Luanda - O Ministério da Saúde na voz da titular da pasta, Dra Sílvia Lutucuta comunicou na semana finda, a conclusão do concurso público que visava preencher cerca de 1 500 vagas para médicos e perto de 600 vagas para os demais profissionais de saúde. O concurso público em causa foi uma forte recomendação da Assembleia Nacional feita em sede da aprovação do Orçamento Geral do Estado 2018.

Fonte: UNITA

Dos aspectos constantes das conclusões do Concurso Público destacou-se o facto de 825 médicos recém-formados que concorreram terem sido reprovados e as respectivas vagas foram preenchidas por enfermeiros com formação superior. O Ministério alega que a não admissão dos 825 médicos deveu-se ao seu péssimo desempenho dos mesmos na prova teórica, parte integrante do concurso e que compreendia três partes: cultura geral, ética em saúde e medicina geral.


A este propósito a UNITA acha oportuno tecer as seguintes considerações:


1- Sem pretender questionar a importância do conhecimento teórico para potenciar as habilidades práticas do profissional, entendemos que neste estadio interessava sobretudo perceber a desenvoltura prática dos candidatos, a sua capacidade de equacionar e resolver problemas mediante raciocínio lógico e disposição para assumir atitudes ante os problemas que se apresentam.


2- Neste sentido, uma avaliação teórica pontual, ainda que integrando as três temáticas acima referidas não seria capaz de captar as competências técnicas e humanas deste profissional recém-formado.


3- Por melhor que seja a formação médica o profissional médico saído da faculdade está longe de constituir um produto acabado. O melhor que a faculdade pode oferecer é a capacidade e vontade de continuar a aprender de forma mais autónoma.


4- Tivemos conhecimento, de fontes bem situadas no processo que o aplicativo electrónico desenvolvido para a correcção das provas revelou gritantes insuficiências e, apesar de absolutamente consciente destes erros gritantes do aplicativo a Comissão encarregue de supervisionar o concurso optou por validar os resultados.


5- Pelo exposto acima fica manifesto que o elevado número de reprovações registado tem mais relação com o modelo de avaliação escolhido do que com as competências efectivas dos concorrentes.


6- O facto das 800 vagas destinadas aos médicos terem sido preenchidas por enfermeiros é reveladora da confusão que ainda existe na nossa sociedade entre estas duas categorias profissionais e que o Ministério da Saúde com esta atitude só vem aumentar. Médicos e enfermeiros têm papéis diferentes na equipa de saúde, ambos importantes e não excludentes.


7- O espírito que motivou a Assembleia Nacional a recomendar vivamente a realização do concurso público tinha muito a ver com o paradoxo da existência de muitos recém-formados médicos desempregados, mesmo com as insuficiências transversais de pessoal nas unidades sanitárias e o recurso continuado a contratação de médicos estrangeiros, particularmente cubanos, que custam muito mais aos cofres públicos.


8- A reprovação liminar dos jovens médicos traz a tona um sério conflito de competências: ao reconhecer a Ordem dos Médicos, o Estado conferiu a esta instância profissional competência exclusiva para habilitar os médicos a exercer a profissão mediante atribuição da carteira profissional. É assim no mundo inteiro, são as Ordens Profissionais que regulam o exercício de uma profissão e é para isso que elas existem.


9- Ao impedir jovens médicos detentores da carteira profissional emitida pela Ordem dos Médicos de Angola, de exercer legalmente a profissão o MINSA extravasa as suas competências usurpando competências exclusivas da Ordem dos Médicos de Angola havendo aqui espaço para contestação judicial.


É estranho o silêncio da Ordem dos Médicos perante tão flagrante usurpação das suas competências e obrigação de defesa da classe, mas a polémica que se instalou em torno do processo de eleição do novo Bastonário da Ordem dos Médicos ajuda a compreender as veredas desta grave omissão por parte da Ordem. Por isso, achamos oportuno fazer o seguinte pronunciamento sobre o processo eleitoral do novo bastonário:


I – A extensão abusiva do mandato do bastonário cessante (11 anos - oito dos quais sem se submeter ao exame da classe) só foi possível por causa da partidarização excessiva das instituições, marca patente que caracteriza o regime do MPLA.


II – As irregularidades que têm marcado o processo eleitoral denunciadas pelos candidatos e médicos em geral demonstram que o MPLA ainda não se livrou deste vício de partidarização das instituições não se coibindo de recorrer a estratagemas que violam flagrantemente a Lei para assegurar um controlo despropositado sobre as instituições, neste caso particular, sobre a Ordem dos Médicos. Os vícios intencionalmente introduzidos visavam apenas favorecer o candidato José Luís Pascoal que é, por sinal, coordenador do Comité de especialidade dos médicos do MPLA.


III – Diante da reacção da classe médica, contra o rumo que vinha tomando o processo eleitoral, o Ministério da Saúde procurou salvaguardar a imagem daqueles que intencionalmente viciaram o processo eleitoral a favor da estratégia do MPLA, invocando uma falaciosa e pretensiosa tutela administrativa que efectivamente não existe.


IV – É a tomada de consciência cidadã da classe médica e não a tardia e desastrada intervenção do Ministério da Saúde no processo que permitiu de facto introduzir atempadamente profundas correcções no processo. Com este acto os médicos terão contribuído substancialmente para o processo doloroso e sinuoso de aprofundamento da nossa democracia.


Diante destes factos a UNITA considera importante o seguinte:


- Que seja conduzida pela Inspecção Geral da Administração do Estado (IGAE) e pela Assembleia Nacional (6ª Comissão) uma auditoria ao concurso de admissão de profissionais de saúde 2018 com o intuito de se porem a nu as irregularidades que mancharam o processo e se introduzirem as correcções necessárias.


- Recomendar que sejam admitidos todos os jovens médicos e que sejam submetidos a um período experimental de 6 a 12 meses com acompanhamento rigoroso já que o que os habilita a exercer medicina é a carteira profissional outorgada pela Ordem dos Médicos que eles já possuem.


- Felicitar a classe médica pela tomada de consciência cidadã e de classe bem como a coesão demonstrada que permitiu recolocar o processo eleitoral no rumo certo e augurar que o futuro bastonário resulte de facto da vontade genuína da classe e não de imposição partidária.


- Reprovar a atitude de distanciamento do Ministério da Saúde em relação a classe médica, manifestada em reiteradas ocasiões por expressões de desprezo da importância da classe e pela preferência de uma relação vertical em vez de um diálogo horizontal com a classe através dos diversos órgãos representativos.


- Apelar ao Ministério da Saúde no sentido de empreender desde já um diálogo aberto, abrangente e inclusivo com o Sindicato dos Médicos de Angola (SINMEA) para se evitar que se cheguem a situações extremas. As reivindicações dos médicos por melhores condições de trabalho são absolutamente legítimas e a sua satisfação contribuirá em grande medida para a melhoria do serviço prestado pelas unidades públicas de saúde redundando em benefícios evidentes para a população carente e sofredora.

Dr . Maurílio Luiele
Ministro para a Saúde do Governo Sombra da UNITA