Luanda - O tribunal de Luanda condenou hoje a oito e seis anos de prisão, Sónia Neves e Nilton Saraiva, respetivamente, e absolveu Mauro Gomes, todos ex-funcionários do Ministério da Saúde angolano, acusados de desviar financiamento internacional para combater a malária.

Fonte: Lusa

Na leitura do acórdão, o juiz José Cerqueira condenou ainda a ré Sónia Neves, de 44 anos, na altura responsável financeira da Unidade Técnica de Gestão do Fundo Global, à restituição ao Ministério da Saúde do valor de 197.580.000 kwanzas (754 euros), no pagamento de um milhão de kwanzas (3.820 euros), a título de indemnização, e 200.000 kwanzas (764 euros) de taxa de justiça.

No acórdão é condenado ainda o réu Nilton Saraiva, 53 anos, na altura coordenador-adjunto do Programa Nacional de Controlo da Malária (PNCM), ao pagamento de 500.000 kwanzas (1.910 euros) de indemnização e 200.000 kwanzas (764 euros) de taxa de justiça.

"Declara-se perdido a favor do Estado todos os bens apreendidos no seguimento dos presentes autos, por terem sido adquiridos com os valores monetários que deram lugar ao processo, devendo os mesmos serem devidamente avaliados financeiramente e o valor dos mesmos serem deduzidos ao montante a ser restituído pela ré Sónia Neves ao Ministério da Saúde", anunciou o juiz, na leitura do acórdão.

O caso remonta o ano de 2014, quando o Fundo Global tinha disponibilizado 189,2 milhões de dólares (153,8 milhões de euros) para o Governo angolano. Deste valor 95,4 milhões de dólares (77,5 milhões de euros) tinham como destino o controlo da malária, a principal causa de morte por doença em Angola.

O juiz referiu que em março de 2014 verificou-se o desvio de cerca de quatro milhões de dólares (3,2 milhões de euros), em resultado de transferências bancárias irregulares perpetrados pelos réus Sónia Neves, o seu esposo, Mauro Gomes, e Nilton Saraiva.

Segundo o juiz, apesar de "as exigências de reprovação e prevenção geral, seja de se levar em conta, porque o resultado da conduta dos réus é, de certa forma elevado", o tribunal decidiu, por não se tratar de um ilícito de sangue, uma medida não superior a dez anos ou oito anos de prisão maior, por considerar "excessiva" para qualquer um dos réus.

José Cerqueira disse que "os réus não são confessos, no fundamental não evidenciaram, de todo, nenhum arrependimento, com exceção do corréu Nilton Saraiva, que em última instância demonstrou algum sinal de arrependimento e o mesmo não se pode dizer com relação a ré Sónia Neves".

O desvio dos valores, que o Ministério da Saúde de Angola fez a devida devolução ao Fundo Global, colocando à disposição da Unidade Técnica de Gestão do Fundo Global o valor de 200 milhões de kwanzas (dois milhões de dólares, em setembro de 2014), ocorreu, segundo o tribunal, por via de transferências irregulares para empresas pertencentes aos restantes arguidos, que deveriam prestar serviços e fornecer materiais ao Programa Nacional de Controlo da Malária.

A defesa apresentou recurso, pelo que fica suspensa a sentença lida pelo tribunal, devendo, a pedido do Ministério Público, a ré Sónia Neves proceder ao pagamento de uma caução no valor de dois milhões de kwanzas (7.640 euros) e Nilton Saraiva um milhão de kwanzas (3.820 euros), no prazo de oito dias, para continuarem a responder em liberdade.

Em declarações à imprensa, o advogado José Luís Domingos, defesa do réu Nilton Saraiva, disse que já estava previsto interpor recurso, uma vez que os réus vinham acusados do crime de peculato, quando os mesmos não tinham à guarda ou poder material sobre os bens protegidos.

"É normal que a defesa inconformada com a sentença condenatória vai optar pelo recurso e está absolutamente convencida de que os tribunais superiores vão alterar este quadro, porque esta condenação não encontra, a nosso ver, respaldo no direito vigente", disse.

Por sua vez, o advogado Martins Paulo Cristina, da arguida Sónia Neves, considerou excessivo o valor determinado para o pagamento da caução, salientando que a defesa também já previa interpor recurso, decisão que satisfaz parcialmente a defesa.

"Porque ainda temos argumentos a esgrimir no decurso das alegações que vamos apresentar ao supremo tribunal", referiu.