Luanda - Em entrevista à RTP, a primeira a uma televisão portuguesa desde que assumiu a Presidência de Angola, João Lourenço abordou temas como as relações bilaterais, o pagamento de dívidas a empresas portuguesas, o combate à corrupção e a estratégia de crescimento para o país.

Fonte : RTP - Transcrito pelo Club K 

"Se estiver de boa saúde, com certeza que vou concorrer"


Estamos na véspera do seu aniversário e convidou o Presidente da República Portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa, para esse evento. Foi mera coincidência ou na política não há acasos?
De facto, na política não há acasos. Juntámos o útil ao agradável. Disse em Portugal que, para além das relações institucionais, na política as relações pessoais ajudam. É neste quadro que eu convidei o Presidente Marcelo, que chega a Luanda exactamente no dia do meu aniversário.

Como são as suas relações pessoais com ele?
São boas, são boas, apesar da diferença de idades. As relações são boas e procuramos cultivá-las cada vez mais.

Ao longo dos últimos anos, as relações entre Portugal e Angola têm tido altos e baixos. Do seu ponto de vista, neste momento, como classifica as relações entre os dois países?
Neste preciso momento, as relações estão no pico da montanha, lá bem acima. De qualquer forma, temos o dever de continuar a trabalhar no sentido, não diria manter de manter este nível, mas se possível subir ainda mais.

Isto depois de um período que foi uma fase muito baixa relacionada com o processo Manuel Vicente, entretanto já superado. Porque é que para Angola esta foi uma questão tão relevante?
Bom, para Angola esta questão foi relevante porque estávamos perante o incumprimento de um acordo entre dois Estados e dois Estados que se querem bem. Havia necessidade de uma das partes recordar à outra que temos um acordo que precisa de ser cumprido. Felizmente, o bom-senso acabou por vencer e esse momento difícil passou rapidamente e não deixou sequelas.

No seu discurso inaugural, em Setembro de 2017, o senhor não fez referência a Portugal justamente por causa desse caso. Na altura, foi um pouco decepcionante em Portugal. Acha que se hoje fizesse um discurso semelhante, a referência a Portugal estaria presente?
Primeiro, gostaria de dizer que a interpretação é vossa quando dizem que foi intencional não ter feito referência explícita a Portugal. Não fiz referência explícita a todos os países que estavam presentes na cerimónia e havia bastantes países, na sua maioria africanos. Portugal era dos poucos países europeus que estava presente, tirando os que estavam representados ao nível dos respectivos embaixadores.

É verdade que as relações entre Portugal e Angola sempre foram especiais desde a proclamação da independência em 1975. De qualquer forma, devo dizer que não foi intencional essa… chamemos-lhe omissão. Não houve nenhuma omissão intencional. A única verdade que há nisso é que não citei o nome de Portugal. Numa ocasião futura, digamos daqui a três anos sensivelmente, quando se realizarem novas eleições, não devo adiantar o que direi sobre Portugal, mas será uma surpresa para todos, angolanos e portugueses, e será com certeza uma boa surpresa.

Eleições a que irá concorrer. Não há dúvidas sobre isso?
Em princípio, se até lá estiver de boa saúde com certeza que vou concorrer.

Apesar de tudo, ainda há algumas questões entre os dois países e uma delas está relacionada com a dívida do Estado angolano a algumas empresas (portuguesas). Qual é exactamente o montante da dívida e qual é o calendário para o pagamento?
O montante da dívida varia consoante os momentos. Desde a minha visita a Portugal até aos dias de hoje temos vindo, gradualmente, a reduzir esse valor. Nos próximos dias vamos fazer mais um pequeno esforço no sentido reduzir ainda mais esse valor. O importante é que toda a dívida é para ser paga desde que o devedor reconheça que deve e Angola reconhece que deve. Ao nível das equipas ministeriais tem havido um trabalho, quase permanente, no sentido do reconhecimento da dívida.

Existe um calendário para esse cumprimento ou vai-se fazendo caso a caso?
Se fosse possível liquidarmos a dívida de uma vez, fá-lo-íamos. É evidente que isso não é possível. O importante é dizer que estamos a fazer o esforço de acelerar esse reembolso da dívida para com Portugal.

Negócios com Portugal

Qual é a importância para a Sonangol – que é a maior empresa de Angola - dos seus investimentos em Portugal, nomeadamente no Millenium BCP e também indirectamente na Galp? A Sonangol está a desfazer-se de algumas participações noutras empresas. No caso português, qual é a intenção em relação à futura presença da Sonangol?
De uma forma geral, a Sonangol tem a instrução no sentido de se retirar daqueles negócios que não têm muito a ver com a sua actividade: a extracção e a comercialização de petróleo. No concreto, vamos ver caso a caso. No caso da Galp, (a empresa) está ligada ao sector do petróleo, não há razão para sair. A explicação é essa, é o mesmo tipo de actividade que faz parte do mesmo negócio. A questão não se põe na Galp. Em relação ao banco, reitero o que disse em Portugal, no final da minha visita de Estado. Em princípio, vamos manter-nos.

Em que outras áreas é que o senhor conta com o investimento português ou com o apoio português em Angola ou que gostaria que fosse reforçado?
Gostaríamos de ver maior presença do empresariado português na agricultura, nas várias indústrias, na indústria transformadora e no turismo.

Uma das áreas para a qual Angola pediu recentemente o apoio de Portugal foi no possível repatriamento de dinheiro que possa ter saído ilegalmente de Angola. Que tipo de apoio Portugal pode dar? Existe uma estimativa de qual será o montante desse dinheiro?
Tratámos dessa matéria quando da minha visita a Portugal, em particular com o primeiro-ministro António Costa, que se comprometeu ajudar-nos na medida do possível e nos moldes que acordámos. Quanto aos valores, preferimos não revelar por enquanto. Na devida altura, a opinião pública tomará conhecimento.

Combate à corrupção em Angola: "Acabei por ter oportunidade de ter a dimensão real do quanto a corrupção em Angola representava"

Porque é que o senhor elegeu o combate à corrupção como a prioridade do seu Governo e do seu mandato?
Não fui eu quem elegeu, foi o meu partido. Uma das questões fundamentais que o MPLA defendeu durante a campanha, um dos compromissos que o partido assumiu perante os eleitores e, consequentemente perante os angolanos, foi a necessidade urgente do combate à corrupção. Tinha de haver uma razão, não foi por mero acaso que na sua agenda eleitoral o MPLA escolheu o combate à corrupção como prioritário.

Concluiu-se na altura que os níveis de corrupção no nosso país tinham atingido níveis insustentáveis. Era preciso fazer alguma coisa sob pena de afugentar o investimento privado estrangeiro, tão necessário para o desenvolvimento do nosso país. Eu, como bom soldado, estou simplesmente a cumprir aquilo que o meu partido me orientou a fazer.

Então este não é um combate de um homem só? É um combate do partido e com o apoio das Forças Armadas? Há um envolvimento nacional no combate à corrupção?
Este é um combate de todos, embora a iniciativa tenha sido do partido pelo qual me elegi. Este é um combate do MPLA e de praticamente toda a sociedade. Toda a sociedade está envolvida; várias instituições estão envolvidas, particularmente a Justiça, e a sociedade civil tem colaborado naquilo que lhe compete. Penso que será uma questão de tempo até termos a garantia de que esta batalha será vitoriosa.

Ficou surpreendido com a dimensão da corrupção no aparelho de Estado? Ou era uma ideia que já tinha antes de chegar à Presidência?
É precisa que se diga que não sou alguém vindo de outro país, de outro planeta, de outro partido político. Eu sou parte do sistema. Cresci dentro do MPLA e, muito antes de vir parar à Presidência da República, acompanhei tudo o que foi sendo feito de bom e de mau pelo meu próprio partido. Não foi uma surpresa. A única diferença é que, posto cá, acabei por ter oportunidade de ter a dimensão real do quanto a corrupção em Angola representava.

Sabe que este combate mexe com interesses instalados. Chegou a falar de um “vespeiro”. Está convencido de que é um combate que tem condições de vencer?
Estou convencido que sim, caso contrário já teria desistido. Se não desisti é porque estou preparado para a luta. Sei que não estou sozinho e, por não estar sozinho, sinto-me estimulado a liderar esta luta. Só estou a liderar, não estou a fazer o combate. É uma luta que é de todos. É difícil. Devemos ser honestos e dizer que carece de muita coragem, da perda de muitas noites, mas pensamos ter os nervos de aço suficientemente fortes para levar este combate até ao fim, sejam quais forem as dificuldades e as ameaças que possamos encontrar pelo caminho.

Alguns observadores questionam-se, relativamente a esta questão, até que ponto esta é uma mudança profunda em Angola ou se será apenas algo cosmético, sendo possível que daqui a algum tempo regressem práticas profundas com outras personalidades. Acha que há uma mudança de práticas, de métodos e de cultura que vai permitir uma Angola nova naquilo que é a relação com a corrupção?
Ninguém pode garantir que daqui para a frente não haverá corruptos. Essa garantia ninguém dá. A única garantia que podemos dar é que poderá haver corruptos, mas não ficarão impunes. A grande diferença não é haver ou deixar de haver corrupção. O problema é que dantes havia corrupção e impunidade; essas duas categorias estavam praticamente casadas. Nesta nova era, se houver corruptos – e admito que possa haver - não haverá impunidade. Ou não é descoberto, ou se for descoberto não haverá impunidade.

"A única garantia que podemos dar é que poderá haver corruptos, mas não ficarão impunes"

Independentemente de quem seja? Não há intocáveis?
Com certeza. Disse, creio que no congresso extraordinário que me elegeu como presidente do partido, que o tempo da impunidade tinha ficado para trás e que deixava de haver intocáveis no nosso país. A prática está aí para confirmar essa minha afirmação, porque há pessoas que hoje estão a contas com a Justiça que, há dois anos, era impensável falar-se sequer da possibilidade de esses nomes estarem hoje com problemas com a Justiça.

Pelo poder que detinham na altura?
Com certeza.

Nos primeiros dois meses do seu mandato, o senhor afastou Isabel dos Santos da Sonangol, o seu irmão Filomeno dos Santos foi exonerado do Fundo Soberano de Angola e uma outra irmã foi afastada da gestão de um dos canais da TPA. O senhor não receia que o acusem de estar a ajustar contas ou a perseguir a família do antigo Presidente?
(Suspiro). Bom, essas pessoas têm outros irmãos, não são só três irmãos. Por que razão é que as medidas que acabou de citar foram tomadas só contra esses três? Não é perseguição a ninguém. Seria perseguição se os tocados fossem apenas eles, mas há outras individualidades, outras figuras públicas, pessoas de peso, ministros…

Generais?
Esses não eram ministros, não eram generais. Então se se toca em ministro, em generais, não se toca em cidadãos que – mesmo sendo filhos de quem são – não deixam de ser cidadãos comuns? Acho que a afirmação de que é uma perseguição à família do anterior Presidente não colhe.

Admite que o anterior Presidente, quando terminar o seu período de imunidade, possa prestar contas à Justiça, se houver elementos para isso?
Eu não sei, porque não sou o procurador-geral da República. O Ministério Público é que, se tiver elementos, se tiver razões para tal, acaba por abrir processos contra os cidadãos.

Angola "não tinha saúde financeira"

Como encontrou o país, em termos económicos e financeiros, quando chegou à Presidente em Setembro de 2017?
Devo dizer que não encontrei bem. O país não tinha saúde financeira.

Estava em pré-bancarrota?
Talvez não. A expressão bancarrota tem um significado. Talvez não tivéssemos chegado a esse ponto, não chegámos com certeza, mas estávamos num período de crise, devido à falta de diversificação da nossa economia. O país tem pouca produção de bens exportáveis, de bens que possam angariar divisas e o petróleo na altura...

O petróleo vale cerca de 70 a 80 por cento das exportações de Angola?
Mais do que isso.

Quase 90 por cento?
Quase 90 por cento. Isto é uma situação complicada.

Porque cria uma grande dependência da oscilação dos preços do petróleo?
E a luta que estamos a fazer é precisamente procurar diversificar a economia, criando um ambiente de negócios favorável ao investimento privado, quer nacional quer estrangeiro, no sentido de desenvolvermos outras áreas da nossa economia, para além do sector petrolífero.

Ao fim de quase ano e meio de exercício já tem resultados para apresentar? Para nos dizer que a economia está hoje mais diversificada ou que foram lançadas as sementes para estar mais diversificada no futuro?
Isto não é um trabalho acabado, não seria correcto dizer que hoje a economia está mais diversificada, mas o caminho é este. O ambiente propício ao investimento está aí, foi criado em tempo recorde, em pouco mais de um ano. Combatemos os monopólios, estamos a fomentar a concorrência entre as empresas e, com este ambiente, é uma questão de tempo até aumentar a quota do sector não petrolífero na economia nacional.

As grandes apostas do Governo angolano serão sobretudo a agricultura e a indústria? Ou teremos outras áreas?
A agricultura, a indústria, as pescas e o turismo, sobretudo estas quatro áreas, que produzem riqueza, geram emprego e originam produtos de exportação, que podem pesar na capacidade de geração de divisas.

Melhoria das condições de vida em Angola

Do seu ponto de vista, quando é que isso terá um reflexo directo na vida das pessoas, nomeadamente em termos de melhores condições de vida, de mais emprego, de um custo de vida mais moderado? Quando é que acha que os angolanos poderão ter melhores condições face à nova situação económica que quer por em prática?
Isto vai acontecendo e as próprias pessoas hão-de sentir que as medidas tomadas neste período, um ano e cinco meses, vão começar a surtir efeitos. Devo dizer que, nos últimos anos, o acesso à Função Pública estava praticamente congelado e nós abrimos concursos de ingresso, nomeadamente em dois sectores importantes da área social: a educação e saúde. Foram, pelo menos, 20 mil professores que ingressaram o ano passado. Alguns na área da saúde. Só isso é um sinal evidente de que alguma coisa mudou, porque o principal empregador – o Estado – tinha encerrado as portas aos potenciais candidatos a emprego na Função Pública.

O acordo que o Estado angolano fez com o FMI não implica medidas de austeridade que tenham efeitos na organização do Estado, como a redução do número de pessoas ou o congelamento de salários? Essas medidas de austeridade, muitas vezes associadas a planos do FMI, não vão acontecer em Angola?
Não, não vão acontecer em Angola, pela simples razão de que este programa não é do FMI. Este programa é do executivo angolano, que o FMI abraçou e entendeu apoiar através de assistência financeira e técnica. Por esta razão, todas as medidas de austeridade que existem foram auto-impostas. Ou seja, é o próprio Executivo angolano que, antes mesmo de chamar o FMI, auto-impôs-se (uma série de medidas), que depois mereceram o aval do credor, o FMI.

Em Dezembro passado, relatórios das Nações Unidas, nomeadamente a UNICEF, revelaram que metade da população de Angola vive em situação de pobreza e larga maioria das crianças não têm ou habitação adequada, ou a alimentação ou a saúde adequadas. Como é que o seu Governo vê este problema e vai enfrentá-lo?
A pobreza é um problema do continente e do nosso país. É um facto que existe pobreza em Angola, como existe em muitas partes do mundo. A nossa luta é gradualmente ir lutando para a redução desses mesmos índices de pobreza.

A pobreza está associada sobretudo aos longos anos do conflito armado. Não havia circulação e os campos estavam minados. Nos últimos anos, foi feito um esforço muito grande no sentido, em primeiro lugar, da desminagem dos campos e da abertura de vias. Existe circulação por terra. Hoje, a oferta de bens alimentares produzidos localmente já é bastante significativa. Em termos de fome, por exemplo, não se pode dizer que exista fome em Angola.

Pode haver má nutrição?
Pode haver alguma má nutrição, há sempre alguma, mas - comparativamente aos anos de conflito - houve uma evolução bastante significativa. É evidente que a pobreza não é só a falta de alimentos. A pobreza tem a ver com as condições de habitação da população, o acesso à escola, o acesso à água potável. Têm vindo a ser feitos grandes investimentos no sentido de satisfazer o maior número possível de cidadãos com acesso à água potável, energia e habitação.

Há pouco, referiu que será candidato às próximas eleições se tiver condições de saúde.
É cedo para se falar disso.

Que visão tem para Angola? Que herança gostava de deixar quando, no final de dez anos, deixar a Presidência angolana?
O sonho de qualquer líder é fazer bem aos cidadãos do país. O sonho de qualquer Chefe de Estado é melhorar as condições de vida, de uma forma geral, dos cidadãos, não apenas a nível material, que é importante, como também espiritual, os direitos e liberdades dos cidadãos. Que os cidadãos tenham mais acesso à imprensa, mais liberdade de expressão, mais liberdade de manifestação, que já está a acontecer.

É um ponto crucial do seu exercício?
Sim, é um ponto crucial. Hoje não é tabu alguém organizar uma manifestação pública, não é considerado crime. As organizações não-governamentais e da sociedade civil hoje não são estigmatizadas, não há quem seja considerada contra o regime pelo simples facto de discordar do Presidente, de discordar das políticas do Governo. Também nesse aspecto, o nosso sonho e não só sonho, porque na prática temos trabalhado para atingir esse objectivo, os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos estão a ser respeitados. Obviamente, do ponto de vista material, os direitos à habitação, emprego, saúde, água potável, energia, é uma luta de todos os dias.

Qual a sua opinião sobre a CPLP? Acha que é uma organização que tem sido meramente simbólica ou há aqui um potencial que pode ser aproveitado?
Sobre a CPLP há muito que se lhe diga. A CPLP é uma organização de países que, do ponto de vista geográfico, estão descontinuados. Estamos em vários continentes. De um certo ponto de vista isso é uma desvantagem, mas de outro ponto de vista é algo muito importante. Significa que a organização tem uma dimensão internacional, estamos praticamente em todo o mundo, estamos em cinco continentes.

O que tem sido feito em prol dos povos e dos países que integram esta organização eu acredito que é pouco. Temos privilegiado sobretudo questões de ordem histórica, cultural, linguística e pouco de ordem económica, sobretudo de cooperação económica. Esta é uma parte que está em falta mas ainda vamos a tempo de prestar atenção a ela. Angola deve assumir a presidência dentro de um ano, depois de Cabo Verde, e vamos ver o que fazemos.

O xadrez político angolano

Sei que é um praticante de desporto, gosta muito de desporto e também de xadrez.
Também é desporto.

(Risos) De outra natureza. Há alguma coisa na estratégia do xadrez que seja importante para o exercício político?
Prever as jogadas do adversário, pelo menos esse aspecto é importante. E quanto mais jogadas antecipadas do adversário conseguir prever, melhor defesa poderá ser preparada para derrubar o adversário. Pelo menos nisso é extremamente importante.

Há algum líder político, nacional ou internacional, que seja uma inspiração para si?
Não gosto muito de falar de pessoas, sob pena de omitir outros. Apenas um é um pouco perigoso.

Mas pode dizer dois ou três. Quem são as suas referências quando pensa num líder político, cujo percurso tenha inspirado o seu próprio percurso.
Em primeiro lugar, a nível nacional é Agostinho Neto, fundador da nação. Passou pelo que passou, por todas as vicissitudes da vida, e conseguiu liderar o seu povo para a independência. Digamos que foi o Moisés de Angola, que levou o seu povo à terra prometida.

Internacionalmente, correndo o risco de discriminar alguém, há uns quantos líderes políticos que merecem o meu respeito e a minha consideração. A nível africano, para além dos tradicionais pais da independência, dos anos 60, e que são pelo menos cinco ou seis. Mais recentemente, Nelson Mandela, pela capacidade de perdão, que não é usual nos políticos.

Se olharmos para a História, o povo judeu sofreu bastante durante o Holocausto e Israel persegue os seus algozes, persegue os nazis e colaboradores de nazis até hoje, passados mais de 50 anos. Nelson Mandela orientou o seu povo a não perseguir ninguém, antes pelo contrário, a fazer a paz e a perdoar aqueles que fizeram mal ao povo sul-africano de uma forma geral. Esta capacidade de perdão deve ser reconhecida, aliás, está a ser reconhecida universalmente. As próprias Nações Unidas criaram um dia dedicado a Nelson Mandela. Por alguma razão o fizeram.

Qual é a motivação principal que o leva a exercer politicamente este lugar de Presidente de Angola?
A minha principal motivação é servir cada vez mais e melhor o povo angolano. Foi o povo angolano quem me colocou neste lugar, com uma missão muito clara, a de governar o país, levar o país a bom porto – se considerarmos Angola como um navio – em todos os aspectos.

É isso que procuramos fazer todos os dias, com bastante esforço, trabalhando bastante, dormindo pouco, descansando pouco, mas não temos de nos lamentar por isso. Se aceitamos o desafio é para encará-lo de frente e sem lamentações. Todas as dificuldades que encontrarmos devem ser consideradas como normais, próprias do ofício. Se conseguiremos superá-las a todas ou não, veremos quando chegarmos ao final do mandato.

Ainda é cedo para fazer um balanço geral. Estamos apenas com um ano e cinco meses (de mandato). (Só) quando chegarmos ao fim do mandato e, mesmo aí, de certeza que os problemas do país não estarão todos resolvidos. Ninguém consegue esse milagre de resolver todos os problemas de um país, qualquer que seja o país, e Angola não é uma excepção.