Luanda - Em exclusivo à DW, o presidente da CASA-CE, Manuel Fernandes, diz querer "salvar o país dos vícios" do MPLA. Apesar da derrota eleitoral da coligação, o político garante que fez os "trabalhos de casa".

Fonte: DW

A Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE) registou os seus piores resultados nas eleições de 24 de agosto, ao conquistar apenas 0,76% dos votos, segundo os resultados definitivos divulgados pela Comissão Nacional Eleitoral (CNE).

Esta coligação, que já foi a segunda maior força da oposição angolana, passou de 16 para zero deputados no Parlamento.


Em entrevista exclusiva à DW África, Manuel Fernandes, presidente da CASA-CE, diz que a coligação sofreu uma "grande injustiça". Admite, por outro lado, a possibilidade de trabalhar com a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) para acabar com a hegemonia do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA).

 

DW África: A CASA-CE não conseguiu qualquer assento parlamentar. O que será da coligação agora?
Manuel Fernandes (MF): A CASA-CE sofreu um revés nestas eleições. Uma grande injustiça. Era possível reduzir o número de assentos, mas nunca, de forma alguma, sair destas eleições com zero deputados. Aliás, a campanha que fizemos foi notável. Teve uma boa recetividade. Nos nossos atos políticos, houve sempre fluidez de gente. Comparando o estudo que fizemos de algumas atas que tivemos na nossa posse - não conseguimos ter todas, com toda a sinceridade - o número de votos é superior ao que foi anunciado pela CNE. Foi uma injustiça clara.

Não podemos continuar a chorar sobre leite derramado. É uma questão que já aconteceu e temos que olhar para a realidade e ver como vamos fazer para os próximos desafios.

DW África: Foi uma queda estrondosa. Como se vão reposicionar na política angolana?
MF: Nós somos uma força política que existe para defender os interesses dos cidadãos. Vamos posicionar-nos ao lado do cidadão, continuar a lutar pelos seus interesses, fazendo uma advocacia clara para o bem-estar das famílias angolanas.


DW África: Há hipótese de concorrerem às eleições autárquicas, caso a legislação seja aprovada este ano?
MF: Obviamente que sim. Aliás, nós fomos apenas retirados da Assembleia Nacional, mas mantemos a nossa personalidade jurídica enquanto ente político. Somos uma instituição política e, havendo eleições autárquicas, vamos concorrer. Neste momento, estamos em jornadas de reflexão sobre o presente e o futuro da CASA-CE, e um dos elementos fundamentais que praticamente está a convergir do ponto de vista de contribuição de ideias é a necessidade de criar essas bases, começar a identificar potenciais candidatos e trabalhar para uma participação positiva nas autárquicas.


Também vamos ver, no âmbito de haver a possibilidade de uma concertação política com alguns atores da oposição, o que podemos fazer. Por exemplo, numa determinada circunscrição, havendo maior empatia de uma força política, [a ideia poderia ser] todos apoiarem aquela força política. Mas não havendo ainda consensos à volta desta questão, o que nós temos que fazer mesmo é procurar formas de revitalizar as nossas bases, de cabeça erguida; olhar também para aquilo que não fizemos bem e permitiu que tivéssemos este insucesso; ver se criamos todo um músculo necessário para fortificar as nossas bases; e trabalhar para, mais uma vez, ganharmos a confiança dos cidadãos.

DW África: Trabalhar com a UNITA é uma opção?
MF: Nós estamos hoje numa situação de bipolarização política. Nesta legislatura, só teremos dois grupos parlamentares. O resto serão apenas representações partidárias. No âmbito da nossa luta para um novo país, para um novo contexto, para uma nova realidade e para uma alternância política de facto, nós vamos trabalhar para que a alternância se concretize no nosso país. Poderemos estender a nossa mão a todos aqueles que estiverem de braços abertos para esse exercício, porque no nosso entendimento precisamos efetivamente de salvar o país dos vícios de mais de quase 50 anos de uma governação que não coloca o cidadão no centro das suas preocupações.


DW África: Enquanto presidente da CASA-CE, onde acha que falhou?
MF: Devemos reconhecer algumas situações menos boas que a própria organização viveu, que do ponto de vista da liderança fez com que efetivamente se pudesse frustrar um pouco a expetativa de muitos cidadãos. Isso talvez terá feito migrar algumas vontades políticas da organização para outras forças políticas. Também foi notório o facto de os partidos membros não terem prestado uma atenção especial às bases para que elas fossem robustas e, efetivamente, o verdadeiro suporte da máquina política da organização.


Os dois fatores fundamentais que concorreram para isto são não termos bases sólidas, nem muito bem consolidadas, e também o facto de, em determinado momento do nosso percurso, não haver uma visão homogénea de todos os atores que fazem parte, quer seja dos partidos, quer seja da CASA. Esta dicotomia de pensamento não concorreu positivamente para aquilo que seria a homogeneidade de ação, de pensamento e de trabalho para conseguir resultados positivos para a organização. Quanto ao resto, fizemos o nosso trabalho de casa, e poderíamos efetivamente ter alguns lugares lá na Assembleia Nacional, mas isso não ocorreu porque a injustiça do homem falou mais alto do que a realidade factual do cidadão expressa nas urnas.