Luanda - A Constituição angolana completa neste domingo, 5 de fevereiro, 13 anos. Quando foi promulgada, em 2010, lembra o jurista Aires Mateus, a lei magna privilegiou os direitos, liberdades e garantias fundamentais dos angolanos e um novo panorama político - o presidencialismo.

Fonte: Lusa

Mas 13 anos depois, diz o jurista, o Estado ainda peca na sua efetivação: "Às vezes, ao tentar reprimir um ato ilegal, o Estado comete também um outro ato ilegal e falta então este rigor pedagógico que eu acho que deviam implementar de forma efetiva".

"Aqui no nosso país estamos a legislar mais e estamos a levar menos essa informação legislativa, o que acaba por criar essa incultura e muitas das vezes, por mais que nós queiramos reivindicar, não sabemos os parâmetros legais exigidos para que nós possamos defender o nosso direito dentro da legalidade", explica o jurista.

Constituição angolana "longe de ser respeitada"

 

O sociólogo e padre Velasco Anapaz Kassindula diz mesmo que os angolanos continuam estranhos no seu próprio país, 13 anos depois.

"A Constituição da República de Angola estará longe de ser respeitada quando, por exemplo, o acesso à justiça, educação e saúde forem seletivas e garantidas apenas aos economicamente capazes, como é o caso angolano".

E 13 anos depois, sublinha o reverendo Anapaz, a Constituição continua a sofrer constantes golpes, "como são os casos de impedimentos aos exercícios de liberdade de expressão e manifestações muitas vezes reprimidas pelas forças de segurança".

O religioso lembra que a repressão exercida pelas forças do Governo, "muitas vezes, levada ao extremo, acaba criando detenções arbitrárias contra quem ousa exigir do Estado a garantia do seu direito, e noutros casos, acabam mesmo ceifando vidas humanas".


O favorecimento dos mais ricos é um dos principais problemas, segundo o sacerdote da diocese de Menongue. "Enquanto o filho do pobre apodrecer na prisão por roubar uma galinha e continuarem soltos e impunes os oligarcas que dilapidaram o erário público, investindo fora do país, nos chamados paraísos fiscais, teremos, pois, a certeza de que a Constituição favorece uma elite", afirma.

Revisão constitucional

Para o jurista Aires Mateus, a mais recente revisão constitucional, por iniciativa do Presidente João Lourenço, em 2022, não respondeu às necessidades e preocupações dos angolanos.

"O que nós devemos fazer é exigir cada vez mais do Estado e o Estado em contrapartida exigir dos cidadãos para que possamos caminhar juntos e, acima de tudo, caso haja uma proposta da revisão constitucional, então podemos também pensar, quem sabe, num novo regime politico, porque nós temos um regime presidencialista quase que atípico. O Presidente da República podemos lhe considerar deputado-Presidente porque é o primeiro deputado do partido político que vai concorrer, eu acho que poderiam clarificar esta situação talvez se tivermos um sistema presidencialista que haja uma eleição para direta do Presidente da República e uma eleição para os deputados da Assembleia Nacional. Isto também será um ganho", sugere.

Para o padre Velasco Anapaz Kassindula, o facto de o Presidente da República de Angola ser igualmente chefe de Estado e de Governo promove um regime autocrático. Por isso, defende também uma revisão da Constituição "de modo a desatrelar o poder legislativo e judicial do executivo".

"Falo propriamente da questão de redução de alguns poderes ao Presidente da República, porque se faz excessivo e dá a impressão de que Angola mais do que ser um Estado Democrático e de Direito parece ser um Estado Autocrático, onde só um é quem decide por todos", conclui o padre