Luanda - O embaixador Hermínio Escórcio revelou que o Estado soviético (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas) não comunicou oficialmente a Angola a morte do Presidente Agostinho Neto, a 10 de Setembro de 1979, em Moscovo.

Fonte: JA

Na altura director geral da Sonangol, membro do Comité Central e secretário para a Esfera Social, Hermínio Escórcio lembra que a notícia já circulava nas agências noticiosas de todo o mundo, mas o Estado soviético não tinha feito nenhuma comunicação oficial às autoridades angolanas.

"Estávamos, alguns de nós, no 1º andar da sede do partido comentando o que agências noticiosas de todo mundo anunciavam - a sua morte -, e que o Estado soviético não nos tinha comunicado e nós estávamos na incerteza e sempre na esperança de que essa nefasta notícia não fosse verdadeira", lembra o diplomata, na altura com 43 anos.

Para acabar com a incerteza, os dirigentes decidiram então enviar Afonso Van-Dúnem Mbinda, já falecido, à embaixada soviética em Luanda, para instar o embaixador a se deslocar à sede do MPLA e esclarecer a notícia que já corria o mundo inteiro.

"Assim aconteceu. O embaixador, perante nós, declarou que não estava autorizado a confirmar a notícia, mas que perante esta situação que estávamos todos a viver, acabou por confessar e relatar que, mesmo sem autorização do seu país, a notícia era verdadeira e que o nosso Presidente estava morto", lembra Hermínio.

Agostinho Neto já estava a negociar com os americanos

Irene Neto, filha de Agostinho Neto, acredita que se o seu pai estivesse vivo, o país teria sido pacificado em 1979 ou 1980, porque ele já estava a negociar com os americanos e sul-africanos e tinha iniciado contactos para dialogar com Jonas Savimbi.

Irene Neto considera a morte do pai um assunto obscuro que apenas será desvendado no futuro. A filha do primeiro presidente de Angola, defende a clarificação dos factos sobre a data da fundação do MPLA e diz ser hora de reconhecer os feitos de todos os que contribuíram para a emancipação de Angola. Em entrevista ao Jornal de Angola, a antiga governante diz que quase nada se fala sobre o pai. Numa longa entrevista a este diário, ela fala sobre alguns momentos marcantes da vida do pai, que, se estivesse vivo, completaria amanhã 96 anos.

Desaparecimento prematuro de Neto ainda afecta o país

O desaparecimento físico prematuro do primeiro Presidente de Angola, Agostinho Neto, continua até aos dias de hoje a afectar o país, sobretudo pelo facto de o malogrado não ter deixado assegurada, na totalidade, a sua visão e projecto de Nação, declarou o nacionalista, escritor e empresário Jaime Madaleno da Costa Carneiro.

"Quando recebi uma chamada telefónica a partir de Moscovo informando-me que Neto acabara de falecer, foi muito traumático. Senti naquele momento que o homem que mantinha um projecto de Nação tinha embarcado para a eternidade sem poder deixar assegurada a sua visão e projecto de Nação.

Essa partida antecipada tem afectado o país até hoje", declarou o também juiz jubilado, para quem Agostinho Neto gozava de grande autoridade política e moral e de uma grande honradez e sensibilidade humana. Jaime Madaleno lamenta que não se tenha dado importância suficiente ao primeiro Presidente de Angola.

"Não creio que se tenha dado ênfase suficiente no homem e no poeta", referiu o nacionalista, acrescentando que as manifestações de apreço se têm centrado mais no seu significado como pai de uma nova Nação e como criador do Estado. "Eu destacaria mais a sua honradez.

Nunca viu o poder como um meio de aceder à riqueza pessoal, senão como um instrumento para lograr um ideal de independência, unidade e renascimento de uma sociedade oprimida pelo colonialismo", sublinhou. Por ter sido director do Gabinete de Agostinho Neto entre 1975 e 1979, o nacionalista recorda que conviveu e teve a grande honra de trabalhar ao lado do autor do livro Sagrada Esperança, cujos poemas conquistaram não só o coração dos angolanos, como de outros povos.