Luanda - Com uma frequência que não deveria ser ignorada, o MPLA vem se repetindo no recurso à linguagem que não se ouvia, mesmo no auge da guerra que consumiu o país durante longos anos.

Fonte: Correio Angolense

Naqueles tempos de brasa, havia aquilo que a UNITA chamava de diabolização de Jonas Savimbi. Termos como savimbismo, ditadura da Jamba, fogueiras e outros, usados de forma pejorativa, tinham ressonância dentro do MPLA, e perturbavam uma parte da UNITA. A inaptidão desta para levar a todos os angolanos as razões por que fazia a guerra e a crueldade de algumas das suas acções deixavam muitos angolanos de pé atras.

No sentido inverso, também tinham muita carga pejorativa alusões ao “futungo das belas”, crioulos, russos e cubanos, monolitismo/partido único e corrupção. Eram palavras que animavam a UNITA e uma parte da oposição.

Tudo isso era parte do jogo político adequado àquele contexto específico de guerra.

Nos últimos tempos, a opinião pública tem vindo a ser confrontada com a “chegada” de um discurso brejeiro, totalmente inadequado.

Nas redes sociais agora são recorrentes textos cuja primeira marca é a manipulação pura, a segunda é a falta de imaginação, a terceira é o mau gosto, a quarta é a sua ineficácia e a quinta é a natureza exclusivista, incendiária e redutora.

Tudo isso seria menos grave se não estivéssemos perto de ir a votos. Mas estamos. Por isso, algo nos leva a crer que não é só a falta de esperança que vai piorar.


A desesperança vem do facto de, além de se revelar incapaz de resolver problemas que as pessoas têm dentro de casa, isto é, mata-bicho, almoço e jantar, o MPLA, que está por detrás de grande parte do discurso brejeiro, não tem conseguido perceber que a excessiva manipulação da comunicação social do Estado começa a ter efeito de boomerang. O que as pessoas se lembram, de cada vez que a media pública lança um spot de campanha ou veicula complacentemente insultos aos opositores, não é do que diz a mensagem, mas sim do que lhes falta à mesa, ou o emprego que não têm.

Nada nos preocupa mais do que pronunciamentos cujos rostos se conhecem. Por um lado, é bom que haja rostos. Os ataques anónimos e cobardes, muito recorrentes nas redes sociais, só mostram cobardia. Em todo o caso, com os nomes vem a responsabilidade que não temos visto. É claramente uma irresponsabilidade destratar politicamente o adversário. O recurso permanente ao insulto esconde falta de polidez.

No último final de semana, Rui Pinto Falcão de Andrade, secretário do Bureau Político para a Informação, “enriqueceu” o dicionário do seu partido com mais um epíteto. Definiu Adalberto Costa Júnior, líder do segundo maior partido, como arruaceiro.

Mesmo concedendo que oratória não é dos seus melhores predicados, dos membros da direcção do MPLA esperava-se outra retórica. Ou, pelo menos, algum esforço nesse sentido. Rui Falcão, o “inventor” do novo rótulo colado a Adalberto Costa Júnior, é um caso preocupante. A responsabilidade política que lhe vem sendo renovada há mais de 20 anos já devia ter produzido nele algum polimento. A frontalidade, que é a sua marca, não é sinónimo de grosseria. A frontalidade não é passaporte para expressões de baixo jaez. O recurso sistemático a essa linguagem só tem uma explicação: insuficiência.


Infelizmente, a truculência verbal do MPLA não se esgota nele. No partido que governa Angola ninguém fez caso quando no novo léxico político os adversários políticos foram “elevados” à categoria de malandros; também ninguém se incomodou quando os antecessores passaram a ser designados como marimbondos.

Por isso, é com naturalidade – e até mesmo coerência – que o MPLA encoraja a que os microfones de rádios e estações televisivas públicas sejam colocados à disposição de arrependidos, corruptos e oportunistas, que se servem da comunicação pública apenas para manchar e encardir reputações alheias.

Sendo ele próprio a mais produtiva fonte da deselegância verbal, aos ouvidos do MPLA soam como deliciosas músicas os insultos que a turma de corruptos e oportunistas debita aos microfones das televisões e rádios públicas.

Há três ou quatro dias, o engenheiro António Venâncio, assumido militante do MPLA, escreveu o seguinte nas redes sociais:

“A política não devia baixar tanto. Nenhum país progride coma politica em estado selvagem, onde a TV dissemina cenas teatrais em hora nobre.

A nível dos partidos políticos, deviam também (ser) afastados ou exonerados os responsáveis menos criativos, inábeis, fracos em processos de concorrência política.

À nossa TV devia recusar entrar no jogo politico quando os actores demonstrassem ter atingido o ridículo. Depois quem paga é o MPLA, é todo o país e o progresso.

Há outras formas de nós militantes do MPLA vencermos as eleições, este é o recado que gostaria que fosse transmitido aos mais inaptos actores. Não nos envergonhe mais. Temos Filhos. Temos dignidade a defender. Peçam demissão se a criatividade politica atingiu o zero”.

Sim, como diz o velho ditado, em política não pode valer tudo.

A “massificação” do insulto e da deselegância verbal, promovida pelo MPLA, já produziu frutos, particularmente expostos no discurso dos vira-casacas da UNITA, que agora se dirigem aos seus antigos colegas e chefes nos termos mais desprezíveis possíveis.

Este não pode ser o caminho da política angolana.

Em vésperas de eleições, os políticos tendem a adoptar discursos mais “apimentados”. Nada de anormal. O que é anormal e inaceitável é que, por instigação do MPLA, a gente sem carácter se dê acesso irrestrito aos meios de comunicação social públicos para o insulto gratuito.

Nas redes sociais, não há texto de simpatizantes ou apoiantes do MPLA que dispense o insulto, a agressão.

Dir-se-ia mesmo que o insulto passou a ser a marca registada do MPLA.

O recurso ao grito e ao insulto é predominantemente feito por aqueles que estão de cabeça perdida. É já nesse estado em que se encontra o MPLA?