Luanda - Nos últimos anos, temos testemunhado um aumento preocupante da intolerância política em Angola, com militantes do MPLA, partido no poder, muitas vezes sendo os protagonistas desses actos condenáveis. No entanto, o que é ainda mais alarmante é a aparente passividade do Presidente da República, João Lourenço, diante dessa preocupante situação, 22 anos depois do fim da guerra civil.

Fonte: Club-k.net

É inegável que João Lourenço assumiu a presidência com promessas de mudança e renovação. Sua ascensão ao poder, em 2017, despertou esperanças - confesso-vos que acreditei piamente nesse lenga-lenga - de que a democracia em Angola seria fortalecida e que a intolerância política, particularmente, seria combatida e banida de forma decisiva.

No entanto, sua actuação tem sido marcada por uma notável falta de acção diante dos casos de violência e perseguição política cometidos por membros do próprio partido contra cidadãos que não se reveem no seu partido, ou seja, da UNITA.

É bem verdade que a intolerância política mina os pilares da democracia, sufocando o debate saudável e restringindo a liberdade de expressão. Em uma democracia verdadeira, o confronto de ideias deve ser incentivado, e o respeito pelas opiniões divergentes deve ser uma norma fundamental.

Mas, em Angola, temos visto uma atmosfera de medo e intimidação, onde aqueles que se atrevem a criticar o governo ou o partido no poder são silenciados através de ameaças, violência, perseguição ou mesmo cadeia.

Como líder máximo do país, João Lourenço tem a responsabilidade de proteger os direitos e liberdades de todos os cidadãos, independentemente de suas filiações políticas. Sua inação diante da intolerância política envia uma mensagem preocupante de conivência e complacência.

Ao não tomar medidas firmes - como salientou ontem o líder do Grupo Parlamentar da UNITA, Liberty Chiyaka na Assembleia Nacional - para conter esses abusos, ele está permitindo que a democracia em Angola seja erodida lentamente, já que, como disse nos tempos idos o malogrado ex-Presidente José Eduardo dos Santos, [a democracia] nos foi imposta.

É compreensível que, como líder de um partido político, João Lourenço possa enfrentar pressões internas para manter a coesão e o controle dentro do MPLA. No entanto, sua lealdade deve estar primeiramente ao povo angolano e aos princípios democráticos pelos quais tantos lutaram e morreram pela paz hoje alcançada. A falha em proteger esses princípios é uma traição à confiança daqueles que supostamente o elegeram e compromete o futuro democrático do país.

Chegou o momento de João Lourenço agir com coragem e determinação para enfrentar a intolerância política em Angola. Ele deve enviar uma mensagem clara aos militantes do seu partido (MPLA) de que a violência e a perseguição minam o processo da paz e reconciliação nacional que se pretendem acimentar, mesmo que isso signifique confrontar membros poderosos de seu próprio partido. Somente assim Angola poderá avançar verdadeiramente rumo a uma democracia plena e inclusiva, onde todas as vozes são ouvidas e respeitadas.

Pois, a inércia de João Lourenço diante dessa situação [intolerância política] também levanta sérias preocupações sobre o compromisso do governo angolano com os direitos humanos e o Estado de direito.

Em uma democracia saudável, a justiça deve ser lato sensu e acessível a todos os cidadãos, independentemente de sua filiação política. No entanto, a impunidade para os perpetradores de violência política envia uma mensagem perigosa de que o governo está disposto a fechar os olhos para abusos, como no passado, em nome de uma suposta estabilidade política. Sic!

Além disso, a tolerância à intolerância política pode ter consequências devastadoras para a coesão social e a estabilidade do país a longo prazo. O ressentimento e a alienação gerados pela perseguição política podem alimentar divisões profundas na sociedade angolana, minando a confiança nas instituições democráticas e exacerbando tensões étnicas e sociais.

Em suma, a passividade de João Lourenço diante da intolerância política prejudica a imagem internacional de Angola e mina a credibilidade do país no cenário global. O respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais é um princípio universalmente reconhecido, e os líderes políticos são julgados não apenas por suas acções dentro de suas fronteiras, mas também por seu compromisso com esses valores em nível internacional.

Ao permitir que a intolerância política floresça (como aconteceu recentemente no Cuando Cubango), João Lourenço compromete não apenas a reputação de Angola, mas também sua posição como líder (da paz) comprometido com os princípios democráticos.

*Jornalista, jurista e escritor