As «palavras malditas» foram proferidas no decurso de uma conferência sobre jornalismo e eleições, realizada na última semana do mês de Abril pelo Cefojor (Centro de Formação de Jornalistas) em Luanda. Ernesto Bartolomeu, ao dirigir uma questão ao prelector, o jornalista luso-americano da Sic, Luís Costa Ribas, descreveu que é prática editorial na casa a informação não ser feita pelos factos, mas sim pelos editores.
Segundo ele, as peças editadas com a informação recolhida pelos repórteres são muitas vezes postas de parte a favor de uma determinada linha de orientação simpática ao comité de especialidade (do Mpla, entenda-se).
Na tpa, de acordo com Ernesto Bartolomeu, podem registar-se casos de pressão, até por via telefónica, em cima do noticiário, para se favorecer o partido no poder em termos de exposição e reservar às outras formações políticas o menor espaço de tempo possível, um minuto, quando muito.
O pivot do telejornal da tpa perguntava como lidar com esta situação e como conciliar isto com a prática do bom jornalismo em pleno período de eleições.Este pronunciamento originou a instauração do processo disciplinar, porquanto, segundo fez circular a direcção da tpa para conhecimento dos trabalhadores, Ernesto Bartolomeu revelou assuntos sujeitos ao sigilo profissional que vigora na televisão pública.
Por outro lado, e sobre o tempo que a tpa dedica à cada partido nos seus noticiários e programação, a direcção da televisão pública alega que segue a regra da proporcionalidade, com base na representatividade de cada partido na Assembleia Nacional. Ou seja, estando o Mpla em maioria no parlamento, é a esse partido que a tpa dedica maior espaço. A Unita estaria imediatamente a seguir e depois o Prs.
A coordenar o processo disciplinar a que Ernesto Bartolomeu é sujeito, está o jornalista Isidro Sanhanga, subdirector para a informação, segundo uma nota afixada no mural informativo da televisão pública.
Tudo indica que, quando tomou a palavra no Cefojor, Ernesto Bartolomeu sabia que iria «partir a loiça», tanto que no fim da sua intervenção, disse-se pronto para ser entregue às feras. «Podem queixar, eu sei que vão queixar». Foi o que aconteceu. Passados menos de dez minutos, já Ernesto Bartolomeu estava a receber uma chamada «lá de cima» a perguntar se «tinha perdido» a cabeça.
Em resposta às interrogações do noticiarista da tpa, Luís Costa Ribas aconselhou-o a abandonar o emprego, se colocado diante do cenário em que a censura impede o exercício de um jornalismo livre e plural. Outras hipóteses apresentadas pelo luso-americano foram a resignação ou o alinhamento com a tentativa de mudar as coisas por dentro.
Ernesto Bartolomeu, contactado por este jornal, negou-se a confirmar a sua suspensão, remetendo-nos para o Gabinete Jurídico da tpa.Apesar de as práticas descritas por Ernesto Bartolomeu serem de conhecimento quase generalizado, esta foi a primeira vez em que um jornalista de um órgão público de comunicação social veio expor a realidade fora do restrito «círculo de amigos».
Fonte: Semanario Angolense