Luanda - A «deflação» no discurso oficial do Executivo Angolano sobre a institucionalização das autarquias, copulada à proposta da nova Divisão político-Administrativa, onde o país passará de 164 municípios a 581, compele-me a fazer o seguinte prognóstico: as autarquias locais não serão implementadas neste mandato do Presidente João Lourenço, salvo se a oposição enfrentar (e propor) o gradualismo geográfico do MPLA por ele próprio fortemente rejeitado. Espero muito estar errada, mas os sinais apontam nesta direcção.

Fonte: Club-k.net

Um forte sinal, dado pelo Presidente da República, de redução da sua tónica quanto ao seu comprometimento com a implementação das autarquias locais, por muitos comentados, foi o seu discurso do Estado da Nação; mencionou autarquias locais por umas poucas vezes sem avançar dados concretos sobre a sua implementação, ao contrário do esperado. Afirmam os pesquisadores Gilson Lázaro e Osvaldo Silva, num artigo d’O Novo Jornal, na edição de 02 de Dezembro, «na verdade, com essa omissão, João Lourenço reata o contra-apelo do que assumiu na última campanha eleitoral [das eleições gerais de 2017 ], em 2019, por ocasião do lançamento do Plano Integrado de Intervenção nos Municípios (PIIM)….Por um lado, ele [o PIIM] serve para justificar a não implementação das autarquias locais, devido à suposta carência de infra-estruturas locais para o funcionamento dos futuros órgãos autárquicos e a fixação do pessoal administrativo local». O Senhor Presidente também afirmou que a institucionalização das autarquias locais dependia do «Pacote Legislativo Autárquico» que era tarefa da Assembleia Nacional, e que o seu executivo não estava de braços cruzados.


Em 2021 tivemos a revisão constitucional que elimina o normativo constitucional do gradualismo na institucionalização das autarquias locais, já que o impasse residia nas contradições das interpretações do gradualismo. Quando considerávamos que este impasse estava quase revolvido, fomos surpreendidos com a proposta da nova divisão político-administrativa que nos «brinda» com mais 417 municípios.


As perguntas que nos surgem são efectivamente se o país tem recursos suficientes para criar as infra-estruturas, garantir a capacitação do pessoal, custear as despesas com o pessoal desses novos municípios; qual é o custo de concepção, execução e fiscalização de uma infra-estrutura administrativa? Peguemos neste valor e multipliquemos por 417; quanto será? Qual é o horizonte temporal para a conclusão destas infra-estruturas e capacitação do pessoal?


Por outro lado, será esta divisão político-administrativa prioritária ou mesmo necessária antes da implementação das autarquias? Não nos restam dúvidas que esta divisão político-administrativa irá tornar o processo de institucionalização mais complexo e mais moroso.


Outrossim, o presidente já sinalizou que vai haver um PIIM 2. Não me parece ser coincidência! A construção de 417 novas administrações municipais vai justificar bem um PIIM2 e, este último, será também uma escapatória para a não realização das autarquias, a não ser que, a oposição que está com a batata quente de coordenar a quarta comissão, da Administração do Estasto e poder Local, se renda ao gradualismo geográfico do qual já não se fala.


Para usar as palavras dos pesquisadores acima referenciados, «João Lourenço… parece não mais reconhecer a necessidade imperiosa das autarquias locais». E, ademais, não me parece relevar o pelo facto de ser o próprio (sua excelência senhor Presidente) a desvalorizar as promessas que fizera.

Vânia Frederico
04-12-2022