Luanda – Sapalo António terminou recentemente os seus estudos de doutoramento em Lisboa, em Gestão Geral, Estratégia e Desenvolvimento Empresarial. Está ligado à docência e à gestão de uma instituição de ensino superior. Antigo deputado, foi líder parlamentar do PRS na Assembleia da Nacional.

Fonte: O País

Nesta entrevista via Internet e combinada em Lisboa em Abril passado (algumas questões reflectem a data), defende o federalismo, fala da sua passagem pelo MPLA,  diz que o seu partido não anda à deriva, e diz “nim” à questão sobre se se candidataria à liderança partidária.  

O senhor passou de líder do grupo parlamentar de um partido para o silêncio total, por onde tem andado e o que tem estado a fazer?
Não estou no estado de inactividade, mas sim, num silêncio relativo e estratégico assente na minha realização académica no exterior do país.

Não tem saudades da política do Parlamento?
Não. Ando sim muito preocupado com o péssimo estado democrático e social do país e com a situação das instituições políticas e económicas extractivas, construídas à medida de uma personagem imbuída do militarismo; as primeiras, como instrumentos defensoras e protectoras dos extractores do regime e as segundas como janelas de fazedura económico-financeira daqueles e de manipulação social; ando preocupado com o negativo estado social nacional.
Na realidade angolana, o Parlamento é um órgão conformado á natureza das instituições políticas extrativas do regime.
O país carece de erradicação da ditadura soberana e a reinstauração de um Estado conformado na supremacia da lei.

Está empenhado no seu doutoramento, quando terminar voltará à política ou vai ocupar a maior parte do seu tempo noutra actividade?
Não abandonei a política; a conclusão do doutoramento (brevemente) por enquanto constitui a principal prioridade.

Em que área se está a doutorar?, ou seja, qual é a sua área de estudo, ou tese?
Gestão Geral, Estratégia e Desenvolvimento Empresarial, cujo foco (tema) de estudo: A Transformação Económica de Angola - O Processo de Privatização e sua Influência Empresarial,1989/2012.

O senhor é político, ou foi, e está a fazer o seu doutoramento em Portugal. Porque não o faz em Angola? Não lhe parece haver alguma hipocrisia nos discursos políticos que apelam ao nacionalismo, ao envolvimento e valorização do povo e de Angola e depois se buscam recursos no estrangeiro?
Acho que há razão de preocupar-se com a situação; porém, esta questão deveria ser colocada à entidade que governa o país desde os primórdios da nossa independência, que entendia que o sistema comunista e respectiva centralização económica seriam soluções suficientes para o desenvolvimento e prosperidade humanas e, para o efeito, induziu o país num estado caótico e numa situação de pobreza e subdesenvolvimento humano regressivamente exponencial. Da minha parte não se trata de hipocrisia, mas sim de busca de conhecimentos para afirmação e contribuição no meu país, onde sempre vivi e nunca abandonei.

Já agora, como vê a política portuguesa, comparativamente à nossa?
Os ideais do 25 de Abril de 1974 têm sido materializados por todos os cidadãos portugueses e fundamentalmente aqueles que têm assumindo a responsabilidade de Estado. Em Portugal prevalece a supremacia da lei sobre as pessoas singulares e colectivas e por conseguinte, a força das instituições. Portugal não é um Estado absolutista; as instituições e respectivos agentes são independentes e livres; o exercício da democracia é efectivo, caracterizado pela liberdade de expressão a todos os níveis. O Estado social é garantido e assegurado e aos desempregados é garantido o subsídio de desemprego; a comunicação social, a polícia e todos os agentes públicos, estão ao serviço de todos e actuam de forma imparcial e inclusiva.
 O Chefe de Estado é um verdadeiro árbitro e aglutinador, assegura a coesão política e social; enfim, as políticas são democráticas e viradas para a solidariedade, estabilidade e desenvolvimento.
Ao contrário, as políticas em Angola são definidas e adoptas com fim único: a discriminação, repressão, bloqueio, estagnação nacional e promoção da corrupção e o país continuando a passar problemas básicos como premissas relevantes para a manutenção do poder alicerçada na manipulação e alienação social.
É pena a história do país nunca ter registado uma mudança racional nacional produzida sob visão política voluntária do regime.

Do seu ponto de vista, o que mais falta faz aos nossos políticos é uma boa formação académica ou um maior sentimento de compromisso com as causas do país?
O que falta aos políticos angolanos é a preparação e compreensão do valor democrático, da moral e de uma necessária mudança politica como sinónimo de coesão, estabilidade e desenvolvimento político económico e social (saber ser e estar como individuo e como um ser social). Falta essencialmente o sentido racional humano de ser político e do entendimento do verdadeiro sentido do conceito e significado da política.

Acha que a mensagem federalista do PRS é já um fardo que pode ditar a perdição do partido?
Na verdade a política federalista é incómoda para o regime; fardo é a manutenção do pensamento de 1975, quando um dos então movimento de libertação nacional entendeu com todos os recursos impor ao país um sistema de governo centralizador cujas consequências nefastas constituem um marco histórico inesquecível, para todas as gerações e ainda continuando a persistir no mesmo, enquanto os outros países incluindo a Rússia que foi o centro comunista, a forma de Estado Unitário já faz parte do passado triste.
Gostaria de responder com base em teorias e em realidades políticas contemporâneas das duas formas de Estados Unitário e Federal e pedagogicamente contribuir na modificação positiva do pensamento e da ignorância nutrida intencionalmente, sobre a realidade e a incontornável dinâmica federal:
Segundo o Dicionário da Língua Portuguesa (2013), Porto Editora - Unitário (unitarismo) é a doutrina dos que defendem a centralização administrativa do governo e a Federação (federalismo) é o sistema de governo que consiste na reunião de vários estados (províncias) numa só nação, conservando cada um deles a sua autonomia em negócios que não pertencem ao interesse comum.
Outrossim, recomendo ainda mais, aos teimosos unitaristas que aproveitassem as deslocações ao resto do mundo para realizarem a observação directa da organização politica e fundamentalmente de actual forma de Estado predominante.
Quero precisar que existe diferenças abismalmente profundas entre o Estado Unitário, onde há concentração de poderes numa única pessoa e o Estado Federal, onde há pluralidade nos aspectos de poder politico, de ordenamento jurídico e de Constituição, resultante de uma fórmula Constitucional e das leis sobre as Constituições dos Estados (Províncias), com atribuição a estes de direitos e deveres concretos.
Esta estrutura de Poder, politicamente descentralizada, com pluralidade de centros de poder, mas ao mesmo tempo com unidade na titularidade do poder (nesse sentido o Estado Federal é Unitário) resolve vários problemas:

a) A divisão das competências legislativas entre a federação e os Estados Federados (Províncias);
b) A distribuição de recursos tributários, para que a sobrevivência dos Estados federados não fiquem em causa, mas que simultaneamente a Federação disponha de receitas próprias;
c) A participação das províncias na formação da vontade da Federação (Órgãos da Direção do país);
d) A consagração da rigidez constitucional, para que a revisão da Constituição não fique na livre disponibilidade do legislador Federal e ao mesmo tempo nela participem os Estados federados (províncias);
d) A criação de uma instância de resolução de conflitos, por forma a dar respostas às eventuais disputas entre a Federação e os Estados federados ou entre estes.
e) A resolução e celeridade dos assuntos e necessidades provinciais, municipais e comunitárias (administrativas, económicas e sociais);
f) Eleição dos Dirigentes a todos os níveis (Presidente da República, Deputados, Governadores Provinciais (Estaduais) Administradores Municipais (Prefeitos).
g) Minimização da arrogância politica;
h) A promoção da independência e da força das instituições públicas;
i) A promoção e a garantia da justiça e da submissão de todos à lei;
j) O asseguramento do Estado social.

Em Angola vigora um primitivo Estado Unitário híper – centralizado e cegamente aderido e advogado ingenuamente por alienados que não conseguem compreender o além de Angola.
Angola, único país (a par de países comunistas e a titulo da Coreia do Norte e China), em que os governadores, os administradores continuam a ser nomeados e o presidente da República uma entidade absolutista.
O ódio e a luta do regime contra o PRS devido a um projecto político contemporâneo não traduzem qualquer diferença relativamente a 1975, logo não assusta.
A verdade é que está comprovado que o crescimento, o desenvolvimento e a prosperidade social, residem na descentralização e desconcentração política e administrativa (Federalismo).
A transformação dos Estados Unitários para Estados descentralizados e desconcentrados politica e administrativamente, neste século é natural e involuntária, sendo exclusivamente um produto da dinâmica e evolução político-social da humanidade. Recordar que, graça ao PRS, consagrou-se constitucionalmente as autarquias; é uma conquista irreversível do povo e do país através do PRS, mesmo com esforço de protelação do regime em não realização imediata das mesmas, mas a verdade é absoluta, tarde ou cedo as eleições autárquicas serão um facto; a luta vai continuar para que a exemplo do resto do mundo (excluindo os comunistas), os governadores passarem a ser eleitos pelo povo.
Sobre a forma de Estado Unitário, o regime angolano está solitário, aliás conta apenas com poucos países comunistas e é uma questão de tempo. Mesmo na região africana hoje vergonhosamente só em Angola onde encontramos um regime totalitário (absolutista), cujos governadores e Administradores municipais objectos de nomeação.
Para os Angolanos e o PRS, o caminho é espinhoso mas o destino é incontornável e certo.

Certamente já teve tempo para pensar no descalabro eleitoral do seu partido nas últimas eleições, o que encontra como causa fundamental?
As eleições deveriam traduzir o verdadeiro processo e acto da afirmação democrática e da pacificação de um país e sendo o povo eleitor o único jurado. Em Angola, as práticas e os resultados eleitorais são emanados coerciva e laboratorialmente pelo regime, contra todas as expectativas legais e constitucionais e populares. Acho que são acontecimentos ou atitudes que vão minando gradualmente a estabilidade democrática e tornando incerto o destino político do país e a insegurança futura dos actuais reinantes.
É mais que evidente, que se dependesse da vontade popular, o resultado eleitoral do PRS seria positivamente confortável.

Acha que o líder do PRS, depois das eleições e com o silêncio a que se remeteu, é homem capaz para abandonar o barco e deixá-lo seguir novos rumos?
O PRS é o Partido mais democrático de Angola; desde a sua fundação, o seu líder foi sempre eleito na base de múltiplas candidaturas, com excepção do último Congresso, por inexistência de concorrentes. Único líder com que o país pode se orgulhar, porque desde os momentos críticos e de transformação política do país (1989), sobe com inteligência gerir o PRS e com coragem contribuir na transformação política nacional.
O líder do PRS trabalha; a questão fundamental tem a ver com o sensacionalismo de alguns extractos sociais que procuram denegri-lo como mecanismo de atingir o PRS.

O que é que determina a “etnização” do PRS, a prática partidária e a composição da direcção, ou as campanhas externas ao partido?
Esta caracterização visa unicamente atingir o PRS, por se tratar de ser único Partido com um projecto politico e uma ideologia, objectiva e claramente definidos, em outras palavras com uma visão estratégica para o desenvolvimento sustentável do país.
Não se trata da prática nem da composição multicultural da Direcção do PRS, mas sim influência e campanha externas para descredibilizá-lo.
Aconselho à investigação objectiva e rigorosamente aplicada sobre os partidos e estou certo que as conclusões aferirão a verdade da realidade do PRS, contrariamente às meras deduções imaginárias, intencionalmente.

Já lhe ocorreu candidatar-se à liderança do PRS?
Sendo militante, tenho direitos e obrigações; entretanto, entendo que a missão principal que o momento recomenda é mantermos a coesão e a dinâmica partidária, continuarmos a luta politica para a concretização dos objectivos da nação e do próprio Partido; para o efeito, cada militante sério, honesto, deve empenhar-se responsavelmente na efectivação dos ideais do Partido e não com ambições desmedidas e/ou promoção de anarquia no partido.

Fala-se no regresso de António Muaxicungu, como vê este possível evento?
Como pessoas nunca tivemos problemas; nos divergimos funcionalmente, em manifestações de determinadas posições ou intenções. O PRS é um perto aberto, não obstante a solução judicial e a posição pessoal na véspera das eleições, acho que se assim entender é livre de retornar à casa.

Olhe para o nosso país como cidadão, o que mais o preocupa?
Como cidadão preocupa-me:

a) O Estado Unitário, (unitarismo) em que está mantido o país, caraterizado por uma centralização sufocante; vamos continuar a desenvolver uma árdua e longa luta para a transformação de Angola num Estado descentralizado e desconcentrado;

b) No país, ter-se forjado e consolidado instituições politicas e económicas extractivas à medida do regime e da sua personagem;

c) O estado acentuado da discriminação social e económica;

d) A pobreza e o elevado nível do desemprego;

e) A falta de uma política realista e objectiva sobre o estado social;

f) O nível generalizado da corrupção e em particular sob promoção da elite dirigente do país e manifestada no doloso açambarcamento material e financeiro, no interior e exterior do país;

g) A desorganização económica e financeira, com mais realce no sector aduaneiro (incluindo a libertinagem dos despachantes) cujas efeitos das medidas e acções nos preços são penosos ao consumo e tecido empresarial;

h) A fuga à realização das eleições autárquicas; entendo que estas constituem um dos pilares da ampliação da democracia, da aplicação e execução de medidas e politicas governativas locais bem como aceleradoras do crescimento e desenvolvimento comunitário e garante de um bem-estar (boa governação);

j) Frágeis estruturas públicas e produzidas a custos avultados.

k) A violação dos direitos humanos.

l) Promoção de violência política a exemplo de 1975.

m) A fragilidade, a desorganização corruptiva dos serviços de migração e a violação das fronteiras, bem e a entrada massiva ilegal de estrangeiros sob influência, incentivo e protecção política através de cabos eleitorais partidários, com todas as consequências futuras para o país.  

Seguramente tem seguido a vida angolana, como avalia os últimos acontecimentos políticos como os processos judiciais que a UNITA pretende instaurar contra o Presidente da República e contra outras figuras do Estado?
Acima referi-me às instituições políticas e económicas extractivas, criadas com o fim único de protecção do regime e fundamentalmente da sua principal personagem. Por razões mais que evidentes a idoneidade moral do Presidente da República é posta em causa e nos termos do artigo 129º da CRA, a sua situação estaria condicionada; outra questão é a camuflagem constante do nº 3 do artigo 127º da CRA. Esta cobertura combinada com a fraqueza das instituições produto da dependência àquele, constitui alavanca e incentivo de prática de várias infrações.
Significa dizer que os crimes políticos, económicos, financeiros e sociais, que são cometidos por determinadas entidades políticas, actualmente sob protecção, que acho precária, a sua justiça, cumulativamente está sendo adiada.

Faça de comentador, a CASA-CE está em Congresso, vê um grande futuro nesta formação política ou acha que pode ter sido beneficiada pelo factor novidade nas últimas eleições e agora é que vão ser elas?
Não gostaria de comentar sobre qualquer formação politica; Porém, abro parentesis para observar que as reuniões são procedimentos organizacionais legalmente consagrados; mas a corrupção eleitoral, a calúnia e as manifestações de oposição contra a oposição, são susceptíveis de redundância e indiferenciação com os métodos do regime e também não consigo perceber o projecto político justificável do seu surgimento e que fosse factor de diferenciação com os dos partidos tradicionalmente existentes.

Como avalia o papel do PRS nestes onze anos de paz?
O PRS não deve ser avaliado apenas pelos onze anos de paz, mas sim, o percurso periódico que medeia entre 1990 a esta parte. Se a nação fizer uma apreciação retrospetiva e objetiva isenta de paixão emocional e de simpatia, poderá concluir que o PRS é único que teve uma intervenção ativa e inteligente, com a qual influenciou a produção de resultados, politicamente tangíveis e intangíveis.
A título ilustrativo:
a) Em períodos de conflito armado foi a única força activamente interventiva, tanto plano interno assim como externo na persuasão politica e diplomática para a pacificação do país;

b) Contribuição com inteligência na elaboração da Constituição, inserindo estrategicamente aspectos relevantes para exercício da democracia, por exemplo a consagração das autarquias, contra a vontade da maioria parlamentar; a consagração das manifestações sem a prévia autorização; a consagração da administração eleitoral independente;

c) Mesmo não sendo poder, as suas acções influenciam a tendência de governação e de mudanças.

Que assunto verdadeiramente vital para o país e para a democracia é que falta ao parlamento angolano discutir?
Actualmente, o Parlamento é um membro integrante das instituições políticas que designo por extrativas; a sua correspondência com as expectativas populares passa necessariamente pela reforma do Estado para uma nova Direcção do Estado íntegro com um Corpo livre e imparcialmente actuante e ao pleno serviço da Base do Estado; acho que com estas medidas poderemos ter um Estado a exercer as suas funções políticas e técnicas no quadro das regras de boa governação e em particular, o Parlamento exercerá de forma independente a sua função legislativa sem dependência política de outro poder;
Não se pode entender um Órgão essencialmente legislador e fiscalizador mas também o primeiro violador da Constituição e da lei e corpo de ressonância política.

Sei que o senhor não é de Saurimo, no entanto passa por o ser, porquê?
Passei a ser por força maior; nasci no Luau (ex- vila Teixeira de Sousa) na província do Moxico; e em tenra de idade perdi a mãe; fui levado e criado pelos tios maternos em Kazage-Dala/Lunda-Sul; com o eclodir da guerra de libertação nacional (guerrilha) a área tornou intransitável (incomunicável), entretanto, em idade escolar fui registado novamente já que a cédula original havia ficado com o meu pai.

Mas foi uma figura popular em Saurimo, teve muitas peripécias por lá?
Vivi, estudei e trabalhei em Saurimo durante muitos anos; no geral carrego boas recordações, mas marca-me horrivelmente a perseguição do regime do MPLA, ao ponto de no ex- controlo, próximo do aeroporto de Saurimo, ter sido submetido a uma revista humanamente inadmissível (introdução de dedos no ânus pela segurança do regime com pretexto de ser negociante e transportador de diamantes para Luanda).                        

‘MILITEI E EXERCI VÁRIAS FUNÇÕES (NO MPLA)’

Pode-se dizer que o PRS é sobretudo um partido criado por descontentes ou dissidentes do MPLA? Há também quem diga ter sido criado por ex-membros da segurança do Estado.
Angola viveu um largo período monopartidário, caracteristicamente ditatorial e quase todos cidadãos directamente ou indirectamente, obrigatoriamente tinham que aderir ao Partido-Estado sob pena de vicissitudes políticas. As características insociais amadureceram as pessoas; foi-se descobrindo o mundo aberto e os seus traços democráticos, diferente de Angola.
Um país onde não era permitida no mínimo a iniciativa privada e nem se podia falar da liberdade; a justiça era tortura, a morte, etc. (ditadura).
Uma independência sem liberdade não traduz a razão e o sentido humano.
Daí, um verdadeiro humano não podia compadecer com aquele modo de vida; com determinação, surgiu o PRS, com uma visão política diferente para o país (o Federalismo), para contribuir na luta pela democracia, desenvolvimento e prosperidade.

O senhor militou no MPLA, não militou?
Militei e exerci várias funções.

Conte-nos o seu percurso no MPLA (JMPLA, etc.) e o seu grau de envolvimento? Sei que começou muito cedo o seu envolvimento com a política.
Não se trata de arrependimento ter militado no cruel regime durante um determinado período da minha existência; naquele período sem visão macro do mundo contemporâneo, associado à forte manipulação política, aderi e segui cegamente o regime e aliás, na época a palavra de ordem era combater o colonialismo e os inimigos da pátria e sem capacidade de reflexão para melhor percepção da verdade e do ambiente envolvente.
Na comuna de Kazage – Dala, onde vivia, em 1968, a população havia sido remetida para as matas e muitas pessoas eram amigas dos meus tios; durante o período da guerrilha os tios colaboravam com os amigos guerrilheiros, fornecendo discretamente informações e bens e certas vezes sendo miúdo não suscetível a desconfiança, era utilizado para o efeito. Com a entrada dos três movimentos de libertação nacional no quadro dos Acordos de Alvor, em 1974, fui designado coordenador comunal da OPA; função que exerci cumulativamente com a de coordenador da JMPLA, por motivo de José Manuel (ex-Vice-Governador do Moxico) que era coordenador da Organização Juvenil, ter sido chamado para exercer a função de coordenador provincial da OPA no Moxico.
Em Luanda exerci várias funções na JMPLA (município Ingombota) e representante do partido na COFA, por inexistência da célula.

O que o levou a sair do MPLA: descontentamento ou o apelo de outros caminhos?
A conjugação de ambos; as características do regime ditatorial foram-me amadurecendo e despertando. Percebi que, do ponto de vista político e económico, o MPLA havia induzido o país para um caminho errado e o mundo democrático era o mais humano e próspero e que era ideal o nosso país segui-lo. Esta visão levou-me muito cedo e clandestinamente à oposição que veio a se materializar através da fundação do PRS, com projecto político adequado às aspirações do mundo contemporâneo.