Luanda - Desgastado por meio século de governação muito malsucedida, marcada por elevadíssimos índices de corrupção, incompetência, saque e anti-patriotismo, e com nulas hipóteses de ganhar eleições livres e transparentes, o MPLA procura bodes expiatórios nas suas próprias entranhas.

Fonte: Club-k.net

A pretensão de Higino Carneiro de concorrer à liderança do Partido e, consequentemente, à Presidência da República é, aparentemente, o mote de um exercício de autofagia que pode culminar na fragmentação do MPLA em seitas ou bandos errantes.


O tiro de largada do movimento autofágico foi dado por João Lourenço. No dia 9 de Junho, uma segunda-feira, ele chamou ao palácio, sede da Presidência da República, uma equipa da Televisão Pública de Angola para revelar, em primeira mão, uma conversa que teve, dias antes, com Higino Carneiro, a pedido deste, na sede do MPLA.


Pela voz do Presidente, o país ficou a saber que Higino Carneiro pediu o encontro com o líder do seu partido para lhe comunicar de viva-voz a sua pretensão de concorrer à liderança do MPLA no congresso previsto para Dezembro de 2026.

O facto de ter tornado pública uma conversa havida nas quatro paredes do MPLA sugere que João Lourenço tomou como afronta a pretensão que Higino Carneiro lhe comunicou.

João Lourenço não só revelou o que era suposto ficar trancado na sede do MPLA, como destapou alguma descortesia nas alusões a Higino Carneiro.


“(...) quando aparece um militante nosso, que se apresenta como supermilitante, supergeneral, predestinado a ser Presidente da República, é algo que a gente considera muito grave. Porque aqueles que andam a dizer que não há democracia interna no MPLA deviam entender que o apresentar-se como predestinado é que é matar a democracia interna no MPLA.(...) O MPLA tem as suas regras e é um partido muito maduro. É um partido que tem democracia interna, e por ter democracia interna, é adverso àqueles que se apresentam como sendo especiais, como sendo supermilitantes, supergenerais, sobretudo quando, na realidade, se venha constatar que não são nada disso. É fácil ir-se à história de cada um e a refazermos a cronologia de tudo quanto essa pessoa fez, de bom e de mau, ao longo do tempo. Isso é fácil! É a coisa mais fácil. E muitos de nós ainda estamos aqui, ainda estamos vivos. Sabemos o que cada um fez”.


Não se sabe nem quando e em que momento o general Higino Carneiro assumiu publicamente ser predestinado a ser Presidente da República e muito menos o que estará por detrás da enigmática afirmação sugerindo que a história do antigo ministro da Construção e Urbanismo estará pejada de episódios escabrosos.


João Lourenço não só desdenha os Estatutos do MPLA, nomeadamente o capítulo em que admitem múltiplas candidaturas para cargos de direcção, como, em algumas circunstâncias confunde o Partido como sua coutada privada.

Em Setembro do ano passado, advertiu os companheiros com pretensões de disputarem a liderança do Partido que o árbitro, papel em que se coloca, ainda não tinha dado o sinal de partida.

“Ninguém começa o jogo sem ouvir o apito do árbitro, ninguém inicia a corrida de atletismo sem ouvir o tiro de partida, sob pena de ser desqualificado”.


O entendimento da generalidade dos militantes do MPLA é que o árbitro são os Estatutos e outros documentos oficiais do Partido.


A forma como João Lourenço enxovalhou publicamente o militante Higino Carneiro, membro do Bureau Político do MPLA, deu azo a que pirralhas, algumas com idade de ser filhas do general, se lhe dirijam em termos soezes. Tal é o caso de Milca Caquesse, primeira secretária do Partido do município da Ingombota, que se referiu publicamente a Peito Alto como “assanhado”.


É também por causa dessa chama acesa por João Lourenço onda que neste sábado, as ruas e ruelas de várias capitais provinciais serão tomadas por ruidosas hordas de homens e mulheres instrumentalizadas para expressarem solidariedade ao líder do MPLA, que é acossado, não por Higino Carneiro, mas pelo estado calamitoso para onde conduziu, porfiadamente, o País ao longo dos últimos 8 anos.


Este sábado exigirá de Higino Carneiro, mas também de pessoas que nada tem a ver com a renhida disputa interna, o uso de tampões.


Depois de ter ligado a “ignição”, João Lourenço empurrou o caminho que pode não ter volta.