Luanda - HOJE, dia 10 de Novembro, há 49 anos, recordo aquele intenso dia,véspera da Dipanda. Dois dias antes, o Comité Central do MPLA havia aprovado a Lei Constitucional (que incluía a letra do Hino e o desenho da bandeira e das insígnias), a Lei da Nacionalidade e a Proclamação da Independência, projectos que vinham sendo preparados há algumas semanas.

Fonte: FO

Os textos eram aprontados pelas eficientes dactilógrafas do Ministério da Informação, gabinete do Ministro e Direcção de Informação, dirigida pelo Luís de Almeida. A confecção da bandeira estava entregue a uma costureira, se bem me lembro cunhada do Aristófanes Couto Cabral.

Os desenhos/maquetes da bandeira e das insígnias foram feitos num departamento técnico na cave do edifício do Ministério do Planeamento, sob a responsabilidade do então Secretário de Estado HS Onambwe e do Helder Neto. Rui Mingas, Manuel Rui, e depois Carlos Lamartine e Carlito Vieira Dias, compunham, gravavam, ensaiavam o Hino na Rádio Nacional, com um coro de jovens recrutados ad hoc…

Naquele dia 10, não havia mãos a medir para todos nós. O Manuel Rui, o Luís Colaço e outros dirigentes iam para o aeroporto acolher e depois alojar os inúmeros convidados estrangeiros. Eu ocupava-me de assegurar na Imprensa Nacional a impressão e publicação do Diário da República no 1, com a Lei Constitucional e a Lei da Nacionalidade, com a impreterível data de 11 de Novembro.

Os dedicados tipógrafos , chefiados pelo mais velho Figueiras, prometeram e cumpriram: ainda na noite de 10 para 11, foi entregue a Neto pelo Ministro da Justiça Diógenes Boavida esse número 1 do DR.

Durante a tarde, o Manuel Rui, acompanhado do Luís de Almeida e do Aristófanes Couto Cabral foram controlar a instalação e operacionalidade dos cerca de 400 aparelhos de TV que o Ministério adquirirá e colocará nas comissões de bairro para que o povo pudesse assistir ao acto da noite.

A meio da tarde, recebi a tarefa de ir à base naval da Ilha, por onde o Alto Comissário e às últimas tropas portuguesas embarcavam para Portugal. Pretextando levar e entregar a um oficial nosso amigo do MFA a bandeira que tinha sido arreada na base de Belas, o objectivo era realmente procurar obter da parte daquele oficial uma informação preciosa para as FAPLA…

Voltando à cidade, ainda acompanhei o Ministro Manuel Rui fazer uma gravação na Televisão e na Rádio, apelando à calma e serenidade para a noite que aí vinha. Isto, num tempo em que, literalmente, chegavam à cidade os fragores da guerra em Kifangondo.

Por volta das 10 horas da noite, tudo convergia para o começo da Estrada de Catete, a uns 200 metros do Largo, no lado direito, onde se erguia uma pequena tribuna, demasiado pequena para os actores e inúmeros convidados. Em frente, um pouco à esquerda, o coro iria cantar o hino e a bandeira iria ser içada por um pioneiro e pelo braço sobejante do herói do 4 de Fevereiro, Imperial Santana.

Vinte minutos antes da cerimónia acabar, eu abandonei o local, porque, tendo-se decidido em cima da hora, que o Presidente Neto deveria ir ao Palácio, como que tomando o poder simbolicamente, fui incumbido de ir lá ver se “estavam criadas todas às condições “. Quando lá chegou, eu e o saudoso Hermínio Escórcio recebemos Neto e sua família e pequena comitiva, na escadaria do jardim. Lá dentro, fez-se um brinde, carinhosamente servido pelos “criados do Senhor Governador”, de impecável libré e luvas brancas…


Neto assomou depois à varanda do Palácio e acenou vitoriosamente à pequena multidão que viera a correr até ali desde o Largo do 1o de Maio.

Ao evocar neste dia o que vivemos há quase meio século, saúdo todos os amigos compatriotas que ainda têm a ventura de poderem recordar, na primeira pessoa, aqueles tempos gloriosos.


Mas nunca esqueçamos aqueles, tantos, que também fizeram este País e que nos deixaram.

BOA DIPANDA !

* Ex-director e professor reformado da Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto