Luanda – Nos círculos da magistratura angolana, ganha força a tese de que a decisão do Presidente do Tribunal Supremo, Joel Leonardo, de jubilar compulsivamente a veneranda juíza conselheira Joaquina Filomena Ferreira do Nascimento constitui uma forma de retaliação pela queixa-crime apresentada por esta na Procuradoria-Geral da República (PGR), por alegada violação da inviolabilidade do seu espaço profissional.
Fonte: Club-k.net
O episódio que motivou a queixa ocorreu na manhã do dia 27 de Novembro de 2024, quando Joel Leonardo ordenou o arrombamento e a substituição das fechaduras do gabinete da juíza Joaquina, enquanto esta se encontrava em tratamento médico no exterior do país. Vídeos do momento da operação circularam nas redes sociais, provocando indignação entre funcionários e magistrados do Tribunal Supremo.
Na sequência, a juíza apresentou participação formal à PGR, atitude que terá causado desconforto a Joel Leonardo. De acordo com interpretações nos bastidores do sistema judicial, o presidente do Tribunal Supremo, cujo mandato termina em 2026, pretende deixar o cargo sem processos judiciais pendentes. A jubilação compulsiva de Joaquina do Nascimento seria, neste contexto, vista como uma tentativa de neutralizar o processo criminal.
Contudo, fontes consultadas pelo Club-K sustentam que a jubilação da magistrada não implica automaticamente no arquivamento da queixa-crime apresentada contra Joel Leonardo. Ainda que o seu afastamento do quadro activo do Tribunal Supremo possa dificultar a tramitação do processo, nomeadamente quanto à sua atuação como parte ou testemunha, a legislação angolana prevê que juízes jubilados mantêm vínculo estatutário com a magistratura, conservando títulos, honras, regalias e imunidades da sua categoria. A jubilação também não afeta o direito à pensão, conforme estabelece a Lei Orgânica do Estatuto Remuneratório dos Magistrados Judiciais e do Ministério Público.
Analistas judiciais sublinham ainda um eventual motivo político por detrás da decisão. Segundo esses entendimentos, com a prevista saída de Joel Leonardo do cargo no próximo ano, a juíza Joaquina do Nascimento poderia ser candidata viável à presidência do Tribunal Supremo. Assim, a sua jubilação forçada seria também uma manobra para impedir uma possível ascensão da magistrada, retirando-lhe o direito de concorrer internamente.
Entretanto, Joel Leonardo encontra-se sob investigação por alegadas práticas de corrupção, nepotismo e má gestão. A Procuradoria-Geral da República (PGR) conduz investigações relacionadas com movimentações financeiras suspeitas e alegado desvio de fundos públicos.
As acusações incluem:
Transferências indevidas de fundos: Entre 2021 e 2022, foram registadas transferências mensais de 3 milhões de kwanzas para sua conta pessoal, totalizando 21 milhões, sem base legal.
Favorecimento a familiares: Foram identificadas transferências no valor de 110 milhões de kwanzas para empresas ligadas à sua sobrinha, supostamente por serviços de limpeza e jardinagem nunca realizados.
Enriquecimento ilícito: A PGR apurou indícios de violação dos princípios da legalidade e lealdade, com suspeitas de enriquecimento injustificado.
Alguns sectores da sociedade civil e da oposição acusam o Presidente João Lourenço de proteger Joel Leonardo, alegando que o processo de investigação decorre sob sigilo, sem transparência. Apesar das denúncias e da gravidade das acusações, Joel Leonardo continua em funções, sem qualquer sanção disciplinar visível.