Brasil  - A mais recente denúncia feita pelo senhor Ectiandro da Cunha através do site informativo Club-k sobre o mau funcionamento do Cartão de Débito Kumbu (VISA) coincide com a realidade que está a ser vivida por muitos angolanos utentes do referido cartão. Ele teve a coragem de denunciar o que muitas pessoas estão a viver.


Fonte: Club-k.net

As falhas do Banco Sol estão a deixar centenas de angolanos titulares do Cartão Visa (Kumbu) e que se encontram no exterior do país por mais diversas razões, entre as quais negócio, férias e estudos, sem meios de subsistência para concretizarem os seus compromissos no exterior.


Na verdade, há algumas semanas que muitos utentes reclamam de descontos indevidos na utilização do cartão, de dinheiros depositados que não chegam integralmente aos destinatários e da não efectivação dos devidos reembolsos pelo Banco mesmo depois de efectuadas as devidas reclamações dos consumidores.


De acordo com as informações disponíveis, é muito dinheiro que está ser debitado estranhamente nos Cartões dos consumidores e o banco não está a assumir a sua responsabilidade nem sequer se dá o trabalho de fazer um esclarecimento público e honesto sobre o assunto. 


Esta realidade levanta um problema, que embora não se lhe preste muita atenção em Angola, hoje, no Estado de direito democrático e de economia do mercado, é extremamente importante: os Direitos do Consumidor.


Em Angola os Direitos do Consumidor têm dignidade constitucional e também existe uma Lei de Defesa do Consumidor – LDC- (Lei n.º 15/03).


No artigo 78.º, a CRA de 2010, reconhece que « O Consumidor tem direito à qualidade dos bens e serviços, à informação e esclarecimento, à garantia dos seus produtos e à protecção na relação de consumo».


De acordo com a LDC vigente em Angola é considerado consumidor « toda a pessoa física ou jurídica a quem sejam fornecidos bens e serviços ou transmitidos quaisquer direitos e que os utiliza como destinatário final, por quem exerce uma atividade económica que vise obtenção do lucro (art. 3.º, 1). Bem é qualquer objeto de consumo ou um meio de produção, móvel ou imóvel e Serviço é qualquer actividade fornecida no mercado de consumo mediante remuneração, inclusive às de natureza bancária, financeira, crédito e securitária excepto as decorrente das relações de carácter laboral (n.º 3 e 4).


Dito de outro modo, consumidor é toda a pessoa ou várias pessoas, empresas que compram bens ou serviços para uso próprio. Bem é qualquer objeto, quer seja carro, eletrodomésticos, casa, material de construção, terreno, etc. Serviço é qualquer trabalho prestado mediante pagamento, incluindo serviços públicos, bancários, financeiros, seguros, como por exemplo, telefonia, créditos, buffet, televisão por satélite ou cabo (serviços de parabólica), educação, aviação, etc.


São direitos do consumidor a qualidade de bens e serviços, a protecção da vida, saúde e segurança física contra os riscos provocados por prática no fornecimento de bens e serviços considerados perigosos ou nocivos; a informação e divulgação sobre o consumo adequado dos bens e serviços; asseguramento à liberdade de escolha e a igualdade nas contratações, a protecção dos interesses económicos e contra a publicidade enganosa e abusivas;  a efectiva prevenção e reparação dos danos patrimoniais e morais individuais homogéneos, colectivos e difusos; a protecção jurídica, administrativa, técnica e a facilitação da defesa dos seus direitos em juízo. (Ar. 4.º da LDC).


Se olharmos a prática imperante em Angola desde os serviços prestados pelos bancos, universidade, empresas públicas prestadoras de serviços de água e luz; serviços de telefonia, diversões culturais e clínicas privadas até ao simples comerciante estrangeiro «que não aceita devoluções», cairemos numa espécie de sentimento de abandono. Os livros de reclamações não são valorizados. Os guichê do utente são meras formalidades.


Existem vários órgãos ou instituições de defesa do consumidor entre os quais DNCI, GIAC e o INADEC. O mais conhecido é o INADEC que com poucos meios humanos, financeiros e materiais têm procurado cumprir com o seu papel. Mas, o Executivo não lhe dá todas as condições necessárias para assumirem integralmente com as suas funções. 


Então porque muitas instituições privadas ou públicas não respeitam cabalmente os direitos dos consumidores? Porque não respeitam as recomendações (e quando são mesmo feitas) do INADEC ou dos respectivos institutos de supervisão?


Existem várias razões que justificam a adopção deste comportamento. Citarei apenas três razões nomeadamente a titularidade das empresas privadas, o fraco papel da Procuradoria e a falta de independência dos Tribunais; e o comportamento dos consumidores.


·        Titularidade das empresas: Tendencialmente empresas ligadas a titulares de titulares de cargos públicos - ministros, militares ou empresários ligados ao Chefe do Executivo e/ou sua família- são as que mais resistem a cumprir as decisões e recomendações dos órgãos competentes incluindo decisões judiciais.


·        Papel da Procuradoria e falta de independência dos Tribunais: Consequentemente quando existem processos em Tribunal, procuradores e juízes não agem com celeridade e escondem-se na morosidade processual para não responsabilizarem os infractores dos direitos do consumidor. Na realidade, estão a proteger os interesses dos titulares das empresas em causa.


Não são todos os juízes e procuradores, mas a maioria dos que têm sob sua responsabilidade processos ligados aos direitos dos consumidores agem de maneira dependente.


·        O comportamento dos consumidores: Muitos consumidores desconhecem os seus direitos e os que conhecem são passivos diante da violação dos mesmos. É necessário construir-se uma nova postura reivindicativa, defensiva e associativa da parte dos consumidores. Precisamos de consumidores com forte consciência crítica, capazes de se juntar em associações de defesa de interesses e de actuarem em boicote, quando necessário, contra os prestadores de bens e
serviços desonestos.

Finalmente, quanto à questão inicial, veremos como agirá o Banco Sol e qual será a postura do INADEC e das instituições de supervisão bancária.


Construamos cidadania!

António Ventura (Jurista)