Na sua campanha portuguesa, Isaías Samakuva disse aos empresários lusos que o seu partido já não destrói pontes, barragens, hospitais, escolas, edifícios públicos e outros perigosos alvos militares.
Nestas revelações, este político poderia também referenciar que está posto de parte o método “democrático” de lançar à fogueira mulheres indefesas ou adversários incautos. Mas esta parte, tanto ou mais importante que a primeira, fica para quando o seu partido entrar na refrega da campanha eleitoral.
Nesta sua ida a Portugal, deu sinais de ser um político perspicaz e com um sentido profundo da antecipação dos acontecimentos. Ele fez uma declaração à imprensa portuguesa a todos os títulos notável, que mostra bem a sua dimensão de político sagaz e inteligente.
Samakuva disse aos jornalistas que o seu partido quer diversificar a economia angolana porque, apesar de estar a crescer de forma gigantesca, “está centralizada no sector petrolífero, mas sectores como a agricultura são estratégicos, podem empregar muita gente”.
Tem toda a razão. E foi por saber desta realidade que a Unita não se distanciou até agora inequivocamente das minas que semeou nos campos agrícolas de Norte a Sul do país e provocaram milhares de mutilados entre os camponeses.
Para ilucidar a imprensa portuguesa, este político devera referir que Angola está a gastar biliões de dólares na desminagem dos campos agrícolas e só depois será possível plantar e semear, e só plantando e semeando se criam empregos e é possível produzir os alimentos que hoje o país importa.
Mas apesar desta realidade cruel, Angola já está a investir fortemente no sector da agricultura, um dos que maior crescimento regista.
Samakuva e o estado-maior da Unita quando inundaram Angola de minas terrestres, já sabiam que um dia chegaria a paz e com ela as eleições. E que na campanha eleitoral, pelos vistos já lançada por Samakuva, o seu partido havia de atirar à cara do Governo a acusação de que não manda os camponeses trabalhar nos campos de minas.
Samakuva não ficou por aqui no seu encontro com os jornalistas portugueses, que nem foram capazes de perguntar ao líder da Unita como se faria agricultura convivendo com o perigo das minas e sem infra-estruturas e equipamentos.
Ele também invectivou o Governo por manter o país fechado no litoral e não abrir as portas para o interior. Mais uma sábia declaração de quem preparou ao milímetro uma estratégia infalível, começada logo a seguir à estrondosa derrota eleitoral em 1992.
Proclamados os resultados, num ápice, apareceram com um exército clandestino e ilegal, ocuparam quase todas as capitais provinciais e impediram pela força das armas a livre circulação de pessoas e bens.
Com esta atitude, este líder político sabe que mente. Hoje o país está aberto ao interior, mas para isso foi preciso acabar com a guerra e repor tudo o que a Unita destruiu.
Para reforçar a sua sábia estratégia, começou a partir pontes, barragens, pontões, postes de alta tensão, caminho-de-ferro, aeroportos e a minar estradas e trilhos.
Em Portugal, perante um grupo de jornalistas Samakuva diz que caso a UNITA ganhe as eleições, o seu governo vai “reconstruir as pontes, as vias, os aeroportos, os hospitais e as escolas”. Eis uma declaração que há muito era de esperar do líder do “Galo Negro”. Apenas peca por tardia.
Por força dos acordos firmados e da magnanimidade do Governo de Angola, a Unita escapou de pagar pesadas indemnizações pelos prejuízos causados durante mais de 30 anos.
Pelos vistos, Samakuva está agora disposto a pagar. Finalmente o seu partido, que desde a sua fundação apenas destruiu e traiu, agora está disposto a construir. Já não era sem tempo. Mas essa não tem sido a prática corrente como parceiro do Governo de Unidade e Reconciliação Nacional quando desacredita as autoridades e incita à desobediência.
A mais comovente de todas as declarações de Samakuva tem a ver com a sua preocupação com os direitos humanos. Disse ele na capital do defunto império colonial português que em Angola há detenções de jornalistas e foi encerrado em Luanda um escritório dos Direitos Humanos das Nações Unidas.
A realidade está relacionada com um jornalista condenado por crime de liberdade de imprensa, e foi cumprir pena por decisão de um tribunal. Acabou por ser libertado por força de um recurso. O tal escritório da ONU, afinal nunca teve existência legal. E Samakuva considera estes dois casos, normais em qualquer país do mundo, como atentados aos direitos humanos.
Com estas declarações, Samakuva coloca-se à margem da lei, da legitimidade democrática e dos Tribunais. No quadro encarado por si, os direitos humanos seriam impossíveis. São as reminiscências do passado a virem à tona?
Fonte: Angop