Luanda - Adelino António dos Santos, conhecido por Betinho, nasceu a 09 de Abril de 1955 em Quizanga, Malanje, Angola. Filho mais velho de António Ribeiro dos Santos (14.05.1926 a 08.01.2003) e de Beatriz Domingos Alves (30.09.1936), com 5 anos foi viver para Luanda, no Bairro da Mota, situado no musseque do Sambizanga.

Fonte: Facebook

"Para honrar quem foi meu pai"

Foi baptizado pela Paróquia da Nossa Senhora de Fátima (Arquidiocese de Luanda) a 10 de Abril de 1960. Cresce criado pela sua mãe, costureira, que aos 4 filhos de Ribeiro dos Santos junta mais três de Fausto Carlos Fernandes de Oliveira (07.08.1935 a 01.11.1991), pai de criação de Betinho.


Estudou no Ensino Primário São Domingos na Igreja de Nossa Senhora de Fátima, situada no Bairro do Rangel. Fez a Admissão na Escola Comercia Vicente e no Liceu Nacional Salvador Correia, onde foi admitido no ano lectivo de 1965-1966, tendo frequentado o Liceu até ao 7.º ano, ano em que foi considerado o melhor aluno do liceu.


Por ser muito bom aluno, especialmente a matemática, dava explicações de Matemática enquanto se envolvia nos movimentos de libertação nacional.


Criou uma Célula (assim designavam os movimentos clandestinos) que deu por nome de Organização Clandestina de Angola (OCA), parte integrante do Polvo, a MAKOMBE. Na OCA, dedicava-se a escrever panfletos e mais tarde um “jornal” que distribuía com os seus camaradas pelos musseques de Angola (os bairros pobres) promovendo a Luta de Libertação Nacional idealizada pelo Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) que na altura ainda não era um partido político, mas um movimento de guerrilha clandestino. Betinho também se envolveu na recolha de mantimentos e medicamentos que fazia chegar à 1.ª Região Político Militar de Angola (situada o Norte de Angola) onde combatiam as tropas do MPLA, da União dos Povos de Angola (UPA), da Frente Nacional para a Libertação de Angola (FNLA) e as do Exército Português. Estávamos em 1972.


Na noite de 21 Fevereiro de 1973 (nesta altura ainda não tinha ele 18 anos completos) Betinho é preso pela Direcção Geral de Segurança da Polícia Internacional de Defesa do Estado (PIDE) quando estava na casa dos seus pais. Havia sido denunciado pelo seu transportador, de nome "Sidónio", um agente Português Africano (como designava a PIDE aos negros que alinhavam fileiras a favor do Exército Português). A acusação que havia movido todo o processo remontava ao ano de 1972, por ocasião do 16.º aniversário do MPLA em Dezembro de 1975, quando Betinho terá, com os seus amigos, pintado os muros da cidade com dizeres alusivos à Luta Armada do MPLA.


Na última quinzena de Fevereiro, período em que Betinho foi preso, por toda a região norte de Angola, a PIDE/DGS capturou 42 indivíduos, entre eles militares, pertencentes aos agrupamentos OCA, CCSI e KILOLO que, embora actuassem isoladamente, estavam ligados ao MAKOMBE por intermédio de um elemento para cada pertencente da organização. Tal se deveu ao facto de a Direção-Geral de Segurança ter clonado uma célula composta por elementos da PIDE que se infiltrou na zona norte e territórios de actuação da 1.ª Região Político-Militar do MPLA. O Clone colhia informações quer junto de militares da 1.ª RPM, quer junto de civis envolvidos em grupos de clandestinidade. Entre os civis, o meu pai foi um dos que se relacionou, em particularmente, com o agente infiltrado nomeado por “Sidónio”; entre militares Ingo, ou General Benigno Vieira Lopes, exactamente pelas relações que mantinha com Severino, viu também comprometida informação confidencial.


Em Luanda, Betinho permanece detido num dos contentores da PIDE e em Agosto é transportado pela Polícia de Segurança Pública de Angola (Colonial) para um designado navio-de-guerra, um cargueiro, que por mar e debaixo do cacimbo da altura o leva até à Baía São Nicolau, que ficava no deserto do Namibe (na altura Moçâmedes), entre o mar e o deserto. A localização dos três campos de concentração, ou campos de instrução como preferia designar a PIDE, não permitia qualquer hipótese de fuga: de um lado o mar revolto, do outro o deserto infindável. Ali permaneciam, dormindo em casebres de 50 metros onde defectavam, cerca de 100 prisioneiros de dia obrigados a trabalhos forçados, mais intensos conforme os campos para onde tinham sido arrastados.


Com o 25 de Abril em Portugal, Betinho é liberto em Junho de 1974 e volta para Luanda. No Campo, havia obtido ordem para estudar e, ainda que finalizado o 7º ano em São Nicolau, tendo como professor Bornito de Sousa Baltazar Diogo, filho de um erudito tradutor da Bíblia Sagrada do português para Kimbundo, só em Luanda faz os exames que ditam oficialmente o término dos estudos secundários.


Filia-se nas Forças Armadas Populares de Libertação de Angola (FAPLA), combate as invasões dos Sul-Africanos e tem ordem para voltar a Luanda. Havia sido considerado um quadro apto, tinha de cerrar fileiras em outros campos de batalha. O partido atribuiu-lhe bens que, por se dedicar à vida pública, coloca-os em nome do seu pai de criação, Fausto Carlos Fernandes de Oliveira, esperando assim gerar a semente que garantiria para sempre a protecção de todos os seus.


É nessa altura, em Agosto de 1974, que, através de Horácio da Fonseca, na altura responsável de programação, conhece Artur Queiroz, Chefe de Redação da Rádio A Voz de Angola, a emissora de maior audiência a nível nacional. Sob a tutela do jornalista Artur Queiroz, cria o Kudibanguela (do Kimundo, significa construcção). É ele quem dá nome ao programa e é dele a voz do indicativo mais famosa da História da Rádio em Angola. Com outros jovens, fazem deste o programa mais popular da rádio - Kudianguela era a nação em construcção que, com o fecho d' A Voz de Angola passa a integrar a grelha da Emissora Nacional, que é hoje a Rádio Nacional de Angola.


É como co-autor e locutor de um programa de rádio que tinha a particularidade de ser ao vivo e dos espectadores nele participarem, que se destaca entre os outros para se tornar a voz do Povo, num programa que era o Hino das Massas.


Já em 1975 ingressa em Economia na Universidade de Angola. Junta-se a Nito Alves, é activistas e participante do Comité Henda e fervoroso apoiante de Agostinho Neto (da ala esquerda Maoista). Com os seus camaradas, recebe com ovações Agostinho Neto no Aeroporto de Luanda (actual 04 de Fevereiro) no dia 25 de Novembro, marcando a independência de Angola declarada a 11 de Novembro de 1975.


Nessa altura já havia contraído matrimónio, a 31 de Outubro do ano de Independência, na 4.ª Conservatória de Luanda com Umbelina de Jesus Viana da Paixão Franco dos Santos (03.02.1947) filha de José Viana da Paixão Franco Júnior (28.04.1913 a 07.01.1990) e de Ermelinda Henriqueta da Silva Viana (17.11.1913 a 05.07.200), neta paterna de José Viana da Paixão Franco Júnior e de Umbelina José Faria e neta materna de Gervásio Ferreira Viana (20.09.1989 a 25.07.1967) e de Catarina Henriqueta Silva Viana (. E porque a história não se faz de acasos, é padrinho da noiva o seu tio, Gentil Ferreira Viana (23.03.1935 a 23.03.2008) e padrinho do noivo o seu grande amigo Alves Bernardo Baptista (Nito Alves).

Estes três homens, pensadores, sendo o mais-velho Fundador da Revolta Activa, foram vítimas do partido por quem os três, lutadores, deram o sangue na Libertação da Pátria Amada.


Betinho escreve para o Jornal ABC de Angola, integra o Núcleo dos primeiros professores negros, ministrando as disciplinas de Matemática e Ciências da Natureza do 1.º Ciclo do N’Gola Kanini (Escola Preparatória João Crisóstomo), foi quadro do Banco Totta, co-autor e locutor do programa radiofónico Kudibanguela e estudante economia em regime noturno.

Integra o Departamento de Informação e Propaganda (DIP) do MPLA, que tinha como dirigentes figuras como Luandino Vieira, Hélder Neto, Ruy de Carvalho, Armando Guinapo e Beto Traça. Betinho terá apoiado acções de campanha que visavam publicações como Jornais de Parede e edições que tinham como vista a circulação do Livro.


Aquando da extinção dos Comités Amílcar Cabral, os famosos CAC's, criaram-se as Comissões de Bairro. Betinho foi Coordenador dessas mesmas Comissões de Bairro da Província de Luanda (uma espécie de laboratório que iria prepara as eleições autárquicas).

Meses antes de 27 de Maio de 1977, o programa de rádio é suspenso por ordens de Agostinho Neto. Seis dias antes do 27 de Maio, José Van-Dunem, que havia sido Comissário do Estado Maior General das FAPLA e Nito Alves, que havia sido Ministro da Administração Interna exonerado em 1976, são expulsos do Comité Central do MPLA. A meio da manhã do 27 de Maio é morto Saidy Mingas, o então Ministro das Finanças.


No dia 27 de Maio entra na Rádio e retoma o programa Kudibanguela. É dele a primeira voz que Luanda ouve às 07 horas da manhã. Nem uma hora depois ouvem-se tiros e vozes cubanas. Por entre a multidão às portas da Rádio Nacional de Angola, Betinho consegue fugir.
Fica a monte mês e meio até ser denunciado por um familiar. Numa cabana de pescadores, na zona onde na altura só haviam lavras, no Golfe, é capturado, preso e torturado. Aparece na Televisão Pública de Angola todo machucado num acto manipulado de assumpção de culpas do golpe.


A 24 de Junho deixa a Fortaleza de Luanda para ser fuzilado, depois de ter permanecido semanas sobre tortura nos calabouços do Ministério de Defesa. Não há nenhum registro de que alguma vez tenha ficado na Cadeia de São Paulo. Tinha 22 anos quando lançado em vala comum. O seu irmão mais novo, José António Ribeiro dos Santos "Zezinho" (02.12.1959 a 15.12.1995), também ele militar das FAPLA foi chamado pelos oficiais da DISA para acompanhar Betinho até ao campo da morte. Não sabendo que iria encontrar o seu irmão, Zezinho foi quem lhe deu a mão até ao momento em que tomba em Vala Comum.


Avanço do projecto de livro biográfico do meu pai: «As Vítimas Têm Um Nome: As histórias e as lutas do meu pai Betinho»


Esta história é a que escrevo, já com 100 páginas e documentos de arquivo, reportagens de jornal, fotografias e depoimentos recolhidos desde 2019 que pretendo publicar numa editora leal, focada no leitor e não nas directrizes de qualquer partido ou órgão político.

Lisboa, 04 de Fevereiro de 2021
Ulika Gisela Paixão Franco Santos