Afirma, e com razão, o ex-Governador e agora Primeiro-Ministro de Angola, Paulo Kassoma

 Foi por causa dos milhões de dólares (Valentim Amões também contribuiu abrindo os cordões à bolsa) postos à sua disposição que conseguiu dar uma imagem mais digna ao Huambo e resgatar o orgulho dos locais, consubstanciado no facto de terem os seus cordões umbilicais enterrados no Planalto Central.

Estamos, pois, a falar do engenheiro que concedeu a sua última entrevista como governador do Huambo uma semana antes de ser nomeado para o cargo de Primeiro-Ministro pelo Presidente da República, José Eduardo dos Santos.

Falamo-vos, pois, de António Paulo Kassoma que, durante o seu consulado passou um atestado de incompetência à Sociedade Civil do Huambo. Pois só assim se compreende que quase todas (e mais algumas) iniciativas para o bem da urbe e dos seus habitantes tenham as "impressões digitais" do seu Executivo, tendo a Sociedade Civil primado pura e simplesmente pela ausência mesmo estando presente.

Eis, já a seguir, entrevista do último governador do Huambo que durante a II República deu vida à "Cidade Vida" e voltou a pô-la na berra (é isso mesmo, o Huambo é que está a dar; e quem disso tiver dúvidas, se não tiver telhado de vidros, que se levante e atire a primeira pedra!):

  Deixa o cargo de governador do Huambo com o sentimento do dever cumprido?
Com certeza. Cheguei ao Huambo num período que não era de guerra nem de paz. Era um período em que o Estado estava a estender a sua administração para algumas localidades então ocupadas pela UNITA. Um ano depois de assumir as funções de governador do Huambo a guerra recomeçou. Era preciso criar condições para receber os deslocados que vinham do interior da província. Era preciso satisfazer as suas necessidades básicas. Este período levou-nos a adaptar o nosso programa à realidade do momento até 2002 quando, felizmente, o País alcançou a paz. De 1997/8 a 2002 província vivia com um orçamento de três milhões por ano. Era um orçamento extremamente exíguo, mas a nossa principal preocupação era a protecção das populações. Para tal criamos um programa na altura denominado "Protege o Huambo", que era um casamento entre as acções militares e as acções de desenvolvimento de pequenas parcelas agrícolas, particularmente próximas das residências. A partir de 2002 a situação mudou. Hoje o programa está em velocidade cruzeiro. Isso permiti-me dizer que saio do Huambo com a cabeça erguida, com o sentimento do dever cumprido e a satisfação de deixar uma província estabilizada e em franco desenvolvimento.

A reconstrução das principais infra-estruturas deverá ter consumido – para além de milhões de dólares – muito suor, esforço e bastante sacrifício.
Com efeito. Tive a oportunidade de percorrer todos os municípios e comunas da província para fazer um levantamento exaustivo da situação dos efeitos da guerra. Isso facilitou grandemente as minhas decisões em termos de definição de prioridades para a execução local de acções de âmbito social. Fizemos um levantamento que nos dava um volume de reconstrução quase na ordem de um bilião de dólares. Este valor não contemplava as vias principais e as barragens. É claro que não conseguimos atingir este volume, mas pelo que realizamos ao longo destes seis anos de paz, estamos próximos da metade deste levantamento. Esta acção permite-nos dizer que mais três anos todas estas estruturas estarão totalmente reabilitadas com acréscimo de novos equipamento que foram incorporados neste plano.

Consta que aqui há cinco fazia-se duas a três horas do centro da cidade à Caála. Hoje este percurso faz-se em menos tempo. Estão assim todos os municípios?
A grande maioria dos municípios da província do Huambo estão localizados ao longo das vias primárias, aquelas que nos ligam às sedes das províncias vizinhas e a Luanda. Disse muito bem que aqui há cinco anos fazíamos 21 quilómetros em uma hora. Hoje faz-se em 15/20 minutos, fruto do cumprimento das orientações rodoviárias. Isto para dizer que está acontecer em todas as ligações com as sedes municipais. Há algumas que já estão concluídas, outras que estão em vias de conclusão. Mas até Março de 2009 teremos, com asfalto, a ligação de todas as sedes municipais com a capital da província do Huambo e com as capitais de províncias vizinhas. Temos duas sedes municipais que são ligadas por vias secundárias, que são Bailundo-Mungo e Caála-Ecunha. Neste momento estes troços estão em obras e poderão estar concluídos nos próximos seis meses.

O facto de ter uma boa parte das infra-estruturas erguidas e as vias rodoviárias reparadas não transforma o Huambo num alvo de cobiça por parte de empresários nacionais e estrangeiros?
Isso transforma o Huambo num privilegiado centro de desenvolvimento económico e social. Temos as principais estradas arranjadas. O caminho-de-ferro até Dezembro estará concluído, que é um grande sistema de transporte de matérias – primas. O caminho-de-ferro cria as condições para viabilizar qualquer projecto de desenvolvimento empresarial, particularmente industrial. Por essa razão, o Huambo já começa a sentir a presença de potenciais investidores nacionais e estrangeiros. O ano passado a Agência Nacional de Investimento Privado (ANIP) classificou o Huambo como a segunda província com o maior número de intenções de investimento. Estes investimentos estão virados para áreas como a da Hotelaria e Turismo. Há intenções de investimento na área de montagem de unidades de assistência de equipamento (tractores, camiões, etc.). Há também propostas de investimento na área agro-alimentar. As áreas da Hotelaria e a Agro-industrial são as que consomem maior volume de intenções de investimento.

Já se pode considerar o Huambo como "porto seguro" para o investimento privado?
De certeza absoluta. Nos primeiros meses de 2009 o Huambo vai sentir um volume muito grande de gente e investidores. Vai registar-se o regresso massivo de muitos naturais do Huambo que se deslocaram para outras províncias por motivos de guerra. Há muitas intenções de investimento na área da habitação. O Governo central pretende construir cerca de duas mil e quinhentas moradias. Regista-se um ligeiro atraso neste processo, mas tudo leva a crer que até Novembro de 2009 esteja concluído. Mas há projectos de investidores privados já aprovados e outros em via de aprovação. Estamos a trabalhar na área das reservas fundiárias que estão definidas para se concretizar estes investimentos.

Caála vai voltar a ser a "Rainha do Milho"

Caála já foi conhecido em tempos idos como "Rainha do Milho". Será que poderá voltar a ser conhecida como tal nos próximos tempos?
Isso está dependente da reconstrução da stockagem deste tipo de cereais. O Ministério da Agricultura e Desenvolvimento Rural (MINADER) está a trabalhar neste sentido. Ao longo do Caminho-de-Ferro de Benguela (CFB), tínhamos, no nosso território, quatro zonas de stockagem de cereais: a antiga Vila Nova, Tchicala-Tcholoanga, a Caála, o Longonjo e o próprio Huambo. Estes silos estão desactualizados. O MINADER tem um novo programa de construção de reservatórios de stockagem de cereais. Provavelmente ao longo do ano de 2009 este processo também esteja concluído para apoiar então a circulação ferroviária. Acontecendo isso, acontecendo também a facilidade de circulação dos produtores que nos liga ao Lubango, então Caála poderá voltar a ser conhecida como a "Rainha do Milho". "Rainha do Milho" não é só o volume de produção da região da Caála. É também o volume de produção da Caconda e Caluquembe (Huila), que se concentrava aqui nos stocks da região da Caála. Portanto, "Rainha do Milho" é, estatiscamente falando, a existência de reservas de cereais no território da Caála, mas que também eram provenientes de outros municípios da província da Huila. Neste momento sente-se uma intensidade de actuação dos produtores de milho, de forma que nos próximos três anos tenhamos este cereal em grande volume acompanhado também do trigo. Há uma aposta muito grande também no trigo. Isto vai fazer com que o volume de cereais não só na Caála mas em todo Huambo seja extremamente considerável nos próximos três anos.

O que é a Associação de Criadores de Gado e qual é o seu objecto social?
O Governo do Huambo tomou a decisão de criar o programa "Huambo Gene", que se resume na introdução da genética animal nos programas de produção do gado bovino, caprino e ovinos. Não pode haver um aumento da indústria de carne sem existir um organismo onde todos aqueles que intervém no sector discutam os seus interesses e se identifiquem como mecanismo de ligação com as estruturas do Governo para abordagem da forma de execução das políticas nacionais da produção de carne.

Este projecto tem as "impressões digitais" do Governo local?
Tem sim senhor. Foi o Governo quem iniciou o programa de multiplicação de reprodução animal. Foi o Governo quem transmitiu os imput's científicos e técnicos necessários para que tenhamos um gado melhor e em quantidades satisfatórias. Foi essa intervenção do Governo que promoveu o interesse por parte de todos aqueles que intervém na área para que constituíssem uma cooperativa. E também porque o Estado tomou a decisão de colocar as grandes unidades como matadouros na mão de cooperativas e associações. Portanto, tudo isso estimulou o surgimento da cooperativa. O Governo hoje está mais à-vontade com a existência da Associação de Criadores de Gado do Planalto Central em termos de interlocutores para através deles continuar a desenvolver a sua política de fomento e incentivo para o aumento da produção de carne na nossa região. A cooperativa é um conjunto de produtores que reúne o interesse de busca de apoios financeiros e técnicos para que esses produtores se sintam apoiados e existir um crescimento harmonioso em toda nossa região.

Queremos dar qualidade de vida ao povo do Huambo

Em que pé está a construção da barragem do Gove?
Está ao mesmo nível de expectativa para a estabilidade completa da nossa região, tal como está o Caminho-de-Ferro de Benguela (CFB). A barragem do Gove vai associar-se ao esforço do domínio da distribuição de água, que é um elemento de viabilização de qualquer projecto de desenvolvimento industrial. Estou-me a referir à água e à energia. Já se iniciou o projecto de reabilitação da barragem já com a componente motorização e há uma perspectiva de conclusão da mesma no primeiro trimestre de 2010. Esperamos que em 2010 a barragem comece a produzir energia. Com as estradas, o Caminho-de-Ferro de Benguela (CFB), um sistema de água e energia funcionais, naturalmente que o Huambo transformar-se-á sem qualquer margem para dúvidas no segundo maior pólo de desenvolvimento agro-industrial do País.

A barragem do Gove vai servir apenas o Huambo?
APK – A barragem do Gove vai servir o Huambo e o Bié. O Huambo em ponta de desenvolvimento necessita de cerca de 45 megawats. O Bié, neste momento, deve estar ao nível dos três megawats em termos de necessidade. Pode haver a tendência de ir para os 15 ou 18 mas para os próximos cinco anos a energia produzida será suficiente para cobrir as duas províncias. Naturalmente que o Governo central tem outros projectos. Por exemplo, no próximo ano o Huambo vai arrancar com a produção de energia através de resíduos de madeira. Vamos aproveitar a madeira na região do Kuima. Esta produção vai estar interligada com sistema da barragem do Gove. Há também a perspectiva da recuperação da barragem de Lomaum, que foi sempre a fonte de energia para a nossa região. Nos próximos dez anos poderá haver um conjunto de intervenções de vários sistemas de produção de energia que vão libertar energia suficiente para nós crescermos.

O que é o projecto "Capital Ecológica"?
O projecto "Capital Ecológica" é sinónimo de qualidade de vida para o cidadão do Huambo.

Foi uma iniciativa da Sociedade Civil ou do Governo local?
Foi do Governo. Queremos que a população do Huambo respire bem. Queremos dar qualidade de vida ao povo do Huambo. Então fomos buscar fontes onde se produz qualidade de vida e seleccionamos a cidade de Curitiba (Brasil). O projecto está pronto e aguarda a apreciação e a consequente aprovação do Conselho de Ministros para implementar o referido projecto. Fora da aprovação do projecto iniciamos algumas acções que são elemento-chave do projecto, designadamente o melhoramento de parques e jardins. Ainda não avançamos com a requalificação dos bairros porque o volume é muito grande, mas como poderá constatar o asfalto já penetrou nos bairros de forma a indicar o caminho para a sua requalificação. Cinco anos depois da implementação deste projecto nós teremos a cidade de Angola com maior qualidade de vida. Huambo tem muitos rios, riachos, ribeiros. Queremos que os geradores desapareçam e o povo consuma energia hídrica. Aqui vai respirar-se muito bem e vamos sentir que estamos em Angola, num País de progresso. Associado a este desafio incorporamos um outro, que se casa perfeitamente com o conteúdo do que é Ecologia, do que é qualidade de vida, é a cultura. Portanto, seremos também a capital da cultura angolana. Vamos continuar a cultivar toda informação histórico-cultural da região e colocar isso à disposição da região, particularmente dos jovens. A História e a cultura da região serão depositadas em locais que estarão à disposição do público. E este público jamais esquecerá os feitos dos nossos ancestrais que aqui desenvolveram a sua luta contra a ocupação colonial.

Como está servida a província em termos de escolas e hospitais?
A nossa província sempre colocou a Saúde e Ensino na prioridade das prioridades. O nível de infra-estruturas escolares na província tem estado a alargar-se consideravelmente o que fez com que no início deste ano lectivo tivéssemos meio milhão de crianças matriculadas no Ensino Primário. Já tivemos cerca de 180 mil crianças fora do Sistema de Ensino. Estes níveis baixaram para ordem de 90 por cento e em 2009 vai cair para 30 por cento. Isto quer dizer que com todo este programa que está a ser desenvolvido, dentro de mais dois anos o número de crianças fora do Sistema de Ensino vai diminuir ainda mais na província do Huambo, particularmente com o aproveitamento de todas as capacidades intelectuais para educação das crianças. Só no Ensino Primário vamos ter quase 700 mil crianças a estudar. É um grande desafio. O sector da saúde também está a ser alargado. Temos hospitais em todos os centros municipais. Temos centros de saúde na grande maioria das comunas.

Fala-se muito do Hospital Regional, o que é?
O Hospital Regional é o hospital de especialidade, que funciona no Hospital Central do Huambo. Este hospital terá a particularidade de apoiar a província do Bié e do Moxico, dada a sua característica em termos de especialidade. É por essa razão que falamos de Hospital de Especialidade. Por isso é que o chamamos de Hospital Regional que a partir de Outubro vai estar ao serviço da população.

* Jorge Eurico
Fonte: NL