Washington  - Íntegra do discurso do Presidente da República, João Lourenço, proferido, esta quinta-feira (23), durante na 76ª Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova Iorque.

 

Excelência,

Senhor Abdulah Shahid

Presidente da 76ª Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas,

Excelências, Chefes de Estado e de Governo
Senhor Secretário Geral das Nações Unidas
Minhas Senhoras, Meus Senhores

O facto de, a partir desta tribuna presencialmente, poder felicitá-lo pela sua eleição, é um sinal de evolução positiva na forma como hoje lidamos com o vírus da Covid-19.Ainda não vencemos a batalha contra o vírus SARS-COV-2 mas não podemos deixar de referir que os medos, as incertezas e a sensação de impotência de há um ano vêm sendo superados, permitindo o retorno paulatino à vida normal com as necessárias precauções e o sentido de responsabilidade que são exigidos a todos nós.

 

A luta contra a Covid-19 e as suas novas e assustadoras variantes prossegue, e que apenas o esforço conjugado exercido por todos, sem distinção entre ricos e pobres ou de outro tipo de categorias sociais, é o único caminho a ser trilhado para enfrentarmos a pandemia com resultados que satisfaçam as expectativas de retorno cabal das populações à vida normal.

 

Temos vindo a observar que é cada vez mais acentuada a convicção a nível global de que se está perante a possibilidade real de se alcançar tal objectivo, pelo surgimento das vacinas que a comunidade científica mundial desenvolveu com louvável e admirável rapidez, cujo grande propósito é o da preservação da espécie humana, ameaçada pela pandemia da Covid-19.

 

É, por isso, urgente que se estabeleça, em termos práticos, a compreensão geral de que a solidariedade e a simplificação dos processos no acesso às vacinas, é a única via capaz de conduzir o mundo à vitória no combate à pandemia da Covid-19, por permitir a imunização, a mais alargada possível, dos habitantes do nosso planeta.

 

É chocante constatar-se a disparidade existente entre umas nações e outras, no que respeita à disponibilidade de vacinas, pois estas diferenças permitem, em alguns casos, administrarem-se já terceiras doses, enquanto noutros, como ocorre em África, a larga maioria das populações não está vacinada sequer com a primeira dose.

 

Que sejam discutidas e aprovadas pelas Nações Unidas decisões favoráveis à liberalização do regime das patentes de produção de vacinas para que seja possível a sua fabricação por um número cada vez maior de países, tornando-as mais acessíveis para todos.

 

A pandemia que enfrentamos tem uma dimensão global e acentuou, por isso mesmo, a ligação e a interdependência existentes entre as nossas nações. Por esta razão, a vacina da Covid-19 deve ser reconhecida como um bem da Humanidade, de acesso universal e aberto, para permitir uma maior produção e distribuição equitativa à escala mundial.

Excelências,

Todos os efeitos e consequências negativas da pandemia da Covid-19, que se registam noutras paragens, tiveram também um duro impacto na vida económica e social da República de Angola.

 

Fomos capazes, apesar disso, de agir atempadamente, com rigor e bastante determinação, para conter a expansão da contaminação a uma escala que nos permitiu manter os níveis de contágio dentro dos limites da capacidade de resposta das nossas estruturas de saúde.

 

Mesmo assim, a avaliação dos prejuízos que derivam da pandemia da Covid-19 para a economia nacional dão-nos resultados preocupantes para os quais temos vindo agora a procurar soluções que ajudem a mitigá-los para aliviar o sofrimento das populações.

 

Temos contado com apoios e iniciativas que merecem todo nosso apreço por nos permitirem algum alívio no plano das responsabilidades financeiras perante os nossos credores, o que nos possibilita dispor de alguma capacidade para fazer face às nossas enormes e múltiplas necessidades.

 

Perante este quadro, em que sobressai a degradação acentuada das condições de vida das populações e do tecido económico e social, temos que fazer uma profunda reflexão para que sejam encontradas soluções de carácter duradouro, que sirvam de base à reconstrução das economias mais severamente afectadas pela crise sanitária mundial.

Excelências,

A República de Angola tem vindo a desenvolver esforços importantes no sentido de contribuir para a paz e a estabilidade na África Central, na região dos Grandes Lagos e noutros pontos do nosso continente.

 

A nossa sensibilidade para os problemas da paz e da guerra resultam do longo conflito interno que vivemos durante várias décadas, e que nos permite ter a noção clara da importância da busca de soluções para os diferendos pela via do diálogo e do entendimento entre as partes beligerantes.

 

Temos procurado partilhar com outros povos esta experiência angolana bem-sucedida, na convicção de que a nossa acção, se for bem entendida, levará muito seguramente a resultados favoráveis, ao fim dos conflitos e ao restabelecimento da paz em alguns dos países afectados.

 

Prevalecem ainda vários conflitos em diferentes regiões do nosso planeta, alguns dos quais parecem não ter um fim à vista devido não só à natureza complexa das suas causas mas, sobretudo, devido à inobservância das normas que regem as relações internacionais e dos princípios de convivência pacífica entre os povos e as nações.

 

Temos que continuar a acreditar nos mecanismos de que as Nações Unidas dispõem para construir, no quadro do multilateralismo, soluções que garantam de forma sólida e perene a paz e a segurança mundial.

 

Preocupa-nos, sobremaneira, a alteração da ordem constitucional que se regista amiúde em países africanos com recurso à força militar, na medida em que estes actos inconstitucionais não têm merecido uma reacção adequada e suficientemente vigorosa da comunidade internacional, no sentido de desencorajar esta prática a todos os títulos reprovável, a exemplo do que assistimos no Mali e, mais recentemente, na Guiné.

 

Consideramos, por isso, ser necessário que a comunidade internacional actue com tenacidade e não profira apenas declarações de condenação, por forma a forçar os actores de tais actos a restituírem o poder aos órgãos legitimamente instituídos.

 

Não podemos continuar a permitir que exemplos recentes como os da Guiné e outros prosperem em África e em outros continentes. Esta constitui uma grande oportunidade para os Chefes de Estado e de Governo aqui reunidos exigirem, em uníssono, a libertação imediata e incondicional do Presidente da República da Guiné, o Professor Alpha Condé.

 

Preocupam-nos as ameaças à paz e à segurança mundial que se mantêm por acção de grupos extremistas no Sahel africano, na República Democrática do Congo, em Moçambique e noutras regiões do planeta, que obrigam a comunidade internacional a mobilizar-se continuamente para reforçar a capacidade de resposta a esta actividade perigosa que atenta contra a estabilidade social e económica dos países visados.

 

Lamentavelmente, assistimos ao regresso do mercenarismo, com o recrutamento a partir de qualquer parte do mundo de profissionais sem exército, pagos para matar, para desestabilizar países, para depor políticos e regimes democraticamente eleitos mas incómodos, fenómeno antes fortemente condenado e combatido mas hoje infelizmente encorajado e alimentado por forças poderosas que se escondem no anonimato.

 

As Nações Unidas, a União Africana e de uma forma geral a Comunidade Internacional, devem encorajar as autoridades etíopes a encontrar os melhores caminhos para pôr fim ao conflito na região do Tigray, afastando a ameaça de uma catástrofe humanitária, antes que possa ganhar contornos mais graves e seja tarde demais.

 

As alterações climáticas estão hoje na agenda do dia, a julgar pelas graves consequências com que a Humanidade se confronta em todos os continentes.

 

A periodicidade e a ferocidade dos furacões, enchentes, incêndios florestais, deslizamentos de terra, vulcões e tremores de terra, que devastam cidades inteiras e aglomerados populacionais no meio rural, por vezes com um cortejo considerável de mortes, deve chamar a atenção de todos, governos, organizações não-governamentais, académicos, cientistas e sociedade civil, para a necessidade de união de esforços na protecção do planeta terra, nossa casa comum, que vem dando sinais cada vez mais evidentes de que não está satisfeito com a forma como o tratamos, defendendo-se da maneira mais violenta possível.