Luanda - Juristas criticam proposta de lei contra “fake news” em Angola e alertam que até o Governo pode ser prejudicado. “O próprio Executivo é um dos maiores produtores de notícias falsas”, afirmam.
*Manuel Luamba
Fonte: DW
Proposta para criminalizar desinformação online em Angola é criticada por juristas, que apontam excesso legislativo e risco de violação da liberdade de expressão. Para alguns, até o Executivo poderia ser alvo da nova norma.
A proposta de Lei sobre a Disseminação de Informações Falsas na Internet, apresentada pelo Governo angolano, está a ser alvo de duras críticas por parte de juristas. Para Teixeira Cândido, a iniciativa não faz sentido, uma vez que o país já dispõe de legislação suficiente para proteger os direitos fundamentais.
"Não compreendo a razão para se aprovar uma lei da desinformação quando o que se pretende proteger está devidamente protegido”, afirmou, em declarações à DW.
Cândido recorda que existem normas que resguardam o bom nome, a vida íntima, a honra, os segredos de Estado e de justiça, bem como os direitos de crianças e jovens. Além disso, sublinha que qualquer nova lei deve estar em conformidade com a Constituição angolana e com compromissos internacionais.
"Os Estados não devem interferir na liberdade de expressão no sistema online ou na Internet”, acrescentou, citando a Declaração da União Africana de 2019 sobre Liberdade de Expressão e Acesso à Informação.
Liberdade de expressão em risco
O também jurista Manuel Cornélio defende que o impacto da proposta dependeria da forma como os artigos forem redigidos. Mas alerta para um cenário preocupante: se mal aplicada, a lei pode atingir em cheio quem a está a promover.
"As instituições com maior responsabilidade que deviam informar com verdade, somente a verdade e de forma antecipada, não o fazem”, advertiu Cornélio.
Para ele, o cerne da questão está em quem decide o que é verdadeiro ou falso — uma definição subjetiva que, sem garantias claras, pode dar margem a abusos.
Críticas ao Executivo: "produtor de notícias falsas”
O jornalista Jorge Neto vai mais longe nas críticas. Na sua opinião, o próprio Governo estaria entre os principais alvos da eventual nova lei.
Os partidos na oposição são outros produtores de notícias falsas. Então, essa lei vem mais inibir a intenção desses entes de produzirem notícias que não são notícias”, apontou.
Jornalismo profissional fora do radar
Apesar da polémica, há quem veja pouca razão para alarme entre os meios de comunicação digitais. O responsável do jornal Estado News acredita que o jornalismo sério não se deve preocupar com a proposta, por princípio.
"O jornalismo não se compadece com notícias falsas. Aliás, notícias falsas não existem. Ou é notícia ou não é notícia. É um facto, verificamos o facto e noticiamos”, defendeu.