Luanda - A província de Cabinda, enclave a norte de Angola, concentra a maior parte das reservas de petróleo do país. Mas a situação socioeconómica da população é precária.

Fonte: DW

Nas eleições de 24 de agosto, a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), o maior partido da oposição, elegeu quatro deputados naquele círculo provincial, um resultado histórico, contra apenas um deputado do Movimenta Popular de Libertação de Angola (MPLA), no poder.


No âmbito da composição do novo Governo em Luanda, Mara Quiosa, do MPLA, foi nomeada nova governadora da província de Cabinda.

 

Em entrevista à DW África, o analista Chocolat Brás, investigador do Instituto Superior Politécnico Sol Nascente, em Huambo, considera que a Mara Quiosa terá que enfrentar desafios importantes, que incluem lidar com o movimento independentista FLEC, a oposição vitoriosa em Cabinda, UNITA, e a pobreza da população.


DW África: Haverá mudanças políticas a acmpanhar a mudança na administração regional?
Chocolat Brás (CB): Não espero muito da governadora de Cabinda. Não pela sua capacidade de governar ou cuidar do povo, porque para mim, governar é essencialmente cuidar. Mas porque o partido que a sustenta, historicamente tem demonstrado não saber governar e estar pouco interessado no bem-estar dos cidadãos. Portanto, Mara Quiosa vai governar uma das províncias mais difíceis do país depois de Luanda, onde a guerrilha da FLEC é um facto. Onde a oposição venceu as eleições com quatro deputados dos cinco mandatos disputados. E onde a população sabe de facto a origem do seu sofrimento e a justiça das suas lutas.


DW África: Quais são os desafios da nova governadora de Cabinda?

CB: O que acho que ela deveria fazer é tentar governar para todos e com todos. Ser capaz de não olhar somente para os militantes do seu partido, sobretudo, porque entre os membros do MPLA há muita dificuldade em lidar com a verdade. E porque tendencialmente, eles optam pela bajulação e aquilo que considero de "cafricação”, que é a ideia de minar a governação do outro para a sua substituição. O segundo desafio seria abrir-se para a sociedade civil e saber ouvir todos, independentemente da filiação partidária e da visão crítica que possam ter sobre as políticas do atual executivo.


DW África: É preciso definir o estatuto de autonomia para Cabinda, como sugeriu o Presidente da UNITA, Adalberto da Costa Júnior? Seria a solução?
CB: Seria uma das soluções. Lembrando que o problema da luta independentista de Cabinda é quase secular. Mas é preciso dizer que esta não é apenas uma opinião do líder da UNITA, Adalberto Costa Júnior, o próprio Governo do MPLA há alguns anos pensou em atribuir um estatuto especial à província de Cabinda, mediante incentivos fiscais e aduaneiros. Eu acho que uma política de autonomia para Cabinda pode ser um caminho para minimizar os impactos do conflito em torno da independência da região, mas sobretudo para garantir que a população sinta algum fôlego do ponto de vista económico, político e social.

Penso que o MPLA com alguma inteligência, e considerando a nomeação da Mara Quiosa que politicamente tem experiência suficiente para dialogar, poderia encarar este dossier de autonomia local.

 

DW África: A situação socioeconómica de Cabinda está na base dos conflitos que ocorrem nesta zona de grande riqueza natural que não beneficia os residentes. Até que ponto a produção de petróleo é refletida na vida dos cidadão?
CB: Os conflitos de ordem político-social constituem uma das bases dos problemas que Cabinda tem. Mas também devemos ter em conta que as políticas orientadas para a província têm potenciado este sofrimento da população, têm potenciado esta incapacidade de melhor gestão dos muitos recursos que a província possui. Existem vários exemplos que podemos trazer aqui, para mostrar que há apenas uma tendência de explorar os recursos e não partilhar os benefícios destes recursos com a população local.


Tens uma província de Cabinda que produz tanto petróleo e não tens nenhum instituto de formação técnico-profissional na área. Tens os grandes gestores de sistemas de petróleo no país, desde a Sonangol e de outras empresas petrolíferas, que não são da província. Não há uma política de aproximar as populações de Cabinda ao benefício que podiam ter vindo desta exploração de petróleo. Isso parece-me grave. Não estou a dizer que devem ser os cabindenses a gerir os recursos e as empresas petrolíferas, mas parece-me que seria importante a população sentir o benefício daquilo que a província produz.