Luanda - Em conversa com um amigo acabado de chegar do Brasil, onde fez o seu Doutoramento em Politicas Públicas, falamos sobre a situação actual no mundo e, como não podia deixar de ser acabamos em África. Dizia o nosso amigo que: a África precisa de passar por cinco revoluções: agrícola, infraestrutural, tecnológica, científica e mental para deixar de ficar de braço estendido ao ocidente a espera de migalhas.

Fonte: Club-k.net

Agricola, Infrastructural, Teconlógica, Científica e Mental

Mesmo sem um estudo profundo da situação nos países do terceiro maior continente do mundo (depois da Ásia), só pelo que se ouve, vê e lê na mídia e nos livros, dá para perceber e faz todo o sentido, que para sair da mendicidade o continente berço precisa de passar por aquelas cinco revoluções mencionadas.

REVOLUCÃO AGRÍCOLA


Comer é uma das necessidades básicas, se não a mais básica de todas. Precisamos de produzir a nossa comida, nós próprios, temos que ser autossuficientes em termos alimentares. Com os seus 30,37 milhões de quilómetros quadrados, cobrindo 20,3 % da área total da terra firme do planeta azul, três vezes o tamanho dos Estados Unidos da América e quase duas vezes a Rússia, o nosso continente tem terras aráveis subaproveitadas que poderiam alimentar o globo. Com metade das terras do mundo não cultivadas adequadas para a produção de alimentos, e responsável por apenas dez por cento da produção agrícola global com um quarto das terras aráveis do mundo, o continente africano pode ser, com mais investimento (em know how e tecnologia agrícola), o celeiro do planeta.

REVOLUCÃO INFRASTRUCTURAL


Em termos de infraestruturas, diz um estudo do Banco Mundial, divulgado a 12 Novembro 2009 pela BC News Brasil, o continente africano tem a pior infraestrutura do mundo. O estudo analisou as infraestruturas em eletricidade, água, estradas e tecnologias de informação e comunicação em 24 países da África subsaariana. Cujos resultados, publicados no relatório Africa’s Infrastructure: A Time for Transformation, afirma que a falta de infraestrutura reduz a produtividade no continente em até 40%.


Infraestruturas modernas constituem a espinha dorsal de qualquer economia e a sua falta inibe o crescimento económico, diz ainda o mesmo estudo. Só para citar um, quem não sabe os males que o acesso inadequado à energia provoca, quem consegue dormir sem AC no calor infernal de Luanda, com mosquitos a mistura, quando a luz baza? Diz o estudo mais adiante que, a falta de infraestruturas adequadas é o maior impedimento para o crescimento económico do continente.


Com relação à infraestrutura ligada aos recursos hídricos, o estudo aponta ainda problemas no armazenamento (captação e tratamento adequado da água), menos de 60% da população africana têm acesso à água potável. Nos últimos 40 anos, somente 4 milhões de hectares de irrigação foram desenvolvidos, comparados com 25 milhões da China e 32 milhões Índia.

No ramo dos transportes, o documento atesta que os principais problemas são a falta de eficácia nas conexões entre os diferentes meios de transporte (terrestre, ferroviário e aéreo), a falta de equipamentos nos portos, ferrovias antigas e estradas em más condições de transitabilidade. Pelo que, a melhoria do acesso às áreas rurais é essencial para aumentar a produtividade agrícola em todo o continente.


As estradas são para a economia de um país, o mesmo que as veias são para o corpo humano, as veias levam sangue para todo o corpo e, as estradas levam o desenvolvimento até aos cantos mais recônditos de um país.

Falando da eficácia nas conexões entre os diferentes meios de transporte, deixar um repto à quem de direito. Quando foi lançada a notícia sobre o metro de Luanda, que começa a ser construído ainda este ano, o ministro dos transportes afirmou que, além do Metro de Superfície, o Plano Director de Luanda, prevê também dois sistemas de metro de superfície, designadamente o Bus Rapid Transit (BRT, que seria utilizado para sistemas de transporte urbano com autocarros) e o Veículo Rápido sobre Trilhos (carris), abreviadamente VLT. Os vários transportes são complementares, não concorrentes. Com o aumento populacional em Luanda, cada vez mais rápido, há ganhos de eficiência com esse transporte multimodal. Conectar metro urbano, autocarros, táxis e catamaran é um passo para destravar Luanda e livrá-la dos seus engarrafamentos crónicos e infernais.

REVOLUCÃO TECONLÓGICA


Segundo o dicionário Merriam-Webster, tecnologia é a aplicação do conhecimento aos objectivos práticos da vida humana ou à mudança e manipulação do ambiente humano. A tecnologia inclui o uso de materiais, ferramentas, técnicas e fontes de energia para tornar a vida mais fácil ou mais agradável e trabalhar com maior produtividade. Enquanto a ciência se preocupa com “como?” e “por que?” as coisas acontecem, a tecnologia preocupa-se em fazer as coisas acontecerem.


A melhor maneira de ver a tecnologia, talvez seja em termos de progresso. De várias maneiras, o mundo simplesmente melhora porque a tecnologia tem a capacidade de criar um padrão de vida mais alto. Uma vacina eliminou a poliomielite (estamos agora a tentar desenvolver uma para o COVID-19). A internet rompe barreiras sociais, raciais e do género. Os computadores oferecem melhor acesso à educação.


Em muitos lugares do mundo, a tecnologia está a ter um impacto transformador na vida das pessoas. No Togo rural, um agricultor pode obter informações em tempo real sobre os preços de mercado na capital por meio de um telefone celular. Em Accra, Gana, empreendedores que no passado, nem se quer podiam efectuar uma chamada de telefone fixo, agora podem conectar-se imediatamente usando a telefonia pela Internet. No Quênia, os agricultores podem usar os seus telefones celulares para obter informações sobre as suas vacas e sementes. Em Angola, desde 2001 que o sistema bancário nacional conta com um Sistema de Pagamentos Nacional de Angola (SPA), por via da Empresa Interbancária de Serviços (EMIS), constituída para prestar serviços electrónicos de compensação das transacções processadas na rede de pagamentos electrónicos nacional, a rede Multicaixa. É ela que se encarrega pela operacionalidade central do sistema interbancário automático de pagamentos. Hoje, milhares de transações são efectuadas diariamente na rede multicaixa.


Estes são apenas alguns dos inúmeros projetos que ajudam a colocar a África no mapa. Mas o que realmente fez o continente capitalizar no sector de tecnologia recentemente é o extraordinário crescimento de centros de tecnologia - locais onde codificadores, hackers, empreendedores e simplesmente geeks podem se unir para criar novos produtos digitais e fazer negócios. Esta valência, pode infelizmente, ser refreada pelas assimetrias locais em termos de capacidade infraestrutural instalada e preço dos serviços de telecomunicações.


Na avaliação da infraestrutura em tecnologias de informação e comunicação o estudo indica que os altos preços de serviços como a telefonia celular é um problema nos países africanos.


Pelo seu potencial de transformação, a tecnologia pode mudar a narrativa de África. O futuro de África e sua inserção no mundo globalizado dependem da rapidez com que o continente absorver as novas tecnologias de informação e comunicação que estão a avançar cada vez mais. Agora, por exemplo, com essa situação do COVID-19, o Ministério da Educação podia optar pela substituição das aulas presenciais por aulas à distância. Essa medida de os alunos levarem tarefa para casa para 15 dias, que se podem prorrogar por mais 15 e assim indefinidamente (ninguém sabe quando é que essa situação vai terminar), não é viável. Não existe nas ciências pedagógicas.


REVOLUCÃO CIENTÍFICA

Dizem os manuais de História Universal que a Revolução Científica tornou o conhecimento mais estruturado e mais prático. A ciência descreve, tenta compreender, explicar e predizer os fenómenos, bem como as relações que existem entre as características desses fenómenos, fazendo uso do método científico e da tecnologia. Portanto, a ciência está a serviço da humanidade para trazer soluções aos nossos problemas. A título de exemplo, o mundo debate-se actualmente com uma pandemia, o famigerado COVID-19, há um esforço global em curso para desenvolver vacinas e tratamentos contra essa doença, incluindo o reaproveitamento de medicamentos existentes aprovados. Temos a convicção, que mais cedo ou mais tarde a cura virá, até lá, há que alocar os recursos necessários para que os cientistas cumpram com o seu papel.


Nessa conformidade, as lideranças do continente precisam de perceber que muitos dos nossos dramas, já foram dramas de outros, por isso, encontram-se suficientemente estudados e documentados. Se lançarmos mão aos meios que a ciência já dispõe podemos mitigar muitos dos nossos problemas. Os indivíduos de participam mais activamente nos processos de tomada de decisões que afectam as nossas vidas, devem estar competentemente equipados para que tomem boas decisões para a coletividade. Daí a crescente importância da componente técnica do conhecimento, o conhecimento especializado, ou seja, para o emprego nas mais variadas especialidades, deve-se colocar pessoal formado, especializado e profissional para desepenhar a tarefa convenientemente. Isso reflete a progressiva disseminação da prática de se basear políticas públicas em evidências científicas e dados técnicos.

Se acreditarmos que as pessoas são o recurso mais valioso de um país, então, África, com 1,3 bilhão de pessoas, o que representa cerca de 16% da população humana do mundo, tem condições de se colocar na frente nessa disputa de fazer da ciência e da tecnologia um instrumento decisivo para a materialização do programa de combate a pobreza, ao analfabetismo e, consequentemente, a melhoria da qualidade de vida da população, para além de aumentar a eficiência e eficácia das instituições públicas e privadas.

REVOLUÇÃO MENTAL


A Revolução Mental, enunciada por F.W Taylor, implica a mudança de atitude dos trabalhadores e dos gestores. A revolução mental visava melhorar o pensamento de ambos, para criar um melhor ambiente de trabalho. Os trabalhadores e o gestor devem mudar de atitude e cada um deve perceber a importância um do outro. Ambos devem trabalhar em direcção aos objetivos comuns da organização. Os gestores devem cuidar das necessidades dos trabalhadores e compartilhar os benefícios com eles. Por outro lado, os trabalhadores devem envidar seus melhores esforços para a prossecução dos objectivos de instituição. Este conceito de Revolução Mental enunciado refere-se essencialmente da cooperação e confiança mútua entre trabalhadores e gestores.


Trazendo à colação este conceito de Revolução Mental de Taylor enunciado, os trabalhadores seriam o povo, os cidadãos dos países e os gestores seriam aquele pessoal à nível da tomada de decisão (políticos, chefes de departamentos ministeriais, gestores públicos e privados, etc) e, a organização ou empresa seriam os países.


Muitos dos problemas na África hoje, incluindo a pobreza generalizada e conflitos internos, podem ser atribuídos ao legado de má governação dos países do continente. No período pós-independência, homens fortes autoritários assumiram o controlo de muitos países, enriquecendo a si mesmos e a seus companheiros, explorando as populações e, apropriando-se do erário público e dos recursos dos seus países.


Nos últimos anos, no entanto, um número crescente de estados africanos adoptou princípios democráticos e estabeleceu governos transparentes e abertos. No seu livro “Governance And Leadership in Africa”, o estudioso, Dr. Robert Rotberg, examina o estado actual da governação e liderança em África e, mostra claramente a correlação entre a qualidade da liderança de um país e a qualidade de vida desfrutada pelo seu povo. A boa governação assenta em vários princípios universais e os seus indicadores demonstram o comprometimento e a capacidade do Estado em servir as necessidades dos seus cidadãos. Como no exemplo supra, a boa governação exige transparência e abertura, estas por sua vez, trazem consigo a cooperação e confiança mútua entre governantes e governados. Quanto melhor for a qualidade da liderança de um país, melhor qualidade de vida desfrutam os povos desse país.


CONFLITOS INTERNOS

As guerras locais foram determinantes para o subdesenvolvimento do continente. Após a 2a Guerra Mundial, instalou se a Guerra Fria e com ela a corrida para África. A consequência imediata disso foi uma disputa pela supremacia mundial entre Estados Unidos e União Soviética, tal disputa é chamada de Guerra Fria por ser uma intensa

guerra económica, diplomática e ideológica travada pela conquista de zonas de influência.


Uma vez que as potências europeias estavam enfraquecidas para manter seus domínios em África, eclodiram ao longo do continente diversos movimentos de independência. Depois disso, a evasão dos colonizadores e a desordem nas fronteiras favoreceram o surgimento de guerras civis em disputas de grupos rivais pelo poder. São disso exemplos: a Guerra Civil Nigeriana nos anos 60, a luta armada do Exército de Resistência do Senhor contra o governo do Uganda, que vem desde os anos 80, e a Guerra Civil da Somália, que acontece desde 1991, a situação dos grandes lagos, entre outros.


Angola, país devastado por uma guerra prolongada de quatro décadas, conquistou a paz há quase 18 anos, mas até hoje esforça-se para recuperar o tempo perdido com a implementação de políticas de desenvolvimento que permitam o relançamento da produção interna, o combate a pobreza e a melhoria da qualidade de vida da população. E não tem sido fácil o país desfazer-se do fardo da guerra.


Os africanos precisam de deixar de se ver como inimigos. Não somos inimigos uns dos outros, muito pelo contrário, a ameaça vem de fora do continente, de entidades que querem continuar a sugar os nossos recursos a qualquer custo. Mais chocante ainda é verificar que, enquanto o ocidente se fecha ao fluxo de migrantes africanos na sua fuga da guerra ou em busca de melhores condições de vida, aqui em África, também são notórios os pronunciamentos e actos contrários ao tão conhecido e propalado espírito de solidariedade africana, basta ver as reacções xenófobas dos sul africanos em relação aos nossos irmãos do Oeste africano e, até da SADC (Zimbabueanos e Moçambicanos). É triste!! Quando África poder proporcionar melhores condições para os seus filhos, vamos querer fugir para Europa ou América para ir lá fazer o quê?.

PORQUE É QUE NÃO HÁ PRÉMIOS NOBEL EM QUÍMICA, FÍSICA E MEDICINA PARA ÁFRICA?


O Prémio Nobel é um reconhecimento mundial entregue todos os anos por instituições suecas e norueguesas a pessoas ou organizações que realizaram, no ano precedente, pesquisas e descobertas benéficas à humanidade. Em alinhamento com a questão feita por outro amigo nosso, sobre o porque é que os Físicos, Químicos e Biólogos Africanos não figuram nas contendas para o Prémio Nobel nas respectivas disciplinas. Em jeito de réplica, diria que a maior parte dos países Africanos está ainda a operar à "nível da barriga" (ou seja, melhorar condições sociais básicas). Segundo o relatório 2014 do Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (Fida), 70% dos 1,4 bilhão de habitantes que vivem na pobreza extrema em países em desenvolvimento residem em zonas rurais. A pobreza rural é particularmente acentuada na África Subsaariana, onde vive quase um terço dos habitantes extremamente pobres de zonas rurais, cujo número aumentou de 268 milhões para 306 milhões, nos últimos dez anos, informou o Fida.


As pesquisas científicas que acabam trazendo os Prémios Nobel são dispendiosas. Sem as condições objectivas como a autossuficiência alimentar, económico-financeira e politica, sem o capital humano qualificado e as infraestruturas adequadas, nunca poderemos competir ao mesmo nível com o resto do mundo, continuaremos na Segunda Divisão.