Luanda - Viver na República de Angola, tornou-se um verdadeiro canteiro de milagres, não pela sua geografia, mas pelas condições sociais que se apresentam cada vez mais agrilhoadas. Tenho constatado com algum grau de preocupação e apoquentação, vários trabalhadores da via (aqueles que fazem das nossas estradas o único caminho exequível para o seu ganha-pão), a procederem o pagamento de salários a muitos funcionários do Estado. Como o “azar não vem só” e quando se fala de Angola ainda é pior, nas minhas largas odisseias, constatei com bastante lugubridade o desespero de um humilde trabalhador da via (taxista), numa das suas jornadas longas, extenuantes e esgotantes, a vociferar abatido e desalentado, uma frase que até hoje, como bom cidadão que presumo eu ser, deixa-me consternado, fundamentalmente numa Angola que se anseia próspera:

Fonte: Club-k.net

“Esta é terceira vez que os “bongôs” nos mandam parar. O mais triste é que eles já não precisam mais dos documentos verdadeiros (Carta de Condução, Bilhete de Identidade, Seguro do automóvel…), o que eles querem são outros documentos e mais modernos (kwanzas, dólares…)... Não sei o quê que as crianças vão comer, mais logo, continuou cabisbaixo...”

 

Como a minha ingenuidade nestas matérias é reconhecidamente colossal, pensara que já tinha visto tudo, e que o filme de “terror” já tivesse sido encerrado. Para o meu espanto, o trabalhador da estrada (taxista) nem desceu da viatura, assim mandam as regras da condução, contudo, pediu para que o gerente (cobrador) descesse e levasse os verdadeiros documentos que os mesmos haviam produzido das 7h:10 até às 9h:30. O ridículo é que a recepção daqueles risíveis documentos envergonharia qualquer profissional sério, honesto e zeloso.

 

 

 

Convoquei, extraordinariamente, o meu parlamento e questionei-me o seguinte: será que esta é a nova forma “requintada” que o Estado criou para se pagar imposto? Será que o policia ou o professor também tem prerrogativas de cobrar nos seus locais de actuação? Quem lhes deu tais poderes? Ou melhor, a quem se inspiram?

           

Como cidadão angolano e um bom patriota, forço-me a dizer que tais praticas continuam de forma grave, a amarfanhar todos os objectivos curtos, médios e longos que Angola distraidamente se propôs cumprir.

 

O que eu acho mais curioso, é que o pobre cidadão já luta pela vida, porque o Estado não pode, não consegue empregar todos. Mas, os trabalhadores do próprio Estado (governadores, administradores, policias, professores, médicos…), passam a vida a tirar do cidadão aquilo que já não têm para sobreviver. Afinal, a quem se inspiram? Como acabar com o fenómeno da corruptocracia? Poucos têm a capacidade de servir e muitos têm a vocação natural de servirem-se e tornarem-se mais pobres que o próprio pobre digno. Até quando essa corrupção endémica, em que os “presumíveis” académicos, tornaram-se cegos, mudos e surdos. Ou melhor, tornaram-se verdadeiramente analfabetos funcionais? A assembleia Nacional ficou “mutilada” para exercer o direito de fiscalizar as acções do Executivo; os académicos coíbem-se de exercitarem os seus pensamentos críticos; ao cidadão comum foi-lhe amputado o direito de reclamar das injustiças e o sagraram-lhe o dever de calar a boca... Com tudo isso, só teremos de para de vender gasosas para morrermos de fome, e consequentemente podermos cumprir o nosso dever de dar gasosa aos famosos “gasoseiros” para continuarem vivos.

 

Enquanto a prática da Corrupção for uma regra de vida, uma forma de convívio social, é uma questão para dizermos que estamos todos “payados”…

 

 

O impacto da corrupção na sociedade angolana é cada vez mais forte e a todos os níveis. Quando vemos um professor a corromper, quando vemos um polícia a transformar-se em “cobrador” de todos os táxis com/sem documentos oficiais, quando vemos um médico corrupto, tudo isso é só uma ponta do iceberg. Essas coisas, normalmente têm uma raiz muito profunda. Têm um modelo. Será que os nossos “queridos” policias corruptos e sem ética têm sido inspirados? Quem os inspira?

 

Entre nós, vemos e ouvimos casos de corrupção todos os dias, sendo que a elite política, mais concretamente a dos governantes e gestores públicos, ser quem tem chamado mais atenção da imprensa e dos cidadãos. A corrupção tem sido o grande mal que tem impedido o desenvolvimento de África em geral e de Angola em particular. O nosso olhar sereno e tranquilo perante às práticas nefastas como essas, tem permitido que os nossos diversos corruptos perpetuem as suas acções com bastante sucesso e de forma ininterrupta. Estamos a espera de um milagre para que em Angola já não tenha mais corruptos impunes. Pensamento errado! Esse cancro, provavelmente, sanável e cicatrizável, só poderá ser extinto com a determinação e audácia de todos os angolanos. Essa tarefa seria dos tribunais, mas já conhecemos como é que eles funcionam. MAL, MAL, MAL..!

 

Como se não bastasse, para nos escamotearmos da verdade, usamos o caduco e vergonhoso slogam “o cabrito come onde está amarrado” para justificar actos indecorosos e vergonhosos que praticamos nos nossos locais de trabalho ou nos cargos que (duvidosamente) ocupamos. Usamos dos cargos que ocupamos para promovermos a teia da corrupção. O que mais dói e que as leis são ousadas e a sua aplicabilidade prática é morta. Até mesmo muitas das instituições sociais que deveriam servir como pontos de equilíbrio da sociedade no combate à corrupção e outros males também se corromperam. A quem iremos, Senhor? Onde iremos, minha Angola?!

 

 

Como é que estes "polícias" conseguem manter um ciclo do mal entre si e como “castigo” são favorecidos para vários outros cargos?! Como funciona a cabeça de um agente policial corrupto e com falta de ética?! Será que andam a ouvir os conselhos dos nossos irmãos superiores, muito mais “barras” na matéria de pôr a mão?

 

 

Se o inolvidável Nelson Mandela nos ensinou que “a educação é arma mais poderosa para transformar o mundo”, então é caso para se dizer que se não apostarmos de forma séria e premente no sistema de educação do país, caminharemos a passos largos, rumo a uma Angola desconhecida, dos angolanos, menos de todos os angolanos, porque segundo Platão, “a educação deve ser direccionada à aquisição do conhecimento do Bem e da Verdade”. Nem todos os “polícias” deveriam ser trabalhadores do Ministério do Interior. Muitos, por uma questão de honestidade e humildade, deveriam mesmo dedicar-se ao cultivo de café, ou até, como gostam de cobrar na via, deveriam ser cobradores dos próprios táxis, visto que têm dado provas claras de que são péssimos servidores públicos. Em Angola já não sei se a frase do americano Frederick Taylor “pessoas certas nos lugares certos”, tem alguma importância. Tudo o que é bom, é banal. Que país estranho hein!

 

 

Portanto, um funcionário corrupto é tão pernicioso para a Humanidade quanto a reunião conluial de todas as bombas nucleares, porque tem a capacidade de banalizar os objectivos de um determinado Estado. Se o nosso tem como objectivo macro: garantir a paz e a segurança nacional, como é que será possível garantir essa paz, se a fome e a corrupção têm sido as novas formas de fazer guerra contra os cidadãos. O nosso olhar impávido faz com que a corrupção se torne numa norma de convivência social, numa ordem social entre nós… A corrupção está institucionalizada a partir dos níveis mais baixos da sociedade até aos mais altos. Leis e decretos não irão reduzir ou combater à corrupção, aliás Angola tem bonitas leis de combate à corrupção que lamentavelmente não se cumprem. Nunca teremos um país com uma paz verdadeira, se não se inverter o actual quadro negro. Devemos continuar a denunciar e a condenar os actos indecorosos que nos apoquentam, mas devemos fazer um pacto com nós próprios para sermos homens e mulheres corajosos. Contudo, nem tudo está perdido em Angola e nem o futuro do país está decidido à partida, mas a passividade permitirá que todos aqueles que quiserem nos escravizar, o façam sempre que quiserem. É altura de pensarmos numa nova Angola (Angolan dream), em tribunais mais competentes, imparciais e mais sérios, em que todo aquele (cidadão, policia, professor, médico, administrador, governador, ministro, presidente…) que for só apanhado a conjugar o verbo “corromper” no presente do indicativo, deve ser encaminhado directamente para cadeia... A corrupção é uma doença e deve ser curada. Se para a febre-amarela, criaram-se muitas vacinas, porquê não fazermos o mesmo com a praga da corrupção? Quando algo é mau, e ignoramos, passa a ser algo bom para os que praticam tais maldades.

 

Podíamos folhear o dicionário das velhas máximas e repetir aqui o ditado de que precisamos plantar para colher: se plantarmos o bem, teremos o retorno em dobro; se plantarmos o mal, colheremos a pobreza! Na óptica do inolvidável Nelson Mandela, “its allways impossible until it´s done” (sempre parece impossível até que alguém o faz). A ver vamos! Eu acredito na força aguerrida do povo angolano mais do que no seu próprio medo. Não há corrupção que resista. Tudo é possível, até mesmo o impossível…

 

   Não haverá derrota, quando a vontade de vencer for maior.