Luanda - O Presidente da República avisou, ontem, que não vai tolerar o nepotismo praticado por quadros responsáveis do Ministério das Relações Exteriores ou chefes das missões diplomáticas e orientou o ministro a afastar “funcionários sem qualificações, nomeados apenas por serem familiares ou protegidos deste ou daquele político”.

Fonte: JA

A medida, disse o Presidente da República, deve-se à necessidade de inaugurar uma nova era no sector, marcada com a redução das missões diplomáticas e consulares e a consequente diminuição do pessoal.


Ao discursar na abertura da oitava reunião anual de embaixadores, a primeira do mandato do actual Executivo, o Presidente João Lourenço afirmou que a escolha dos que vão regressar ao país e os que ficam nas Embaixadas depende do mérito.


“Queremos inaugurar uma era de maior responsabilização, onde não toleraremos a má gestão financeira e patrimonial ou ainda o nepotismo”, disse o Chefe de Estado, sublinhando que são “medidas corajosas, mas necessárias”.


“Esta é uma oportunidade que o senhor ministro com certeza não perderá para mexer naqueles funcionários sem qualificações, que foram nomeados apenas por serem familiares ou de alguma for-ma protegidos deste ou da-quele político”, acrescentou o Presidente da República, que pediu a todos os que trabalham directamente com os fundos do Ministério, uma “gestão parcimoniosa e exemplar dos fundos e do património da instituição”.


“Pretendemos ver um Ministério das Relações Exteriores organizado e funcional, onde se respeite a carreira diplomática, promovendo-se uma rotação normal de embaixadores e de pessoal, permitindo-se, assim, a estabilização do Ministério e a sua adequação aos melhores padrões internacionais”, sublinhou João Lourenço, que denunciou a banalização do uso do passaporte diplomático, em posse de cidadãos que não exercem, nunca exerceram ou deixaram de exercer qualquer função que os habilita a ser detentor do documento.


“Precisámos actualizar com urgência a relação das entidades com direito ao uso do passaporte diplomático”, disse João Lourenço, na reunião que decorre até sexta-feira, com a participação de 59 embaixadores e 30 directores do Ministério das Relações Exteriores e que está a discutir a estratégia de inserção de Angola no actual contexto internacional.


Para a melhoria da qualidade dos diplomatas, o Presidente da República anunciou a transformação do Instituto de Relações Internacionais em Academia Diplomática, para ministrar cursos de pós-graduação e mestrado em diplomacia.

Imagem de Angola


Uma das prioridades da diplomacia angolana, no momento em que o país colocou no topo da agenda a diversificação da economia, vai ser, segundo o Presidente da República, tornar a diplomacia mais eficiente, virada para a promoção da boa imagem do país, captação do investimento privado e estrangeiro e promoção de Angola como destino turístico.


O Chefe de Estado destacou a criação da Zona do Comércio Livre Continental, como uma decisão conjunta de realce, manifestando convicção de que virá a ser uma plataforma impulsionadora do progresso e desenvolvimento de África. João Lourenço elogiou o papel desempenhado pela diplomacia angolana desde a Independência Nacional, principalmente o trabalho do ex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos, que conduziu o processo de reconhecimento, pela comunidade internacional, do Estado angolano, e toda a acção que permitiu que Angola sobrevivesse perante a hostilidade do regime do apartheid e dos seus aliados e afirmar-se como nação solidária com os povos oprimidos da África Austral e do resto do mundo.


O Presidente João Lourenço falou da Batalha do Cuito Cuanavale, contra o regime do apartheid, dos Acordos de Nova Iorque, que precipitaram a Independência da Namíbia até aos passos diplomáticos que levaram à paz definitiva para Angola, em 2002, e a “inserção do país como Estado de pleno direito no concerto das na-ções”. “Nos países e zonas da vossa actuação façam a observação criteriosa dos fenómenos que aí ocorrem, para que contribuam com ideias que sirvam de base aos órgãos centrais para formularem políticas adequadas ao momento e que favoreçam o estreitamento dos laços de cooperação, amizade e solidariedade”, aconselhou.

Prioridade ao continente


A situação em África também foi realçada pelo Presidente João Lourenço, que pediu aos diplomatas para destacar as acções a desenvolver no continente para melhorar, cada vez mais, as relações com cada um dos países africanos e para que Angola possa prestar a assistência possível para a resolução dos conflitos. “Devo referir os conflitos na RDC, na República Centro Africana (RCA), Burundi e Sudão do Sul”, indicou o Presidente, que pediu aos diplomatas empenho para se desenharem soluções políticas e diplomáticas assentes no diálogo, que concorra para o restabelecimento da paz naqueles países.


No caso da RDC, pelas incidências directas do conflito para Angola, o Presidente da República garantiu o empenho do país, com outros parceiros regionais e internacionais, para que o Governo implemente, cabalmente, os acordos internamente estabelecidos.


“Daremos estes passos respeitando a soberania do Estado congolês e encorajando-o a seguir todos os caminhos que levem ao restabelecimento de uma paz estável e duradoura”, sublinhou João Lourenço, que fez ainda uma referência ao papel relevante que deve ser conferido à União Africana na articulação dos esforços e iniciativas para a solução dos conflitos no continente.


Terrorismo em África e questões como imigração ilegal e o contrabando, nas suas múltiplas vertentes, também mereceram destaque no discurso de João Lourenço dirigido aos embaixadores, chefes de missões diplomáticas e directores do Ministério das Relações Exteriores.

Paz no Mundo


Aos diplomatas, o Presidente da República alertou para as ameaças à paz mundial, falou do clima de tensão na península coreana e do conflito na Síria, que atingiu proporções preocupantes, uma vez que acabou por se internacionalizar, com o envolvimento dos Estados Unidos, Rússia, Turquia, Irão e Israel. O Chefe de Estado lembrou que aquele território, às portas da Europa, se tornou num barril de pólvora que já causou a morte de milhares de pessoas, destruição de cidades inteiras e um elevadíssimo número de refugiados.


“Desejo que se observem as normas do direito internacional e as resoluções do Conselho de Segurança da ONU, como instrumentos válidos para a resolução dos problemas que o mundo vai enfrentando”, frisou o Presidente, reafirmando a posição de Angola sobre o conflito no Médio Oriente e que opõe pa-lestinos e israelitas.


“Angola continua a defender a necessidade do estrito respeito das resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas que apontam para a criação do Estado da Palestina, convivendo pacificamente com o Estado de Israel, como um direito inalienável do povo palestino.”

Homenagem aos embaixadores que pediram reforma

Oito embaixadores foram ontem homenageados pelo Presidente da República pelo trabalho desenvolvido em prol do país e da diplomacia angolana. Ana Maria Teles Carreira, Pedro Mavunza, José Agostinho Neto, Ismael Martins, João Garcia Bires, Brito Sozinho, Gilberto Lutucuta e Hélder Lucas passaram à reforma a seu pedido, um gesto realçado pelo Chefe de Estado, principalmente por ocorrer numa altura de mudanças na diplomacia nacional e quando muitos quadros do sector se recusam a cessar funções nas diferentes missões diplomáticas, apesar da idade já avançada.


“Pela experiência que acumularam, possuem valências que serão úteis na formação das novas gerações de diplomatas angolanos”, disse o Presidente da República, sublinhando a postura dos profissionais, os quais considerou “dignos herdeiros das mais gloriosas tradições da actividade diplomática realizada por nacionalistas angolanos que, no período pré-independência, souberam afirmar perante o mundo os desejos de liberdade e de resgate da dignidade do povo angolano”.


Hoje, penúltimo dia da reunião, os diplomatas discutem a Estratégia da Política Externa de Angola, sob moderação do ministro das Relações Exteriores, Manuel Augusto, e a Diplomacia Económica, moderado pelo ministro de Estado para o Desenvolvimento Económico e Social, Manuel Nunes Júnior. O tema é apresentado pelo economista Alves da Rocha. Para o período da tarde, a agenda reserva o tema Imigração e Segurança. A oitava reunião dos embaixadores encerra amanhã com o discurso do ministro das Relações Exteriores, Manuel Augusto.