Luanda - O presidente angolano assegurou esta sexta-feira que mantém "relações normais" com o antecessor José Eduardo dos Santos, que não está "sozinho no combate à corrupção" e que o programa de repatriamento de capitais "tem data de arranque, mas não de término". Em 2019 está confirmada visita a Cuba.

Fonte: Lusa

As palavras de João Lourenço foram proferidas numa entrevista coletiva - cada órgão de comunicação social teve direito a uma pergunta - realizada hoje nos jardins do Palácio da Cidade Alta, em Luanda, a segunda promovida pela Presidência no espaço de 11 meses.

 

O encontro arrancou com uma pergunta da Televisão Pública de Angola (TPA) acerca do ponto em que se encontra o programa de repatriamento de capitais lançado pelo executivo e cuja fase voluntária termina já a 25 de dezembro, passando no dia seguinte à fase coerciva.

 

"Ainda é cedo para saber se é um fracasso ou um sucesso. Não temos necessidade de correr para dizer se há fracasso ou sucesso. Foram concedidos seis meses para o repatriamento voluntário. Quem quis aproveitar, fê-lo. Quem não o fez pretende enfrentar o Estado angolano. Corre um sério risco. Não só de perder recursos como comparecer perante os tribunais. Estamos confiantes no êxito da operação", disse João Lourenço.

 

Para o chefe de Estado angolano, a operação "não é para ser realizada em seis meses", já que "esse foi o período de graça para quem, de boa vontade, quis repatriar".

 

"Estamos confiantes de que o tempo joga a nosso favor. O programa tem data de arranque, mas não tem data de término", lembrou, considerando que a respetiva execução "pode levar 10 ou 20 anos", acabar durante o seu mandato ou de quem o vier a substituir.

"Portugal prestará toda a colaboração possível para Angola recuperar o que é seu"


Numa outra questão sobre o mesmo tema, mas relativa à atuação das autoridades portuguesas, João Lourenço fez questão de salientar que nos recentes encontros que manteve com o presidente, Marcelo Rebelo de Sousa, e com o primeiro-ministro, António Costa, recebeu apoio de Lisboa aos objetivos de Luanda.

"Portugal prestará toda a colaboração possível para Angola recuperar o que é seu", disse.

Adiantou também que não tem dados concretos sobre a execução do programa, mas que, "a devido tempo, o Banco Nacional de Angola, que é a entidade competente nessa matéria, prestará os esclarecimentos que se impuserem".

Quando lhe perguntaram acerca das relações com o antecessor no cargo, José Eduardo dos Santos, João Lourenço limitou-se a dizer que as considerava "normais, razoáveis".

"Não há motivos para não ter boas relações pessoais", atirou, sem se alongar.

À pergunta se o Governo e o MPLA não deveriam ter firmado um pacto de regime à volta de uma das bandeiras mais agitadas ao longo do ano e três meses que leva no cargo - o combate à corrupção - João Lourenço enfatizou que esse tem sido o tema recorrente nas suas intervenções.

"Não há motivos para não ter boas relações pessoais [com José Eduardo dos Santos]"
"Em todos os discursos tenho falado na necessidade do combate à corrupção e também apelado a todas as instituições do Estado, às igrejas, às organizações não-governamentais, associações profissionais, sindicais, aos cidadãos em geral, para participarem de forma ativa nesse combate", disse.

O também presidente do MPLA negou que o partido que dirige tenha deixado alguém de fora nesta matéria e salientou mesmo que não está sozinho "nesse combate".

"Não fechamos portas. O MPLA não fechou portas. Não é verdade. Pelo contrário, todos os dias apelamos à participação de todos nesse combate. Não queremos estar sozinhos nesse combate e não estamos sozinhos nessa luta. Se algumas forças políticas ficaram de fora foi porque se autoexcluíram. Talvez porque considerassem que essa seria uma iniciativa sua", declarou.

O presidente deu ainda alguns números que retratam "as preocupações do executivo nas áreas sociais", lembrando, por exemplo, que os recursos alocados à Saúde no orçamento de Estado passaram de 3,6%, em 2018, para, 6,6%, em 2019, e que na Educação, "apesar de a diferença não ser muito grande, fica um sinal", ao passar de 5,4% para 5,8%.

Destacou ainda as verbas destinadas à Agricultura, em particular de apoio "à agricultura familiar, aos camponeses".

"Passou-se de 0,34% em 2018, para 1,6% em 2019, quase cinco vezes mais", lembrou.

O processo de privatizações foi outro dos temas abordado, com João Lourenço a garantir que o Executivo que lidera quer fazer o processo de "forma correta". "Ou seja, não vamos entregar de bandeja o património do Estado a nenhum grupo específico. Aliás, é isso que estamos a combater. Queremos privatizar de forma correta e essas são conhecidas: através de concurso público, bolsa de valores, mercado de capitais", explicou, sem adiantar mais pormenores sobre o processo de privatização que deverá envolver 74 empresas angolanas.

Depois do momento mais tenso em torno do sistema de saúde, em que João Lourenço reconheceu usar a Clínica Girassol, propriedade da Sonangol, quando precisava de cuidados médicos, a pergunta sobre possíveis despedimentos na função pública, em 2019 também não deixou o presidente angolano muito confortável, não se alongando na resposta dada a Angola Press.

"É uma questão melindrosa porque estamos com uma taxa de desemprego de cerca de 20%. Isso [a redução da máquina pública] é para ser feito por fases, começando pelo próprio executivo que tem menos ministros do que antes. E passa também pela redução de outras despesas do Estado", afirmou.

Uma questão sobre as relações diplomáticas com a América Latina, onde João Lourenço ainda não se deslocou ao longo dos seus 15 meses de mandato, serviram para o presidente angolano fazer o anúncio da sua deslocação a Cuba, "no fim do primeiro trimestre de 2019 ou no início do segundo trimestre de 2019". "Falta só o acertos das datas".


A encerrar a conferência de imprensa, que se prolongou por pouco mais de hora e meia, uma questão sobre as eleições gerais na vizinha República Democrática do Congo, que nesta quinta-feira, 20 de dezembro, anunciou o adiamento para 30 de dezembro. João Lourenço começou com um lacónico "não tenho opinião". "Eleições num país são uma matéria que tem a ver com o próprio país. Evidente que gostaríamos todos que tivessem lugar na data inicialmente aprazada [23 de dezembro], mas acredito que terá havido razões objetivas de força maior que levaram ao adiamento das eleições por cerca de uma semana".

"O importante é que elas tenham lugar e nota-se que houve a preocupação de ser ainda neste ano de 2018. Os nossos votos são que o ambiente melhore consideravelmente, sabemos que há alguma agitação, mas isso é normal quando há eleições. O nosso desejo é que nesta uma semana que falta as coisas voltem à normalidade e se crie o ambiente para que os cidadãos possam exercer o seu direito", destacou.