Luanda - A JUBILAÇÃO (COMPULSÓRIA) DO JUIZ CONSELHEIRO MANUEL ARAGÃO PELO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA JUDICIAL IMPLICA CESSAÇÃO DE FUNÇÕES DE JUIZ CONSELHEIRO NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL?

Fonte: Club-k.net


1. Objecto do Parecer O Conselho Superior de Magistratura Judicial deliberou sobre a Jubilação do Juiz Manuel da Costa Aragão, que cessou funções de Conselheiro do Tribunal Supremo (daqui em diante designado de TS), por limite de idade, nos termos da alínea a) do n.º 1, do art.º 56, da Lei n.º 7/94, de 29 de Abril, que aprova o Estatuto dos Magistrados Judiciais e do Ministério Público.

 

Sucede, porém, que o Juiz Jubilado exerce funções de Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional (daqui em diante designado de TC). Em função destes dois factos, coloca-se a questão se a jubilação compulsória, por limite de idade, de Conselheiro do TS, implica igualmente a cessação de funções como Juiz Conselheiro do TC? É sobre a resposta a esta pergunta que irá incidir o presente parecer.

 

2. A Jubilação do Juiz Conselheiro Manuel Aragão no TS, implica cessação de funções no Tribunal Constitucional?

 

Feita a introdução, analisaremos em seguida, a questão fundamental deste debate jurídico, que é a de saber se a jubilação do Conselheiro Manuel Aragão como Juiz do TS, implica automaticamente cessação de funções de Conselheiro do TC.

Como ensinam os grandes mestres do Direito, qualquer resposta jurídica deve ser fundada em base legal (é esta técnica que distingue os juristas dos sociólogos, psicólogos, comentarista político etc). E a mesma fundamentação deve obedecer a pirâmide normativa vigente no ordenamento jurídico deste Estado. Em Angola por força do art.º 6 da CRA, a mesma ocupa a posição hierárquico-normativa superior. Logo, em consequência, para começarmos a responder à questão material controvertida, iniciaremos a análise do estabelecido na CRA, e, posteriormente, a demais legislação infra-constitucional.

 

Em primeiro lugar, devemos lembrar o que é o TC, sua composição e o processo de nomeação dos Juízes Conselheiros. O TC é o órgão supremo da jurisdição constitucional ao qual compete em geral administrar a justiça em matéria jurídico-constitucional (vide n.º 1 do art.º 180 da CRA e o art.º 2 da Lei 2/08, de 17 de Junho – Lei Orgânica do Tribunal Constitucional).

 

Tratase de um “Tribunal Especial”. Por este facto, também tem um regime especial, inclusive o disciplinar, não estando os seus juízes sujeitos à jurisdição do CSMJ, mas sim, do próprio TC (vide art.º 39 da LOTC).


Nos termos do n.º 3 do art.º 180 da CRA, o TC é composto por 11 juízes, sendo que quatro (4) são nomeados pelo PR, incluindo o seu Presidente, quatro (2) pela Assembleia Nacional, incluindo o seu Vice-Presidente, dois (2) eleitos pelo CSMJ e um (1) selecionado por concurso público curricular, nos termos da lei (vide igualmente o Art.º 11 da LOTC). O Juiz Conselheiro Manuel Aragão foi nomeado Presidente no TC, por decisão do PR, na sua qualidade de Chefe de Estado, nos termos da alínea e) do art.º 119 da CRA. Sendo o provimento de um cargo por Nomeação, caí na esfera de competência política discricionária do PR, devendo apenas o nomeado preencher os requisitos previstos na CRA e no art.º 12 da LOTC.

 

Logo, Juiz Conselheiro Manuel Aragão, à data da sua nomeação, preenchia todos os requisitos legais. Conforme igualmente estabelece o art.º 15 da LOTC, os juízes do TC cumprem mandato de sete (7) anos, não renováveis.

 

Seguidamente, devemos alertar que apesar de na altura o juiz, agora jubilado, exercer funções no TS, a sua nomeação para o TC não foi de iniciativa do CSMJ, que como vimos, elege dois magistrados para o TC. O mesmo foi nomeado pelo PR, na sua qualidade de Chefe de Estado.

 

Logo, se trata de um acto político, discricionário, insusceptível, em primeira análise, de ser sindicado em juízo (salvo se, como dissemos, o nomeado não preencher os requisitos do art.º 12 da LOTC, que não é o caso).

 

No mesmo sentido, é importante esclarecer outros equívocos. A CRA e a LOTC não colocam nenhum limite de idade para que um cidadão exerça a função de juiz do TC.


Destarte, o TC não existe jubilação por limite de idade, até pela sua natureza e função especial. Esta opção legislativa é seguida por outros Tribunais Constitucionais de Portugal e Espanha, por exemplo.

 

Em Portugal, já tivemos juízes do TC nomeados com 32 anos (Paulo Mota Pinto e Gonçalo de Almeida Ribeiro), bem como, por outro lado, a sua maioria exerce funções em idade avançada. O actual Presidente do TC de Portugal, o Professor Costa Andrade (Catedrático de Coimbra) tem 76 anos. Ainda na mesma linha de pensamento, a prática constitucional de Angola, temos o caso do Conselheiro Jubilado Onofre dos Santos, que exerceu funções até aos 75 anos. Portanto, não existe na legislação em Angola um limite de idade para o exercício da função de juiz do TC, não sendo a eles aplicado o princípio do Esgotamento do Poder Jurisdicional do Juiz, como foi de modo equivocado foi alegado por um respeitável jurista.


Esclarecidos alguns equívocos, vejamos, de seguida, em que situações um juiz do TC legalmente cessa funções.

 

Os juízes do TC gozam durante o seu mandato da garantia da inamovibilidade estabelecido na lei aos juízes do TS (princípio da equiparação), nos termos da CRA (n.º 4 do art.º 180) e da LOTC (vide art.º 34). Logo, não podem cessar funções senão nos casos previstos na LOTC (vide in fine o art.º 34 da LOTC).


Os casos em que a LOTC prevê a cessação de funções de um juiz são os previstos no n.º 3 do art.º 40, nomeadamente: a) Morte ou impossibilidade física permanente; b) Renúncia; c) Aceitação de cargo legalmente incompatível com o exercício das suas funções; d) Demissão ou aposentação compulsiva, em consequência de processo disciplinar ou criminal. Destarte, em decorrência da lei e respeito pelo princípio da inamovibilidade, o juiz do TC apenas cessa funções nos casos previstos na lei, o supracitado n.º 3 do art.º 40 da LOTC.

A jubilação de Conselheiro do TS não é causa, nos termos da lei, para cessação de funções de juiz do TC.


Sobre esta matéria, é nosso entendimento, salvo melhor opinião legalmente sustentada, que mesmo os dois juízes indicados pelo CSMJ (que não é o caso do Conselheiro Manuel Aragão) atingissem o limite de idade para jubilar durante a comissão de serviço no TC, ainda assim, se fosse da sua vontade, podem cumprir na íntegra o mandato. A LOTC não prevê a jubilação compulsória por limite de idade, mas apenas a voluntária.


O regime da aposentação voluntária dos juízes do TC vem regulado na LOTC, que nos termos do previsto no n.º 7 do art.º 40, estabelece que o subscritor pode pedir aposentação voluntária se tiver exercido o cargo de juiz do TC até ao termo do seu respectivo mandato e tenha mais de 65 anos.

 

Ainda na mesma senda, o n.º 3 do art.º 53, da Resolução 21/14, de 28 de Julho, que aprova o Regulamento do TC, estabelece que o juiz do TC que tenha exercido até 2/3 do mandato e atinga 70 anos, pode, querendo, requerer a sua jubilação. Ou seja, não há uma jubilação compulsória por limite de idade. A mesma é voluntária, dependendo exclusivamente da vontade do juiz que se encontra na situação prevista.

 

3. CONCLUSÃO

 

Face ao supra exposto, somos a concluir o seguinte:

1. A jubilação pelo CSMJ de um juiz do TS, que exerça mandato no TC, não implica que o mesmo cesse automaticamente funções neste órgão; 2. Pela sua natureza especial, os juízes do TC são regidos por instrumentos próprios, diferente do aplicável aos magistrados judiciais. Logo, um juiz apenas cessa funções no TC nos termos do n.º 3 do art.º 40 da LOTC, o que não se aplica na situação do Juiz Conselheiro Presidente Manuel Aragão; 3. A CRA e a LOTS não estabelecem um limite de idade máximo para o exercício das funções de juiz do TC, nem preveem a aposentação compulsória. Apenas a voluntária. Um juiz do TC pode, querendo, pedir aposentação voluntária desde que cumpra mais de 2/3 do seu mandato (quatro anos e seis meses) e atinga os 70 anos de idade.


Este é o nosso Parecer. Admite-se, contudo, melhor opinião.

Atenciosamente.

Luanda, 20 de Abril de 2020.

Wilson Almeida Adão, Docente da Faculdade de Direito da UCAN

 

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