com dignidade, preservando a sua fortuna pessoal e contribuindo para o desenvolvimento do país como empresário”.

 

A Portugal, o escritor não poupou críticas: “Tem sido sempre muito tímido. Porta-se, desde sempre, muito mal. A posição de Portugal é de grande submissão ao regime angolano. Agora, mais ainda”. Agualusa refere-se às crescentes relações comerciais da “sociedade civil” com Angola. O que, diz, constitui “uma postura idiota”.

 

“Se houve algo que as revoltas na Líbia, no Egipto e na Tunísia nos mostraram, foi que as ditaduras não são assim tão estáveis. E talvez não sejam o lugar mais apropriado onde investir”, avisa. “Não há sequer a tentativa de perceber o que se está a passar em Angola. A cegueira é absoluta.”


“Contra isto é muito difícil lutar”


A associação Solidariedade Imigrante e José Eduardo Agualusa foram apenas dois dos responsáveis pela vigília desta quarta-feira. A lista de promotores conta ainda com Os Amigos do Bloco Democrático em Portugal, a Associação Tratado de Simulambuco – Casa de Cabinda e a SOS Racismo. Mas alguns dos panfletos distribuídos foram deliberadamente adulterados.


“Alguém pegou nos panfletos e manipulou-os: retirou a Solidariedade Imigrante e introduziu o nome do Rafael Marques. E enviou-os assim, por e-mail”, contou Jorge Silva, sugerindo ao PÚBLICO que o autor da falsificação a fez de má-fé. Rafael Marques, activista e jornalista angolano, telefonou esta manhã a Jorge Silva a pedir explicações, que lhe disse tratar-se de uma manipulação alheia à organização da vigília.

 

Ao lado do vice-presidente da Solidariedade Imigrante, uma mulher desabafou: “Contra isto [estes actos de sabotagem] é muito difícil lutar”.