Luanda - Anunciada em primeira mão pelo semanário A Capital, há pouco mais de duas semanas, a decisão de Abel Chivukuvuku de deixar a UNITA já parece irreversível. Dir-se-ia que a sua partida está, apenas, “presa” por um pequeno detalhe: o seu anúncio formal. Tanto o semanário A Capital quanto os outros órgãos de imprensa, que retomaram a matéria, dão como certo que o próximo poiso de Abel Chivukuvuku serão os Partidos da Oposição Civil (POC), um conglomerado de partidos políticos sem representação parlamentar. Chivukuvuku deverá ser o rosto dessa coligação nas próximas eleições presidenciais.


*ALFREDO MUVUMA
Fonte: Makaaangola

Analise de Maurílio Luiele

O médico e professor universitário Maurílio Luiele , um antigo membro da Comissão Política da UNITA, vê a próxima deriva de AC para os POC como mais um “movimento errático que Abel Chivukuvuku protagoniza e que, a concretizar-se, vai certamente marcar negativamente a sua carreira”. A partir do Rio de Janeiro, onde está a fazer o Doutoramento na área de Educação em Biociências, Maurílio Luiele respondeu por e-mail a um curto questionário que o Maka Angola lhe enviou a respeito de uma ruptura que deixará marcas na UNITA.

 

Maka Angola: Como interpreta a iminente saída de Abel Chivukuvuku? Ele procura uma alternativa à UNITA ou persegue uma ambição pessoal?


ML: Ainda não tenho uma informação, digamos mais oficial, sobre o assunto. Contudo, o comunicado da reunião do Secretariado Executivo do Comité Permanente da UNITA, que se pronuncia sobre alianças ou cooperação com outros partidos, deixa subentendido que terá havido uma movimentação substancial nos bastidores da oposição que pode estar relacionada com Abel Chivukuvuku. Esse comunicado também considera o apelo de Alberto Neto no sentido da oposição se aliar em torno de um único candidato. Por outro lado, os rumores são cada vez intensos sendo por isso estranho o facto de AC não ter feito nenhum pronunciamento público a respeito até ao momento, o que é, talvez, outra das suas artimanhas políticas tão mal sucedidas ultimamente.


Maka Angola: Que impacto essa ”deserção” terá no interior da UNITA?

ML: Pode ser que a informação seja um acto de desinformação da situação visando abrir uma brecha na aparente coesão da UNITA, saída do XI Congresso. Porém, o silêncio de Abel Chivukuvuku seria o primeiro argumento contra esta hipótese. Mas a ser verdade, ela significaria que Abel Chivukuvukuestá dando vazão à sua velha ambição pessoal de concorrer à Presidência da República, fruto de avaliações que o catalogam como muito popular, líder forte e, portanto, com grandes chances de suceder a José Eduardo dos Santos. . Porém, este movimento de Abel Chivukuvuku embute, a meu ver, mais um erro de cálculo político dos muitos que têm contribuído para ofuscar o seu brilho nos últimos anos. É mais um movimento errático que Abel Chivukuvukuprotagoniza e que, a concretizar-se, vai certamente marcar negativamente a sua carreira.


Maka Angola: A saída deAbel Chivukuvuku, quando se aproximam as próximas eleições, não é um golpe demasiado duro contra a UNITA?

ML: A estrada de Abel Chivukuvuku à Presidência da República estaria mais facilitada se ele tratasse de consolidar a sua condição de líder no seio da UNITA. Isso implicaria coabitar habilmente com Isaías Samakuva e tornar a sua posição suficientemente madura para se converter em sucessor natural deste, oito anos depois. Porém, politicamente, Abel Chivukuvukuagiu de forma precipitada acumulando erros de cálculo que o colocaram precocemente em rota de colisão com IS e fragilizaram a sua condição de líder no seio da UNITA. A título de exemplo, apoiantes de peso de Abel Chivukuvukuna UNITA tais como Carlos Morgado, Urbano Tchassanha, Morais Vieira, Adelino António, Milu Tonga e Tchicolomuenho (estes últimos representando na prática a interface da UNITA com a Igreja Católica), para só citar esses, acabaram afastados ou auto-afastaram-se da direcção da UNITA, sem que houvesse um gesto, por parte de AC, para impedir esse afastamento. Desta forma, embora Abel Chivukuvuku continue alçado aos altos escalões de direcção da UNITA (Comité Permanente) tem, na verdade, um suporte reduzido, ou melhor, fragilizado.

 

Maka Angola: Vê alguma identidade ideológica entre Abel Chivukuvukue a coligação de partidos que ele representará?

ML: Considero que Abel Chivukuvuku, a apresentar-se como candidato à Presidência da República pelos POC, estaria a causar o seu próprio retrocesso. Apesar das circunstâncias actuais colocarem a UNITA em posição incómoda, este partido continua a ter uma boa base de militantes. Na realidade, com campanhas bem conduzidas e por uma daquelas coisas surpreendentes que só a política explica, a UNITA tem hipóteses muito maiores de se constituir em alternativa ao MPLA. Os POC, por seu turno, apesar da infinidade de partidos que reúne, não foi sequer capaz de viabilizar a sua participação nas eleições de 2008. Não me parece que esta realidade tenha mudado muito em 2011. O peso político dos POC está, na verdade, muito próximo do zero.


Maka Angola: A UNITA está preparada para perder quadros da valia doAbel Chivukuvuku?

ML: É óbvio que a saída de Abel Chivukuvuku para se apresentar como candidato à Presidência da República, pelos POC, abalaria muito a estrutura da UNITA, isso é indiscutível. Porém, não seria este o motivo que levaria a UNITA a sucumbir. A UNITA, em momentos cruciais da sua história, perdeu dirigentes do peso como Nzau Puna, Tony da Costa Fernandes, Jeremias Chitunda, Alicerces Mango, António Dembo, então seu vice-presidente, e o próprio Jonas Savimbi, seu líder fundador. Mas soube sempre, de alguma maneira, reerguer-se. A UNITA sofrerá, com certeza, com tamanho golpe, mas jamais sucumbirá. Na minha avaliação, Abel Chivukuvuku perderá muito mais se protagonizar tal gesto do que a UNITA, pois, corre o risco de ver seu brilho político desaparecer de vez. A UNITA, por seu turno vale, sobretudo, pelo seu peso histórico e a sua boa base de militantes de onde se extrairão continuamente líderes capazes de mantê-la na prossecução de seus inatacáveis objectivos.


Maka Angola: Isaías Samakuva não é uma barreira intransponível para as ambições políticas de Abel Chivukuvuku?

ML: Abel Chivukuvuku deveria talvez buscar inspiração em líderes como Deng Xiaoping, que mesmo tendo sido execrado por Mao Zedong por diversas vezes dos altos escalões do Partido Comunista da China (PCC) e tendo sobrevivido, a muito custo, à macabra revolução cultural de Mao, soube ressurgir das cinzas. Voltou ao topo do PCC, lançou as bases para as grandes reformas que actualmente projectam a China como superpotência internacional. Isso significa procurar reconstruir a sua condição de líder no seio da UNITA, inteligente e pacientemente, colocando-se em posição privilegiada para suceder a Isaías Samakuva . A sucessão de Isaías Samakuva acontecerá, muito provavelmente, num momento em que ocorrerão mudanças profundas na paisagem política do país e Abel Chivukuvuku deveria preparar-se para ser um protagonista nessa altura. Porém, com a série de movimentos erráticos que tem protagonizado, arrisca-se a ser um jogador suplente ou até mero espectador do momento político que se avizinha.


À laia de conclusão deixa-me contar-lhe o seguinte: fui mobilizado por Abel Chivukuvuku para apoiar a candidatura de Isaías Samakuva em 2003 (IX Congresso). Em 2007, votei em Abel Chivukuvuku, no X Congresso. Sou, por conseguinte, um admirador de Abel Chivukuvuku. Mas, tenho de reconhecer que, nos últimos anos, o Abel tem cometido demasiados erros nos seus cálculos políticos, e isso pode deitar por terra todas as hipóteses que ainda tem de um dia vir a ser Presidente da República.

 

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