Luanda - O antigo chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas general Francisco Pereira Furtado afirmou que, nos últimos anos do seu mandato, o ex-Presidente da República e Comandante-em-Chefe das FAA, José Eduardo dos Santos, deixou-se influenciar na tomada de muitas decisões.

Fonte: JA

Numa entrevista ao programa “Café da Manhã”, da LAC, emitido ontem, Francisco Furtado disse que José Eduardo dos Santos foi deixando-se influenciar por algumas decisões ou foi tomando decisões com determinadas influências que não eram as mais adequadas para o momento que o país estava a viver. Isso foi acontecendo já na fase final da guerra e “na fase posterior foi um desastre total”.


Os então Serviços de Apoio à Presidência da República, lembrou, chegou a estar acima da estrutura do comando militar e dos órgãos de defesa e segurança. “Ao invés de seguirmos uma única orientação vertical, cruzavam-se várias orientações e disposições horizontais que chocavam com a verticalidade da direcção das Forças Armadas”, contou.


Francisco Furtado lembrou também o momento que marcou a sindicância e a exoneração do general Fernando Garcia Miala das Forças Armadas Angolanas.

“O meu espanto é que depois de eu estar no cargo cerca de dois meses ou um mês e meio, surge uma orientação verbal de que eu deveria convocar o general Miala para o acto de despromoção pública no meu gabinete, convocando a imprensa. Não era da minha competência, um General de Exército, despromover um general de três estrelas. Isso não acontece em nenhuma parte do mundo”, recordou o antigo chefe do Estado-Maior General das FAA, que de imediato negou aquela orientação.


Francisco Furtado exigiu que lhe apresentassem um documento assinado pelo Comandante-em-Chefe, na medida em que a promoção do general Miala não tinha sido feita no Estado-Maior General das FAA. “Portanto, não é justo querer fazer um acto desta natureza obrigando-me a cumprir uma orientação que, do ponto de vista ético e deontológico, como chefe do Estado-Maior General, não é da minha competência”, sustentou, na altura, o general.


Furtado contou ainda que, cerca de 15 dias depois, foi ao encontro de José Eduardo dos Santos, para, na qualidade de Comandante-em-Chefe, tentar esclarecê-lo que a orientação que lhe estava ser dada pelos seus auxiliares constituía um acto inconstitucional, caso fosse executada pelo chefe do Estado-Maior das FAA.
Questionado sobre qual terá sido a reacção de José Eduardo dos Santos, o general Furtado deu a entender que o Comandante-em-Chefe nem sequer chegou a responder, pois o pessoal à sua volta insistia que o chefe do Estado-Maior General das FAA tinha competência de despromover um general.


Entretanto, Furtado manteve irredutível, concluindo que foi a partir daí que começaram as suas divergências com algumas pessoas do círculo presidencial, que entretanto não as citou.

Miala foi vítima de cabala

Francisco Pereira Furtado confirmou que Fernando Garcia Miala, afastado do cargo de director-geral do então Serviço de Inteligência Externa (SIE), em Fevereiro de 2006, “foi vítima das maiores cabalas que existiram no país”. Entretanto, em Março do ano passado, o general Garcia Miala foi recuperado pelo Presidente João Lourenço, nomeando-o chefe do Serviço de Inteligência e Segurança do Estado, em substituição do comissário Eduardo Filomeno Bárber Leiro Octávio.


O general Furtado acredita que se não antecipasse o seu pedido de demissão, seguiria o mesmo caminho de Fernando Garcia Miala. “A sorte foi eu ter antecipado o meu pedido de demissão, porque o segundo seria eu”, disse.


O antigo chefe do Estado-Maior General das FAA negou que esteja magoado com o que aconteceu. “Eu aprendi muito com a minha formação religiosa, particularmente. Porque eu fiz a fase inicial do meu ensino ligado à Igreja Católica. Vivi numa casa de crianças e depois estudei nos Salesianos. Aprendi, desde cedo, a perdoar, a respeitar e a amar. Porque se não houver perdão e não amar o próximo, você não é absolutamente nada na vida”, disse o general Francisco Furtado.