Lisboa - Os pacientes angolanos em Portugal, em situação de angústia, pedem que seja revertida a situação de abandono a que foram submetidos após a decisão de Luanda de lhes impor altas compulsivas e administrativas.

Fonte: DW

Com o fim da Junta Médica e a imposição pelo Governo angolano das altas compulsivas e administrativas, piorou a situação dos doentes angolanos despejados das pensões Luanda e Alvalade, em Lisboa.


Dionísio António Gonçalves, com problemas de visão, é um dos que decidiu não regressar a Angola apesar da sua difiícil situação financeira, porque ainda não concluíu o seu tratamento.


"Se não fosse a minha economia, estaria a dormir na rua, porque não podia regressar ao país com operação fresca. Não regressei porque a minha visão é muito baixa. Fui avaliado pelos médicos, que me deram 95 por cento de incapacidade", conta Gonçalves.


Depois de expulso da pensão Luanda, António Francisco Manuel, outro doente, também teve de arranjar um quarto exíguo onde ficar, por 250 euros ao mês, perto da Praça do Chile.

 

"Fomos expulsos da pensão e isso é que achamos estranho se viemos cá por conta do Governo.


E fomos surpreendidos com este tipo de decisão de que tínhamos que abandonar a pensão para regressar a Angola", queixa-se.

Consequências do regresso


Do cerca de 400 doentes que beneficiavam de Junta Médica apenas dez por cento regressaram a Angola por temerem falta de recursos. Infelizmente, diz António Manuel, há doentes regressados ao país com problemas de insuficiência renal que morreram, "ficam sem acesso e morrem", precisa.


"Fizeram a primeira [hemodiálise] e não deu certo. Então, tiveram que aplicar outra vez o cateter. Mandaram-me aguardar, mas infelizmente apareceu a pandemia", diz ainda.


Por isso, insiste que, apesar das dificuldades financeiras acrescidas, tem de continuar em Lisboa uma vez que não estão reunidas no país as condições para atender o seu caso, relacionado com acessos para a hemodiálise.


"Então, estamos à espera que façam outra intervenção para poder canalizar a prótese para fazer o tratamento devidamente, mas mandam-nos de volta a Angola". E nós sabemos que em Angola não há condições. Agora, mandar-nos de volta é o mesmo que nos mandar ir morrer. E, pronto, estamos aqui a nos aguentar".

Apoio

A Santa Casa da Misericórdia de Lisboa presta algum apoio alimentar. Mas, entre as dificuldades por que passam, todos receiam ficar sem dinheiro para cobrir as despesas de alojamento. No entanto, existem pacientes que recorreram aos centros de abrigo e há até casos mais graves, segundo Mande Joaquim Abreu, com insuficiência renal.


"Nós temos doentes angolanos aqui em Portugal que estão a dormir na rua. Temos dois jovens que vêm aqui a quem damos comida quando fazemos almoço. Eles comem aqui quando saem daqui ficam ao Deus dará, não sabem onde dormir", revela Abreu.
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Carta Aberta ao PR


Por estarem a viver em condições lastimáveis, um grupo de pacientes que ficou em Portugal, decidiu endereçar uma Carta Aberta ao Presidente da República (PR) de Angola, através da imprensa. O grupo considera que a mensagem sobre a verdadeira situação dos doentes não tem chegado ao chefe de Estado, como refere Mande Abreu, um dos signatários da carta.


"Não foi a verdade que ele ouviu. Tenho certeza, quando o Presidente ler esta carta, vai conhecer qual é a realidade dos problemas que temos aqui. Por exemplo, o Presidente foi informado que cada doente, mensalmente, gastava 6 mil euros. É mentira. Há doentes que recebiam subsídio de 15 euros por mês", revela.


E prossegue com as denúncias: "Outra mentira dita ao Presidente é que Angola já tinha condições [de assistência médica especializada] e que nós poderíamos voltar".


Entre outros pontos, também dizem na missiva que não é verdade que doentes angolanos estão em Portugal apenas a fazer diálises. "Grande parte já é transplantada e faz medicação especializada, com acompanhamento médico e laboratorial inexistente em Angola", refere o documento.


Os doentes, que se sentem abandonados, pedem a João Lourenço que reveja a situação da Junta Médica, ao abrigo dos seus direitos constitucionais e em respeito ao convénio entre Angola e Portugal.