Luanda - Nos primeiros anos da Resistência Popular Generalizada, liderada pela UNITA entre 1976 e 1991, algumas entidades da alta estrutura das FALA adoptavam como alcunhas os nomes de figuras revolucionárias ligadas à Revolução Comunista Chinesa, encabeçada pelo lendário Mao Tsé-Tung. Por exemplo, o General Geraldo Nunda era conhecido como o Tenente-Coronel "Lin Biao"; para nós, crianças na altura, chamávamos-lhe o tio "Limpiao" – pronúncia aportuguesada do nome do Marechal Lin Biao, um dos principais comandantes do Exército Vermelho que participou na Guerra Sino-Japonesa, de 7 de Julho de 1937 a 2 de Setembro de 1945, travada entre a República da China e o Império Japonês. Por sua vez, o General Kamalata Numa era identificado como o Major Mao Tsé-Tung, e para nós era simplesmente o tio "Mao". Pouco tempo depois, as alcunhas foram substituídas pelos nomes actuais, inspirados em soberanos angolanos.

Fonte: Club-k.net

É importante destacar que a influência chinesa, naquele contexto, não se limitava às alcunhas. Havia consideráveis semelhanças entre as revoluções. E isto é compreensível, pois os primeiros oficiais das FALA foram treinados na China, em 1965. Inclusive, o próprio Dr. Savimbi teve aulas de estratégia militar com Mao Tsé-Tung. Conta-se que, durante uma dessas sessões, Mao sugeriu o posicionamento estratégico das bases de guerrilha na luta pela independência de Angola. Segundo relatos, o lendário líder chinês pediu um mapa de Angola e indicou a região adequada às manobras dos guerrilheiros. Esta zona permitia acesso à fronteira com a Zâmbia em poucos dias de marcha, funcionando como um corredor logístico crucial.

Outra notável semelhança é a Longa Marcha. Em Fevereiro de 1976, a UNITA encetou a difícil "Longa Marcha". Sob pressão de uma ofensiva militar – desencadeada pelas FAPLA, braço armado do MPLA, em conjunto com as tropas cubanas – a Direcção da UNITA foi obrigada a abandonar o Luso, actual Luena, e marchar dia e noite, durante cerca de seis meses, em direcção às zonas remotas nas terras do fim do mundo – Cuando Cubango. O objectivo do inimigo de então era decapitar a direcção política e militar da UNITA, para fazer jus ao pronunciamento do primeiro Presidente de Angola, António Agostinho Neto, que, na altura, declarou: "ao inimigo nem um palmo de terra." Neto prometeu vergar, em alguns meses, o braço armado da UNITA. E isso não chegou a ser concretizado; pelo contrário, as FALA cresceram em quantidade e qualidade. As simples colunas de guerrilheiros – como foram os casos das famosas colunas Samanjolo e Kazombwela – evoluíram para Batalhões, Unidades Semi-Regulares e Regulares. Foram criados Agrupamentos de Comandos Especiais, Comandos "Scubas" e Comandos de Penetração; inclusive, um grupo de oficiais foi despachado para treinos de especialidade em Marrocos. Além disso, alguns jovens em idade escolar beneficiaram de bolsas de estudos no Senegal, na Costa do Marfim e noutros países. Foi assim que Jonas Savimbi conseguiu impor a Democracia em Angola – tal como reconheceu publicamente o Presidente Eduardo dos Santos, ao dizer: "a Democracia nos foi imposta."

Como alguns episódios da história se repetem, no ano de 2000, percorri as áreas das antigas bases de guerrilha sugeridas por Mao Tsé-Tung. Durante dois anos consecutivos, manobrámos por aquelas regiões: Mwangai, Masivi, Samuyuleno, Sandona, Katapi, Sabenita, Lungwevungu, Lukuse, Lutãi etc. Nesse período, tornámo-nos verdadeiros nómadas que cruzavam o leste de Angola de ponta a ponta. Convivemos com os nativos que nos ensinaram a falar um pouco de Cokwe. Aprendemos também a preparar o vingundu (bebida fermentada à base de mel) e a usar o cinyundu (equipamento que produz fumo para afugentar as abelhas das colmeias). Apesar de tudo, foram tempos difíceis. Muitos companheiros ficaram pelo caminho.

A história da guerrilha da UNITA e a ligação com as ideias de luta de Mao Tsé-Tung demonstram como os movimentos de libertação em África estavam conectados às dinâmicas geopolíticas globais.

Voltarei...

Luanda, 13 de Janeiro de 2025
Gerson Prata