Luanda – O processo de Reconciliação Nacional em Angola, que deveria simbolizar união e justiça após décadas de conflito, está agora envolto em controvérsias e queixas de descumprimento por parte do governo. Antônio Ferreira Seixas, proprietário de um imóvel cedido ao Estado em 1999 para abrigar membros do Governo de Unidade e Reconciliação Nacional (GURN) e quadros das Forças Armadas Angolanas (FAA), está no centro de um caso que ilustra as falhas desse processo.

*Elias Muhongo
Fonte: Club-k.net

Seixas reivindica uma dívida de arrendamento que, segundo ele, remonta ao período em que o Ministério da Administração do Território e Reforma do Estado (MAT) assumiu a responsabilidade de pagar 3.500 dólares americanos mensais pelo uso de sua residência em Luanda. No entanto, após alguns meses, os pagamentos cessaram, resultando em uma dívida que ele vem tentando cobrar há mais de duas décadas.

 

"Assinamos o contrato com o governo na esperança de contribuir para a Reconciliação Nacional e para um futuro melhor para Angola. No entanto, estamos a ser a prejudicados por promessas não cumpridas", desabafa Seixas, que agora, aos 73 anos e com problemas de saúde, se vê pressionado pela falta de pagamento.

 

O valor total da dívida, que inicialmente era de 231.000 dólares, foi reduzido pelo MAT para 131.000 dólares, um corte de 100.000 dólares que Seixas contesta. "Este processo está a 'matar-me' lentamente. Já não é só uma questão financeira, mas de dignidade e justiça", afirmou o senhorio, visivelmente frustrado com a demora na resolução do caso.

 

O não pagamento dessa dívida não é um caso isolado e levanta preocupações sobre a forma como o governo angolano tem lidado com as obrigações contraídas no contexto da Reconciliação Nacional. Para muitos observadores, o descumprimento desses contratos é um reflexo de uma falha mais ampla na implementação dos acordos de paz de Bicesse e do Protocolo de Lusaka, que visavam estabilizar o país e promover a unidade entre antigos adversários.

 

Além disso, o fato de a dívida ter sido reconhecida como dívida pública sem que houvesse um esforço concreto para quitá-la até o momento, aponta para uma possível negligência administrativa e falta de prioridade na gestão das finanças públicas. "É inadmissível que, após tanto tempo, ainda tenhamos que lutar por algo que é nosso por direito", criticou Seixas.

 

A situação é ainda mais crítica para o senhorio, que enfrenta desafios de saúde e a necessidade de tratamentos médicos no exterior. "O tempo está a se esgotar para mim, tanto física quanto financeiramente. Não posso continuar esperando que o governo honre seu compromisso, enquanto minha saúde se deteriora", lamentou.

 

Este caso não apenas expõe as falhas na administração do processo de Reconciliação Nacional, mas também coloca em evidência a necessidade de uma reavaliação das práticas governamentais em relação aos contratos celebrados no âmbito dos acordos de paz. A resolução deste impasse é crucial não só para Seixas, mas para a credibilidade do próprio processo de reconciliação em Angola.