Luanda - Existem dicionários que dão pelo menos 3 sinónimos da palavra bajulação: adulação, subserviência e graxa. Esta última, a graxa, tem uma rítmica interessante. Sobre ela tive uma vez um ataque de riso: um rapaz engraxador de sapatos, em plena baia da cidade de Luanda, para zombar na gracinha um cliente a quem retocava o brilho dos sapatos com um pano, totalmente eufórico (mais me pareceu que estivesse embriagado ou algo assim) e enquanto puxava o brilho, pronunciava o nome de um bajulador conhecido comparando-o com a sua graxa. Para ele, aquele bajulador fazia a graxa ao seu chefe tão bem quanto ele estava fazendo aos sapatos do seu cliente. Ao me aperceber que a graxa, os sapatos (botas) e a subserviência estavam interligados, verifiquei que assenta bem para os bajuladores o apodo de graxistas.


Fonte: SA


No nosso país, muitos jovens consideram que ser graxista é uma atitude inteligente de ganhar dinheiro sem fazer nada. Há mesmo quem diga que os bajuladores dormem à sobra da bananeira enquanto se submetam aos ditames do seu bajulado, como simples serventes sem honra nem dignidade. Completamente manobrados pela recompensa do bajulado, os bajuladores podem tudo: até mesmo matar o próprio filho! Não se trata de falência da moral e do civismo na sociedade, trata-se mesmo de um valor cultural que penetrou nos nossos corações como uma prática comum, compensatória e necessária para lograrmos uma vida materialmente sossegada e tranquila. São muitos no nosso país os cidadãos que encontraram sérias barreiras burocráticas montadas por bajuladores no funcionalismo público, a quem acusam de não terem sido vistos nunca a levantar um braço para gritar bem alto o viva da bajulação em reuniões ou encontros partidários por exemplo. São muitos os cidadãos que entraram em conflito com a sociedade porque foram discriminados por não serem as ditas «pessoas de confiança» dum bajulador qualquer.


São vários os cidadãos que perderam oportunidades profissionais, políticas e económicas porque não têm cara de fazer graxa a um chefe, a um líder, a um bajulado exigente, que a todo o tempo cobra da turma, bajulação, bajulação e cada vez mais bajulação. São muitos, enfim, os cidadãos que se sentem frustrados e completamente desanimados (sobretudo jovens) porque lhes são coarctadas as oportunidades como resultado da cultura bajuladora que predomina em certas instituições e organizações, dado que nesta corrida por um lugar na turma, mesmo querendo, nem todos os rendidos à bajulação singram.


 
Ao concluir esta série de textos sobre o poder destrutivo da bajulação, não podia deixar de render uma homenagem a todos aqueles que desde sempre souberam manter uma postura de rectidão e verticalidade, com uma conduta de cidadãos livres; livres no pensar, no agir e nos escritos. Homenageio ainda os que já não estão entre nós e que foram vítimas da bajulação. Aqueles que no dia-a-dia enfrentam discriminação, injustiças e humilhação porque decidiram enveredar por um caminho diferente que não o da graxa e da adulação.

 

Todavia, aos que por várias vezes tentaram ou tentam nos remeter para a ignorância, com declarações bajuladoras inventadas na hora para publicamente conquistarem pontos e marcharem gloriosos por cima das moedas pagas pelo serviço prestado, enganando-nos com elogios exagerados e aproveitadores, resta-nos apenas a denúncia.

 

 Não sei se terei feito a minha parte do modo mais correcto. A sensibilidade do tema poderá ter causado melindres e como sempre, a retaliação mais uma vez será accionada. Infelizmente, aceito que sou uma pessoa bastante vulnerável à retaliação, já a senti demasiadas vezes por culpa da escrita e da frontalidade como aprecio a mecânica de um debate. Não aposto, mas acredito que haverão bajuladores já engatilhando a espingarda com balas administrativas assassinas contra interesses meus. Não devia ser assim. De facto, o que está em causa não são os nomes, são as práticas e os actos. A bajulação no mundo inteiro é um mal social que corrói as sociedades e conduz à longevidade desnecessária dos líderes sedentos de bajulação.


Em Angola, quando um bajulador alcança os seus objectivos, geralmente enriquece da forma mais louca e assustadora, e logo se torna num animal feroz no meio dos cidadãos que o rodeiam, pois defende-se com armas da exclusão, do nepotismo, da corrupção, da violência verbal e da ameaça directa com o poder que lhes foi entregue. As maiores vítimas são as populações contra quem se insurgem em nome do bajulado feito seu deus-todo-poderoso. Ou seja; o bajulador é por natureza um oportunista. Um oportunista que usa o nome do bajulado para tomar partidos em benefício pessoal. Já assisti a um bajulador imitando o sorriso do seu bajulado em plena reunião solene. Lembram-se?


Por fim, mais uma vez destaco, não devemos confundir os bajuladores viciados, aqueles que geralmente se apressam a redigir moções de apoio, comunicados, louvores e discursam com partes fantasiadas da morfologia das palavras e da sintaxe da pronúncia - tudo amplamente copiado ou até inventado com adornos ridículos - daqueles cidadãos ou militantes de gema que apostam verbosidade e garra na defesa do chefe em quem confiam e depositam a vitória no desafio geral das lideranças.


O militante confesso e abnegado, fiel ao seu chefe, defende as melhores ideias e actos do seu líder em prol da nação; mas pelo contrário, os bajuladores - contra os quais os angolanos devem começar a lutar decididamente - defendem cinicamente regalias pessoais e cargos de destaque, sem que para tal possuam o mérito devido, recorrendo aos elogios quiméricos exagerados e à graxa.


Ao terminar o tema, faço votos que o nosso país vença a batalha do aniquilamento do espírito bajulador para que não hajam mais bajulados, bajuladores e bajuladoras em tão grande número como agora, infectando sobremaneira a nossa sociedade, e pervertendo os valores como o bem, a humildade, a modéstia, o empreendedorismo ou o profissionalismo, pondo em risco o futuro dos nossos jovens.