Luanda - Uma mão estendida à Europa, outra agarrada à China. É assim que agora Angola deambula desesperadamente pelos mercados internacionais para tentar sacudir o sufoco que se abate sobre uma tesouraria que está a provocar stresse à nova ministra das Finanças, Vera Daves.

*Gustavo Costa
Fonte: Expresso

Acossado por uma pressão social sem precedentes, o Presidente João Lourenço decidiu apostar nos eurobonds (obrigações em euros) para tentar travar a atual crise financeira do país, ao mesmo tempo que pede compreensão a Pequim para alargar os prazos do pagamento de uma dívida que ascende a 15 mil milhões de dólares (€13,51 mil milhões).

 

Foi isto que a ministra das Finanças foi esta semana fazer à China, depois de ter ido bater à porta da Bolsa de Londres para captar, numa única emissão, 3 mil milhões de dólares (€2,7 mil milhões).

 

“Esse dinheiro servirá para tapar o buraco de tesouraria destes últimos meses do ano e dos primeiros meses de 2020, assim como para financiarmos o próximo Orçamento Geral do Estado e algumas empreitadas enquadradas nos investimentos públicos”, disse ao Expresso um alto funcionário do Ministério angolano das Finanças.

 

Em antecipação a uma ida a várias praças financeiras e alertada a opinião pública, Angola não parecia ter outra saída perante as crescentes dificuldades que se avizinham com a chegada de um novo ano.

 

Destinado essencialmente a pagar a dívida de curto prazo, que está a vencer, o país recusou alinhar novamente em obrigações do Tesouro para aliviar o seu peso.

REFLEXO DE MAIOR CREDIBILIDADE?


Em contrapartida, optou por ir captar divisas para se proteger dos riscos cambiais através de uma operação em que 1,75 mil milhões de dólares (€1,58 mil milhões) terão uma maturidade a 10 anos e 1,25 mil milhões de dólares (€1,13 mil milhões) uma maturidade a 30 anos.

 

Com uma grande aderência, a subscrição total do mercado chegou a ascender aos 8,44 mil milhões de dólares (€7,6 mil milhões), tendo reduzido em 25 pontos percentuais todas as maturidades com uma taxa de juro do cupão fixada em 8% para a parcela a 10 anos e em 9,125 % para a parcela a 30 anos.

 

A obtenção destas taxas de juro “reflete a credibilidade internacional, reconhecida pelos mercados financeiros quanto às reformas institucionais em curso em Angola”, afirma um gestor ligado à operação feita na Bolsa de Londres.

 

Depois de ter recebido a não oposição do Fundo Monetário Internacional (FMI) para ir aos mercados, João Lourenço passou a ser acusado de estar às ordens deste organismo.

 

Rejeitada essa subordinação, um alto funcionário do Ministério das Finanças, em declarações ao Expresso, assegurou que “o Governo será cauteloso na contração de novos empréstimos e está determinado em apostar na qualidade da despesa e na participação do sector privado na implementação de determinados projetos com potencialidade de rentabilidade”.

 

E acrescentou: “Melhor do que essa emissão, só os empréstimos concessionais” atribuídos pelo FMI. A ministra das Finanças, satisfeita com o resultado desta operação, espera agora vir a ter acesso a créditos concessionais com taxas de juro mais baixas, com prazos de maturidade alargados e sem o petróleo ou outro recurso mineral como garantia.

 

Já relativamente às receitas fiscais provenientes do sector petrolífero, as autoridades mostram-se prudentes perante limites que “não permitem aumentar os impostos desmesuradamente”.

 

Com esta última ida aos mercados eleva-se para três o número de emissões de eurobonds, que nos últimos quatro anos já representaram, no seu conjunto, a absorção de mais de 8 mil milhões de dólares (€7,21 mil milhões).

 

A contração destes empréstimos num cenário de crescente inflação, retração do investimento, redução das receitas fiscais e crescimento económico negativo não deixa, no entanto, de estar a tirar o sono a João Lourenço.

 

A oposição contesta o volume e o perfil da dívida, mas Vera Daves desdramatiza a situação e garante que em 2020 um volume significativo da dívida de curto e médio prazo será liquidado e que em 2021 o serviço da dívida baixará para os 30% da despesa pública, contra os atuais 60%.

 

“Não usaremos o dinheiro para pagar a dívida vincenda e até 2021 não nos engajaremos em projetos de grande dimensão e sem financiamento garantido”, sublinhou fonte do Ministério das Finanças.