Luanda - Já lá se foram quase dois anos desde que o Ministério da Administração do Território e Reforma do Estado (MAT) deu o pontapé de saída ao processo de desconcentração e descentralização administrativa em Angola. O facto mereceu "vivas e hosanas" da sociedade civil, e sobretudo dos partidos políticos da oposição, que depositaram esperança no processo de transferência de atribuições e competências do poder local, que culminaria em 2022, fazendo juz ao programa das tarefas específicas de cada competência, os recursos humanos e financeiros necessários, entre outros pressupostos.

Fonte: Club-k.net

Segundo o cronograma, este ano (2020) dar-se-ia início ao processo de descentralização administrativa, com a realização de eleições autárquicas, mas como já se sabe essa parte do "filme", o MPLA aponta à Covid-19 como vilã e principal culpada para o "adiamento" das autarquias, no fundo um pretexto que serve para o partido no poder ganhar tempo e afinar à máquina eleitoral fraudulenta.


Aliás, a desconcentração e descentralização foi apresentada como prioridades do governo do Xadrezista-mor, João Lourenço, tendo repetido em vários fóruns (ao ponto de dor os ouvidos), que "foram aprovadas medidas com vista a uma maior intervenção dos Governos Provinciais e das Administrações Municipais na gestão dos problemas das comunidades”.


No "papel", os Departamentos Ministeriais perderam, a favor dos Governos Provinciais, várias atribuições e competências que foram passadas para as Administrações Municipais, na expectativa de definir e delimitar as competências a transferir às Autarquias locais. Mas na prática, a realidade é bem diferente. Sem "papas na língua", o governador de Benguela, Rui Falcão Pinto de Andrade, criticou a política de desconcentração e descentralização administrativa, tendo considerado como auténtico fracasso, por falta de dinheiro, inclusive até para atender o saneamento básico das cidades do litoral daquela província, sem esquecer a contradição que se traduz o PIIM, demonstrada entre a vontade política e a actuação prática.


Rui Falcão cerrou os dentes, deu um murro na mesa e mostrou-se agastado com as ladainhas do PR, João Lourenço, e seus pares. O governador de Benguela assumiu o papel de Porta-voz dos governantes "mudos" que preferem sofrer calados, à medida que o governo central vai desfilando as suas aldrabices.


Como alguém que não está obcecado pelo Poder, muito menos está preocupado com a reacção do "Chefe", e longe de querer se agarrar às tetas do governo (como é prática comum nas fileiras do governo do MPLA), Falcão soltou às garras e enviou o recado ao Xadrezista, por via do emissário do MAT. Marcy Lopes não esperava o tamanho golpe, ficou completamente zonzo, tendo precisado de alguns minutos e bebido bastante água para engolir o "sapo".


RF deixou bem claro ao Governo Central que os "incompetentes não estão aqui (em Benguela)”.


Num discurso directo e sem rodeios, o governante atribuiu um atestado de incompetência aqueles que falam muito de descentralização, mas pouco ou nada fazem para desburocratizar procedimentos administrativos. "Se houver sentido de Estado, houver honestidade e houver competência, podemos nós próprios fazer melhor", rematou.


Afinal, estamos diante de um ensaio à democracia interna no seio do Executivo, ou as comadres estão de costas viradas, ao ponto da roupa suja estar a ser lavada na "rua"?


O que Falcão desabafou não é nada de novo. A "novidade" recai no facto de vir de alguém que pertence ao partido no poder, porque há muito que vários grupos de "pressão" têm clamado aos "decisores" com competências a partir de Luanda para que tenham maior sensibilidade com o potencial económico de determinadas províncias, como é o caso de Benguela, e que se aplique de facto a descentralização financeira e de recursos humanos, de modo a proporcionar o bem-estar social.


Também somos apologistas que, a descentralização administrativa só será efectiva com autarquias, e as mesmas só dará frutos ao sabor do "paladar" de Rui Falcão quando ocorrer, efectivamente, uma desconcentração económica e financeira, sobre os rendimentos de cada província, um sonho adiado com o "adiamento" das eleições autárquicas.


Os últimos dois anos tem sido marcado por manifestações contra à governação de Rui Falcão, a frente dos destinos da província de Benguela. Para além dos problemas de saneamento básico, os "manifestantes" acusam igualmente a protecção que RF dá alguns membros do governo de Benguela, com destaque para o vice-governador para Sector Técnico e Infraestruturas, Leopoldo Muhongo, acusados de crimes de corrupção, peculato, tráfico de influência, entre outros.


Ao nosso ver, essa foi a maneira encontrada por Falcão para que a sociedade compreenda que o problema do lixo nas cidades de Benguela, Catumbela e Lobito não depende dele, mas sim da falta de verbas que tardam a chegar de Luanda.


Contudo, esses argumentos não são convincentes, porque ainda existem fortes indícios de corrupção e favorecimentos à pequenos grupos que o governador faz olhos e ouvidos de mercador. A festa do PIIM continua pelos 10 municípios da província de Benguela, apesar de várias denúncias de alguns actores sociais e políticos locais.


No fundo, o MPLA está cansado da governação do próprio MPLA, e isso ficou evidente ao ouvir o primeiro Secretário provincial do MPLA de Benguela, Rui Falcão Pinto de Andrade.