Luanda - Para o economista Precioso Domingos, a queda na produção de petróleo e o uso de grande parte das receitas para pagar dívida pública prenunciam o fim da era das 'vacas gordas'. A solução seria menos intervenção estatal.

Fonte: DW

Enquanto a moeda angolana regista uma desvalorização histórica, o a vida dos angolanos está cada vez mais cara. Mas como reverter este quadro económico?

Em entrevista à DW África, o economista angolano Precioso Domingos defende que o país precisa de instituições políticas e de um mercado fortes, além de menos interferência governamental se quiser fortalecer a moeda nacional.

Para o especialista, a aposta no hidrogénio verde deve somar-se à oferta petrolífera, atualmente em queda e comprometida com a dívida. Já o investimento no agronegócio pode ser uma opção adequada para Angola, porém sem planificação central.

 

DW África: Como solucionar a desvalorização do kwanza?


Precioso Domingos (PD): Por um lado, é preciso que Angola faça o trabalho de casa do ponto de vista de reformas políticas, reformas no aparelho do Estado que favoreçam o mercado. Por outro lado, existe a necessidade de reformas para se instituírem instituições de mercado. Uma das instituições necessárias para que tenhamos uma moeda forte é o respeito pelos direitos de propriedade. E uma das propriedades que as pessoas têm é o dólar, uma moeda que elas consideram forte.

 

DW África: Quais seriam as consequências disso?

PD: O dólar aqui circula apenas em termos de fluxo, justamente porque as pessoas entendem que, sempre que há dólares, é o momento a partir do qual também nós devemos fazer reservas de dólares. Isso faz com que o país se depare sempre com uma situação de falta de dólares, tão logo o preço do petróleo baixa.

 

DW África: Poderá a combinação da queda do preço e da produção do petróleo indicar que a época dourada do petróleo e das "vacas gordas" estará chegando ao fim?

PD: Eu diria que sim. Não tanto por razões externas, mas por, digamos assim, problemas institucionais. A baixa de produção do petróleo está a ser conjugada com a circunstância de ter que ser partilhada com o serviço da dívida. Ou seja, parte da produção do petróleo, que é já metade daquilo que era no passado, ainda serve para fazer face ao serviço da dívida.


DW África: Como avalia o processo de diversificação da economia angolana? Está a decorrer na velocidade necessária?

PD: Não, infelizmente não. Por um lado, quem faz a diversificação da economia angolana são os privados. Por outro lado, esses privados não têm como levar a cabo esse processo natural de fazerem negócios a partir do momento em que nós, em termos de instituições de mercado, não temos o básico. Em Angola, os preços não são livres. Em Angola, os preços são controlados pelo Governo. Há muito intervencionismo.

 

DW África: Novos projetos na área de energia, como a produção e exportação de hidrogénio verde, têm sido apresentados pelo Governo - e têm estado em negociação com a Alemanha, por exemplo. A aposta em energia verde é o caminho certo?

PD: Penso que é uma aposta certa, desde que não seja colocada na lógica de substituição das fontes de energias não limpas. Concordaria com aquela corrente que vem dizer que temos que falar em adição de energia. Se assim for, penso que é bom para Angola, porque o país tem muito potencial.

 

DW África: O investimento no agronegócio com foco na produção de grãos foi recentemente apresentado em Berlim pelo ministro da Economia e Planeamento, Mário Augusto Caetano João, como a aposta angolana para os investimentos estrangeiros no país. Que implicações teria isso para o setor agrícola angolano?

PD: É aí que está o problema. Passamos de programas a programas, de planos a planos. Nesses projetos, que são governamentalmente criados, o Governo define áreas prioritárias e uma série de parâmetros, e dificilmente dão certo. Os balanços acabam sendo desastrosos, sendo que o Governo depois prefere não apresentá-los, porque eles são feitos na base de um tipo de financiamento que não é sustentável - que acaba fazendo com que projetos inviáveis aparentem ser viáveis no papel, mas depois as condições macroeconómicas alteram-se e simplesmente paralisam esses projetos.