Luanda - De acordo com a Enciclopédia livre a fraude eleitoral “é uma intervenção deliberada numa eleição com o propósito de impedir, manipular, monopolizar, controlar, anular ou modificar os resultados reais, favorecendo ou prejudicando alguma candidatura, partido ou coligação.”

Fonte: Club-k.net

A prática da democracia em África é muito recente e Angola não constitui excepção. No entanto, a constante invocação de fraudes eleitorais, como aconteceu recentemente no Quénia e como aconteceu em Angola nos três actos eleitorais passados, colocam em causa todo esse processo. Existência ou não de fraude eleitoral, a constatação principal é que muitos Angolanos começam a desconfiar do sistema democrático vigente, assim como da “dita” representatividade proporcional dos políticos no parlamento.

 

A democracia, que devia ser um espaço para o exercício da cidadania, participação política e alternância do poder, transformou-se numa oportunidade de luta, manutenção e perpetuação do poder com recurso á todos meios possíveis e alguns ilícitos e violentos. Os políticos usam a democracia como um projecto de poder e enriquecimento em detrimento do bem-estar das populações e da responsabilidade governativa.

 

Os processos eleitorais precisam de dar garantias de justiça, honestidade, transparência e credibilidade á todos Angolanos e não sómente á um grupo que detém o controlo e monopólio da gestão do mesmo. Para isto acontecer três coisas importantes devem ser garantidas com urgência:

 

Os governantes (deputados, Presidente e Vice-Presidente) devem ser eleitos através do voto directo e não através de listas partidárias;

 

As campanhas eleitorais devem ser limpas, honestas e justas, respeitando as leis;

 

O registo dos eleitores deve ser auditado e a apuração da contagem de votos deve ser realizada no local da votação, aberta ao público, e os resultados divulgados no tempo real.

Representatividade do eleito em relação ao voto directo:

Os deputados, o Presidente e o Vice-Presidente da República são eleitos tendo por base os votos no partido e não por terem aceitação, reputação, credibilidade e apoio do povo. Muitos deles não representam nada mais do que os interesses do partido que os colocou nas referidas listas. O critério da representação parlamentar proporcional é a maior fraude eleitoral e anti-democrático que os governos que não dependem do apoio do povo criaram.


Os partidos políticos concorrem às eleições com listas fechadas e o povo em geral desconhece o seu conteúdo, constituindo, deste modo, uma imposição partidária. Daí que seja frequente a prática da defesa das agendas partidárias, os ataques aos partidos da oposição, em detrimento dos interesses dos cidadãos que supostamente os elegeram.

 

O sistema de representação proporcional é um absurdo e uma ameaça aos conceitos de democracia plural, inclusiva e participativa e os responsáveis pela elaboração e aprovação desta legislação foram bem-intencionados na legalização da exclusão completa do cidadão. A `democracia` é feita pelo povo, com o povo e para o povo. A `partocracia` é feita pelos partidos, entre os partidos e para os partidos, daí que os deputados, Presidente e Vice- Presidente não podem ser considerados representantes do povo.

Campanhas eleitorais limpas, honestas e justas respeitando as leis

Um dos princípios e valores da democracia é a transparência e a justiça eleitoral. As acusações constantes de falta de transparência nos processos eleitorais feitas pela oposição são ferozmente defendidas por parte daqueles que detém o poder político e desconhecem a cultura de alternância de poder. Quando os contratos com as empresas prestadoras de serviços eleitorais são questionados, quando não se explica a origem da ostentação em demasia de meios e recursos financeiros superiores aos que foram alocados pelo orçamento geral do estado para o efeito, torna-se mais do que evidente que o processo está viciado, não é transparente, conduzindo à sua desacreditação. As campanhas eleitorais limpas, honestas e justas assentam-se no pressuposto de que todos os partidos e candidatos têm acesso às mesmas oportunidades de financiamento. Em democracia nenhum partido político pode ser o único beneficiado, deter monopólios económicos que são utilizados para coagir, manipular, corromper e alterar os resultados das eleições.

Registo e Votos auditáveis com apuração aberta ao público

Não se entende o porquê do voto do povo ser contado e apurado no secretismo e longe do alcance daqueles que votaram. A democracia só existe com registos de eleitores e votos auditáveis, caso contrário é considerado fraude massiva. Para maior credibilidade do processo deveriam existir vários outros sistemas fora do controlo do poder político para realizar a auditoria, contagem e verificação eleitorais para que o controlo e o monopólio da gestão do processo não estivesse nas mãos dos que detêm o poder político e agressivamente lutam para perpetuá-lo e eternizá-lo mesmo por cima da desgraça e miséria do povo.

 

Existem várias formas de fraude eleitoral, começando com a realização do registo eleitoral, a recusa à auditoria do ficheiro de eleitores, a contratação ilegal de serviços, o recrutamento partidarizado dos agentes eleitorais, o financiamento das campanhas eleitorais, a não fixação dos cadernos eleitorais, a confusão do local da votação, a deslocação intencional de eleitores, a contagem e apuração secreta dos votos, a não publicação dos resultados nas assembleias de votos, a transportação das urnas para locais (in)devidos para contagem, e estas poderem ser trocadas, o uso e a manipulação das tecnologias, etc., etc.

 

A contagem e a apuração secreta dos votos, longe do escrutínio do público que votou, induz conscientemente à realização de uma fraude. Não é aceitável a incapacidade institucional e falta de vontade política da Comissão Nacional Eleitoral de realizar a contagem pública dos votos em tempo real e nos locais de votação e sua respectiva divulgação.

 

Existem várias possibilidades de fraude que podem alterar profundamente o resultado das eleições. Contudo, o que mais preocupa os Angolanos como eu é elegermos o melhor partido e os melhores políticos, com carácter, credibilidade e moralidade comprovada, que consigam governar com justiça, equidade, humanismo, transparência, responsabilidade beneficiando sempre a maioria e nunca uma minoria.

 

O nosso voto “optimista” é que as eleições de 23 de Agosto sejam justas, livres e transparentes, com os resultados a serem apurados no local de votação e divulgados em tempo real sob o escrutínio público. Esperamos que estas eleições produzam a esperança de um dia termos deputados e governantes eleitos directamente pelo povo e que representam os interesses do povo e não de partidos políticos. Essa é a democracia que muitos Angolanos como eu anseiam.

*Elias Mateus Isaac, Activista Cívico