Luanda - O Tribunal Supremo está, desde Abril do ano passado, a protelar a decisão de mandar para casa, sob condição de liberdade condicional, o réu Rui Manuel Moita, um dos co-arguidos do célebre ‘caso CNC’, condenado a cinco anos e dois meses de pena efectiva, pelos crimes de peculato, abuso de poder, violação de normas orçamentais e recebimento de vantagens, apurou o !STO É NOTÍCIA através de um carta denúncia chegada à sua redacção.

Fonte: Isto É Notícia

O ‘Caso CNC’, um intrincado processo que se veio a revelar-se num dos processos judiciais mais mediáticos no país, do qual é parte integrante, como principal visado, o ex-ministro dos Transportes Augusto da Silva Tomás, é um processo transitado em julgado apenas em Julho de 2021, após sucessivos recursos a nível dos tribunais Supremo e Constitucional.

Sob o título “A injustiça da justiça angolana”, o documento assinado pela família do ex-director-geral adjunto para as Operações e ex-director-geral adjunto para a Área Técnica do antigo Conselho Nacional de Carregadores (CNC) revela um conjunto de acções burocráticas, e omissão delas, praticadas pelo Tribunal Supremo, que têm feito com que, desde o início do segundo trimestre de 2021, não tivesse sido autorizado que o referido arguido fosse posto em liberdade condicional.

“A 21 de Abril deste ano, cumpriu 50 por cento da pena condenatória, pelo que deveria, em condições normais, ser restituído à liberdade, caso os Serviços Prisionais, mediante relatório específico, não emitissem opinião negativa do seu comportamento, enquanto esteve em prisão domiciliária e em prisão efectiva (sete meses e de forma ilegal)”, descreve a família na carta, lamentando o facto de terem ocorrido uma série de incidentes que levariam Rui Manuel Moita de volta à cadeia.

“Surpreendentemente, não só não foi colocado em liberdade, como também foi conduzido à prisão mediante um inexplicável mandado de captura, quando se encontrava em casa sob vigilância de efectivos dos Serviços Prisionais. Tudo isto aconteceu na segunda semana de Julho deste ano, quando, repete-se, desde Abril que havia cumprido os 50% da sentença que o habilitava à liberdade concional”, denuncia a família do arguido.

Um contacto estabelecido com o Tribunal Supremo ainda em Dezembro de 2021 permitiu apurar que o expediente da defesa de Rui Moita, que deu entrada em Setembro de 2021, estaria sob cuidado do juiz Daniel Modesto, que tinha acabado de sair de férias, fechando o expediente no seu gabinete, o que teria impedido que o mesmo tivesse sido prontamente despachado para os Serviços Prisionais que, por sua vez, teriam acatado a ordem que deve ser expressa por um juiz responsável por ordenar a soltura.

“Até ao presente momento, ou seja, dez meses depois de ter atingido o limite estipulado por lei para se habilitar à referida liberdade condicional, e cinco meses depois de ter espoletado o referido processo e quatro meses depois de o mesmo ter dado entrada no Tribunal Supremo, Rui Manuel Moita encontra-se no Hospital Prisão de São Paulo, sem informações concretas sobre a data da sua saída deste estabelecimento prisional, e sob condições de saúde física e mental difíceis de suportar”, narra a carta da família.

A carta refere que Rui Moita sofre um sem número de enfermidades, tais como: hipertensão arterial, diabetes, síndrome de Crohn (um tipo de enfermidade inflamatória intestinal, que pode afectar qualquer parte do aparelho digestivo, desde a boca até ao ânus); hiperaldosterenismo primário, apneia do sono, hiperplasia prostática, pangastrite erosiva grave, doença do refluxo esofrágico, hérnia discal, na servical, hérnia de hiato, esófago e outras doenças cardiovasculares que, segundo a carta, têm constantemente originado dores musculares, inflamações nos membros inferiores, problemas respiratórios e dores no peito.

 

Morte do ex-director-geral do CNC

Em Fevereiro de 2021, o antigo director-geral do Conselho Nacional de Carregadores (CNC) e professor catedrático da Universidade Agostinho Neto Manuel António Paulo, que também estava arrolado no processo como um dos arguidos, faleceu aos 72 anos, vítima de doença, na Clínica Sagrada Esperança, quando cumpria prisão domiciliar.

O ex-director-geral do CNC morreu em consequência de uma paragem cardíaca, a 29 de Janeiro, na sua residência, tendo sido levado para a Clínica Sagrada Esperança, onde veio a falecer. Manuel António Paulo foi detido em 2018, no “Caso CNC” acusado ter praticado os crimes de peculato, branqueamento de capitais, associação criminosa e prática de artifícios fraudulentos para desviar fundos do Estado através do Conselho Nacional de Carregadores.

Em Agosto de 2019, foi condenado a 10 anos de prisão pelo Tribunal Supremo, mas viu a sua pena reduzida em Novembro do mesmo ano, para cinco anos, após interpor recurso.

  

A injustiça da justiça angolana

Rui Manuel Moita, inserido no famigerado “Caso Augusto Tomás”, foi condenado a 5 anos e 2 meses de prisão por peculato, abuso de poder, violação de normas orçamentais e recebimento indevido de vantagem, num processo onde uma série de procedimentos legais foram ignorados ou violados.

Acrescente-se o facto de que, em função da entrada em vigor do novo Código Penal em Fevereiro deste ano, pelo menos, o crime de violação de normas orçamentais deixou de existir, o que pressupõe que a pena seja reduzida.

Na qualidade de Director-Geral Adjunto para as Operações e posteriormente, em função de alterações ao Estatuto Orgânico do CNC, Director adjunto para Área Técnica, nunca esteve em posse de bens materiais e financeiros, nem nunca teve competência de decisão, pois os Directores Adjuntos do CNC, eram meros coadjuvantes do Director Geral, o órgão de gestão individual. Os órgãos de gestão eram: o Conselho Directivo, que contava com os Directores Gerais Adjuntos, Chefes de Departamento, representantes dos Serviços Provinciais, Assessores e convidados; igualmente, o Conselho Fiscal era outro órgão de gestão colectiva, nunca tendo existido até à altura do início deste caso.

Portanto, a figura de “Direcção Geral” não existiu legalmente no CNC. Em resumo, existia o Director Geral, o Conselho Diretivo e o Conselho Fiscal, sendo os Directores Gerais Adjuntos, uma espécie de Assessores, Conselheiros do Director Geral, sem poder de decisões.

Assim, na qualidade de Director Geral Adjunto para as operações ou Área Técnica, Rui Moita emitia apenas pareceres e, quando em substituição interina do Director Geral, apenas tratava de assuntos correntes, como facilmente se pode aferir em função de vários documentos existentes.

Não obstante a tudo dito anteriormente, foi injustamente condenado, pois não teve envolvimento nenhum na maior parte dos casos abordados neste processo. Desconhecia até grande parte deles.

Por ser doente de nível “grave”, foi colocado em prisão domiciliária, até à transição em julgado da sentença condenatória. Sublinhe-se aqui, que Rui Manuel Moita sofre, entre outras doenças de: Hipertensão arterial, diabetes, síndroma de corn, Hiperaldosterenismo primário, apneia do sono, hiperplasia prostática, pangastrite erosiva grave, doença do fluxo esofágico, hérnia discal na cervical, hérnia do hiato, esófago e outras doenças cardiovasculares que constantemente originam dores musculares, inflamação nos membros inferiores, problemas respiratórios e dores no peito.

Para que a sua saúde seja salvaguardada, toma diariamente e de forma permanente entre 9 a 11 medicamentos, havendo momentos que este número sobe para 15 a 18, em função de reacções do seu metabolismo. Todas estas informações podem ser confirmadas mediante relatórios médicos do Hospital Prisão do São Paulo, Clínica Caridade, Clínica Multiperfil, em Luanda, ou ainda outras no exterior do país.

A 21 de Abril deste ano, cumpriu 50% da pena condenatória pelo que deveria, em condições normais, ser restituído à liberdade, caso os Serviços Prisionais, mediante relatório específico, não emitissem opinião negativa do seu comportamento, enquanto esteve em prisão domiciliária e em prisão efectiva (7 meses e de forma ilegal).

No entanto, surpreendentemente, não só não foi colocado em liberdade, como também foi conduzido à prisão mediante um inexplicável Mandado de Captura, quando se encontrava em casa sob vigilância de efectivos dos Serviços Prisionais. Tudo isto aconteceu na segunda semana de Julho deste ano, quando, repete-se, desde Abril que havia cumprido os 50% da sentença que o habilitava à liberdade concional.

Até ao presente momento, ou seja, dez meses depois de ter atingido o limite estipulado por lei para se habilitar à referida liberdade condicional, 5 meses depois de ter espoletado o referido processo e quatro meses depois do mesmo ter dado entrada no Tribunal Supremo, Rui Manuel Moita encontra-se no Hospital Prisão do São Paulo, sem informações concretas sobre a data da sua saída deste estabelecimento prisional, e sob condições de saúde física e mental difíceis de suportar.

As declarações de voto vencido emitidos por vários juízes, aquando das reuniões dos plenários do Tribunal Supremo e Tribunal Constitucional, são convincentes e falam por si.

Em países onde se respeitam instrumentos legais, como, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, as Regras Mínimas para o Tratamento dos Reclusos (Resolução da ONU de 30 de Agosto de 1955) ou o Princípio do Reconhecimento da Dignidade e Princípios, são proibidos actos, comportamentos, condutas ou omissões que violem os direitos e garantias fundamentais e liberdades da pessoa humana.

Manter alguém na prisão por 8 meses, após estar em condições de se beneficiar da liberdade, correndo riscos de, por exemplo, contaminar-se com a Covid-19, (Rui Manuel Moita ainda não foi vacinado) ter uma crise de hipertensão, é, no mínimo, desumano.

Rui Manuel Moita deve, há pelo menos 3 anos, ser operado à próstata, mas não o faz por questões inerentes à sua situação de privação de liberdade.

Rui Manuel Moita deve ser submetido a exames profundos urgentes, mas o facto de ainda estar encarcerado, o impede de fazer.

Os níveis de ansiedade e, de stress, têm causado a Rui Manuel Moita desequilíbrios físicos e mentais tais, que fazem com que o mesmo se encontre em situação de depressão iminente e em níveis de auto-estima muito baixos.

Assim, entendemos nós família que Rui Manuel Moita só se encontra ainda na prisão por motivos meramente relacionados com a má-fé das instituições e não estando em condições de continuar a suportar as injustiças a que está submetido, que a sociedade não estranhe que sejamos nós a incentivá-lo a iniciar uma greve de fome até ao dia da sua libertação.

 

*Carta enviada pela família do arguido Rui Manuel Moita via rede social WhatsApp