Luanda - Ouvido pela DW, o analista angolano, Ilídio Manuel, diz não ter dúvidas que a proposta "inédita" da UNITA apanhou o MPLA de surpresa e que, prova disso, foi a sua "reação desproporcional".

Fonte: DW

Em Angola, terminou na terça-feira (15.08), o primeiro ano parlamentar da quinta sessão legislativa da Assembleia Nacional com vários pendentes não resolvidos há anos. Autarquias e fiscalização são os temas que ficaram de fora da agenda do Parlamento angolano, mas a oposição abordou um tema à saida da Assembleia Nacional: a destituição do Presidente João Lourenço.

 

Ouvido pela DW, o analista angolano Ilídio Manuel diz não ter dúvidas que a proposta "inédita" da UNITA apanhou o MPLA de surpresa e que, prova disso, foi a sua "reação desproporcional".

 

Ainda que não acredite que a UNITA consiga destituir João Lourenço por esta via, o mesmo analista frisa que a proposta do maior partido da oposição "mexeu com todo o panorama político de Angola" e que o voto secreto "preocupa" o partido no poder.

 

DW: Terminou, esta terça-feira (15.08), o ano parlamentar em Angola, que fica marcado pela iniciativa proposta pela UNITA de destituir o Presidente João Lourenço. Esta é uma proposta que tem pernas para andar?

Ilídio Manuel (IM): Não vai produzir grandes efeitos, mas tem o mérito de ter sido algo de inédito. Não há memória de algo semelhante em toda a história da legislação angolana. Isto criou uma série de ondas, apanhou de surpresa o partido no Governo, que nunca foi confrontado com uma situação destas. Esta reação pode ser aferida pela sua forma brusca e brutal. [O MPLA] teve uma reação desproporcional.

DW: Portanto, mesmo que não avance, podemos dizer que esta é uma iniciativa já "ganha” em termos politicos ?

IM: Sim, e que mexeu com todo o panorama político angolano. O MPLA sempre se viu como um partido com iniciativa de controlar tudo e todos. Desta vez, foi um ponto que lhe tocou com alguma profundidade.

 

DW: Este pedido da UNITA pode trazer consequências no seio do MPLA?

Sim, porque o MPLA, aparentemente, só é coeso por quem tem poder, e tem toda a máquina da comunicação social sob seu controlo e vai escondendo determinadas divisões internas. De contrário, se abrisse espaço, dentro do próprio partido haveria mais vozes discordantes que poderiam vir a público e dizer o que lhes vai na alma.

 

DW: Caso a proposta chegue a votação, acredita que pode haver surpresas no tal voto secreto?

IM: Não acredito que a UNITA consiga destituir o Presidente da República por este canal. Mas, vamos ter um mecanismo - o voto secreto - que preocupa o MPLA. Muitos desses deputados só lá estão por defesa às cores partidárias, mas no íntimo, sabem que a governação de João Lourenço tem muitos aspetos negativos. Em seis anos no poder, acumulou mais contestações do que José Eduardo dos Santos em 38 anos.

 

DW: Acha que os problemas apresentados pela UNITA como sendo a base para o pedido de destituição podem gerar contestação social?

IM: A própria população é um bocado amorfa. Quer a sociedade civil ou a própria população, não acredito que tome iniciativas para grandes manifestações na rua, também porque há um forte aparelho repressivo. E isso condiciona muito as liberdades. No entanto, a reação ao pedido de destituição da UNITA foi muito mais ruidoso do que o próprio pedido em si. O MPLA fez uma série de alaridos em querer arrastar multidões para as ruas e fez o que critica na UNITA. Diz que os problemas devem ser resolvidos nas instituições e não nas ruas, mas o próprio MPLA mobiliza as pessoas para criar este sentimento. DW Africa