Lisboa - A eleição de Donald Trump como 47.º Presidente dos Estados Unidos reacende um debate que transcende as políticas internas e externas dos EUA: o papel da mulher na política.
Fonte: Club-k.net
Trump não é uma figura desconhecida para os americanos, tendo já sido eleito em 2016, numa corrida histórica contra Hillary Clinton. Agora, venceu novamente, desta vez superando Kamala Harris, actual Vice-Presidente dos EUA.
Em ambos os casos, as derrotas das candidatas alimentam questões sobre a resistência do eleitorado americano em relação a candidatas do sexo feminino.
Num país que se orgulha do seu sistema democrático e da igualdade de oportunidades, é inquietante observar a escassez de mulheres nas posições de maior destaque.
Desde 1872, 59 mulheres tentaram concorrer ao cargo de presidente, segundo dados do Centro para Mulheres Americanas e Política (CAWP), mas nenhuma delas conseguiu chegar à Casa Branca, e muitas nem passaram das primárias, ou representaram partidos tão pequenos que a sua campanha não teve relevância mediática.
Esta resistência parece não se limitar a diferenças ideológicas, mas enraizar-se em percepções sociais que permanecem difíceis de desmantelar. Noutros países, incluindo várias democracias europeias e latino-americanas, mulheres já alcançaram o cargo máximo, refletindo uma sociedade mais aberta a lideranças femininas.
Nos Estados Unidos, porém, o “teto de vidro” parece mais espesso e resistente. Será uma questão cultural profundamente arraigada, uma relutância em ver as mulheres como líderes máximas ou um reflexo do receio de mudança?
As eleições de 2016 e 2024 deixam transparecer que, embora o eleitorado americano valorize a igualdade, há ainda um longo caminho a percorrer para que essa igualdade se traduza em oportunidades reais. E enquanto esta resistência persistir, o país ficará inevitavelmente privado de líderes com capacidades comprovadas, apenas pelo simples facto de serem mulheres.
A política americana continua a ser selvagem e, por vezes, estranha, mas também reflecte as suas contradições internas. Uma verdadeira democracia só se realiza quando todos os seus cidadãos, independentemente do género, podem atingir as mesmas alturas.
No entanto, esta reflexão sobre a presença das mulheres na política não é exclusiva dos Estados Unidos. Em Angola, este tema tem igualmente gerado debate. Há poucos meses, o Presidente João Lourenço sugeriu – durante um discurso – a possibilidade de uma mulher liderar o país no futuro.
Esta sugestão foi recebida com algum entusiasmo, mas também com ponderação. Afinal, estarão os angolanos preparados para serem liderados por uma mulher, considerando os hábitos e costumes enraizados na cultura angolana?
A aceitação de uma liderança feminina em Angola, tal como nos Estados Unidos, pode enfrentar resistência. As tradições culturais e as percepções de género ainda desempenham um papel significativo em muitas sociedades, e a mudança de mentalidade é frequentemente um processo longo.
No entanto, o exemplo de outros países que elegeram mulheres para cargos de destaque mostra que este não é um obstáculo intransponível. Pelo contrário, é uma oportunidade para refletir sobre os avanços possíveis e sobre a necessidade de adaptar os conceitos de liderança às realidades do século XXI.
No fundo, o sucesso de uma nação depende da capacidade de reconhecer e valorizar talentos, independentemente do género. Tanto em Angola como nos Estados Unidos, há que construir uma visão mais inclusiva e representativa, onde as mulheres possam alcançar o mais alto nível de responsabilidade e decisão política.
Só assim será possível cumprir plenamente os valores de igualdade e democracia que ambos os países almejam.
*Jornalista, Jurista, Defensor dos Direitos do Consumidor e Activista dos Direitos Humanos