Luanda - O apoio de Washington a um trem de transporte de minerais que conecta a República Democrática do Congo (RDC) ao Atlântico ilustra o desejo dos EUA de competir com a China.

Fonte: FT

Quando o carro do embaixador dos EUA chegou a um terminal portuário na costa atlântica de Angola no mês passado, os estivadores ficaram entusiasmados ao ver a bandeira americana. “Nós amamos os Americanos!” gritaram em português, a língua oficial do país.

 

Esse novo entusiasmo por Washington é surpreendente em um país que já foi palco da Guerra Fria, aliado de Moscou e, posteriormente, o maior beneficiário de empréstimos chineses na África. Mas não é sem justificativa. Os EUA estão ajudando a financiar o Corredor do Lobito, uma revitalização de uma ferrovia centenária que transportará minerais críticos pela região, conectando a RDC, rica em recursos, ao porto de Lobito, em Angola.

 

O projeto é ambicioso e custará pelo menos US$ 10 bilhões, segundo estimativas de autoridades angolanas. Além da ferrovia, inclui estradas, pontes, telecomunicações, energia, agronegócio e uma extensão planejada para a província de Copperbelt, na Zâmbia.

 

O envolvimento dos EUA no Lobito faz parte de uma estratégia para recuperar sua influência na África, onde países como China, Rússia, Turquia e Emirados Árabes Unidos têm ganhado espaço. A China tem uma presença particularmente grande na África, graças à sua Iniciativa Cinturão e Rota de US$ 1 trilhão. A oferta de Pequim para financiar e construir infraestrutura em países mais pobres dá-lhe uma vantagem na corrida pelo controle de minerais críticos para defesa, energia renovável e veículos elétricos.

 

O Corredor do Lobito beneficiará Angola, dizem apoiadores, ajudando a reduzir o déficit de infraestrutura de até US$ 170 bilhões por ano no continente, segundo estimativas do Banco Africano de Desenvolvimento, outro parceiro de financiamento do projeto, ao lado da Itália.

 

“O Corredor do Lobito mostrará o modelo americano de desenvolvimento”, afirma o embaixador dos EUA, Tulinabo Mushingi. “Precisamos de aliados que concordem com nossa forma de fazer negócios.”

 

O objetivo central do Corredor do Lobito é criar a rota mais rápida e eficiente para exportar minerais críticos da Copperbelt da África Central para os EUA e a Europa. Dois anos atrás, um consórcio de empresas europeias — o trader suíço Trafigura, o grupo de construção português Mota-Engil e o especialista belga em ferrovias Vecturis — ganhou uma concessão de 30 anos para a Ferrovia do Atlântico de Lobito (LAR) para gerir o transporte de minerais por 1.300 km de trilhos em Angola. Eles também estão modernizando e operando o porto mineral.

 

“Este é um ponto de entrada fácil para o soft power dos EUA”, diz Gracelin Baskaran, diretora de segurança de minerais críticos no Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS), um think-tank com sede em Washington.

 

A China controla grande parte da extração e refino de minerais críticos globalmente, mas a linha ferroviária ainda pode ser usada por mineradoras chinesas. “A carga que sai deste corredor não vai exclusivamente para a China”, diz Ricardo Viegas D’Abreu, ministro dos transportes de Angola. “Todos precisam de minerais.”

 

Mas Angola deve agir com cautela devido à fragilidade de sua economia dependente do petróleo e ao seu enorme fardo de dívida com Pequim. Dos US$ 45 bilhões que Luanda já contraiu, ainda deve cerca de US$ 17 bilhões à China, em sua maioria em forma de empréstimos garantidos por petróleo.

 

“Angola está fazendo o que muitos países africanos estão fazendo: querem ser amigos de todos, mas não querem ser controlados por ninguém”, afirma Ricardo Soares de Oliveira, professor de política africana da Universidade de Oxford.

 

O Presidente João Lourenço não quer que Angola fique presa em uma nova Guerra Fria.

Angola está se movendo após décadas de conflito. Após uma prolongada guerra civil que terminou em 2002, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) — o partido que domina a política do país desde a independência de Portugal em 1975 — supervisionou um boom de petróleo e construção, muito financiado por empréstimos chineses.

 

Nos últimos anos, Lourenço tem cortejado os EUA e a Europa, buscando atrair investimentos estrangeiros e convencer capitais ocidentais de que Angola não é mais tão aliada da Rússia ou da China como era sob seu predecessor, José Eduardo dos Santos.

 

“Estamos em um momento histórico”, disse o presidente Joe Biden ao receber Lourenço em Washington no ano passado, destacando o Lobito como o “maior investimento ferroviário dos EUA na África”. “A América está totalmente comprometida com a África”, acrescentou. “E estamos totalmente comprometidos com você e com Angola.”

 

Lourenço foi igualmente efusivo, agradecendo a Biden por mudar “o paradigma de cooperação” entre os EUA e a África.

 

O Corredor do Lobito, que inclui mais de US$ 1,2 bilhão em financiamento dos EUA para construção de usinas solares e pontes ao redor de comunidades rurais, é apontado como o “projeto emblemático” da nova estratégia americana, segundo Helaina Matza, coordenadora do Parceria para Infraestrutura e Investimento Global (PGII).

 

Para Angola, o projeto representa uma grande oportunidade. Para Washington, o Corredor do Lobito simboliza uma nova abordagem ao engajamento na África, oferecendo uma alternativa à dependência econômica da China.

 

Mucanda, maquinista de uma locomotiva da General Electric pintada com as cores de Angola, concorda que o Corredor do Lobito "é uma coisa muito boa para Angola e para a África".