Huambo - A detenção do adminis¬trador municipal do Huambo, José Luís de Melo Marcelino, ocorrida no passado dia 27 de Setembro, na capital do Planal¬to Central, terá decorrido de um «excesso de zelo» por parte das autoridades judiciais locais. Fontes convergentes revelaram esta semana ao Semanário Ango¬lense que a detenção do edil mu-nicipal terá sido feita no seu local de trabalho, e não no local onde estava a ser executada a obra ile-gal que tinha sido objecto de em¬bargo, conforme foi noticiado.


Fonte: SA

Uma versão que, a confirmar-se, arreda o argumento segundo o qual a prisão de José Marcelino decorreu em flagrante delito, ou seja, quando este procedia à de¬molição da obra em causa.
Tanto a agência de notícias Angop, como o semanário «O País», que divulgaram a notícia de forma lacónica, não fizeram nenhuma alusão ao facto da obra em causa ser pertença de um juiz municipal afecto ao tribunal local e que estava a ser erguida num espaço público. Ou seja, no pa¬vilhão multiuso n.º 2, erguido no âmbito do Afrobasket em 2007.


Não se sabe quais as razões que levaram à omissão do rosto do proprietário da obra. Mas, para que conste, aí vai: trata-se de Or¬lando Rodrigues Lucas, um (qua¬se) jurista afecto à magistratura judicial, que é ainda estudante (finalista) do curso de Direito.


No entanto, é sabido que os magistrados judiciais ou do Mi¬nistério Público no exercício ple¬no das suas funções estão por lei impedidos de exercerem outras actividades com fins lucrativos, além da docência.
Segundo as fontes deste jornal, o administrador municipal terá sido detido na tarde desse dia, a coberto de um mandado de cap¬tura, quando se encontrava no seu local de trabalho.

“Tudo aconteceu por volta das 15 horas e 30 minutos, quando o administrador recebeu a or¬dem de prisão no seu local de trabalho, com base num man¬dato de captura, no qual consta¬va apenas o seu nome e o crime de que era acusado. A voz de prisão foi-lhe ditada por um elemento da Polícia Nacional, com a patente de sargento, que se fazia acompanhar por três indivíduos à paisana, que, en¬tretanto, não se identificaram. De seguida, o Eng.º Marceli¬no foi posto num carro civil, de marca Getz, de cor preta, e em seguida conduzido direc¬tamente à comarca”, revelou uma testemunha ao SA, que pediu o anonimato.


No Huambo, em alguns círculos, medra a convicção de que a detenção do admi¬nistrador municipal terá sido feita no sentido de humilhá-lo em praça pública, já que o crime pelo qual era acusado dava-lhe a possibilidade de responder judicialmente em liberdade.
Crê-se nos mesmos círculos que a detenção e o posterior julgamento do edil munici¬pal teriam sido perfeitamente evitáveis, por se tratar de um detentor de um cargo público, com residência fixa e ser uma figura bem referenciada na província.


Questiona-se também se o assunto teria tido o mesmo desfecho caso estivessem em jogo interesses de anónimos cidadãos, sobretudo dos desca¬misados, que, amiúde, não têm sido poupados pelo camartelo demolidor das distintas admi¬nistrações municipais.


Uma leitura que é adensada pelo facto do réu ter sido obri¬gado durante o julgamento a usar a farda dos serviços pri¬sionais, o que, no entender das fontes deste jornal, «contradiz o pressuposto que toda a pessoa é considerada inocente até que se prove a sua culpa».


«O crime de que ele ia acu¬sado podia ser convertido em multa, pelo que julgo ter exis¬tido um excesso de zelo, senão mesmo abuso de autoridade», afirmou um jurista contacta¬do a propósito pelo SA, mas que proferiu falar na condi¬ção de não ser identificado. Diz ainda a testemunha que não se permitiu sequer que o responsável camarário fizes¬se um telefonema antes de ser levado para a prisão, algo que só aconteceu depois de muita insistência da parte do visado.


No entender de um juris¬ta contactado em Luanda, o caso pareceu-lhe ter tomado contornos particulares, tendo em conta que não terão sido levados em consideração o facto de o administrador ser o representante de uma pessoa colectiva (o Estado angolano) contendendo com uma pessoa individual (o dono da obra). Nesta base, o Estado não podia deixar de ser ouvido, visto ser, por direito, o proprietário ori¬ginário da terra, segundo o n.º 8 do artigo 5.º da Lei de Terras.


José Marcelino foi condenado a 60 dias de pena suspensa, por alegado cometimento de crime de desobediência às ordens da autoridade pública, previsto e punível nos termos do artigo 188 do Código Penal.