Maputo - O ANC quando elege o seu Presidente escolhe simultaneamente o seu “Vice” que automaticamente se torna no sucessor presidencial. O “Vice” a nível do partido não tem poderes. Depois do Presidente a figura mais poderosa do ANC, é o Secretário Geral (SG) que também é eleito em listas diferentes. Este modelo de eleição permite ao partido ter um numero “três” que não seja alinhado ao líder como é o cenário que se esta a viver presentemente. O SG do ANC, que acaba de ser suspenso, é um defensor acérrimo do antigo Presidente Jacob Zuma.

Fonte: Club-k.net

A ELEIÇÃO DE CYRIL RAMAPHOSA

Em Dezembro de 2017, o ANC organizou a sua 54ª Conferência Nacional (equivalente a congresso) para eleger o novo líder. Jacob Zuma já não podia concorrer (uma vez que foi afastado pelo partido) mas colocou como candidata a antiga esposa, a senhora Nkosazana Dlamini-Zuma, 71, que é médica de profissão, ex-ministra da saúde, ex-ministra dos negócios estrangeiros, e etc.

 

Cyril Ramaphosa, o então vice-Presidente, era candidato apoiado pela ala conservadora que procurava salvar o ANC. Muitos entendiam que Cyril Ramaphosa seria a figura certa para devolver a dignidade ao Estado sul africano por ser alguém que não esteve envolvido em corrupção, e que andou ausente durante 20 anos dedicando-se aos negócios privados, depois de ter sido SG do ANC, de Nelson Mandela. É uma figura de prestigio e que os mercados financeiros reagem bem a ele, por transmitir segurança. Conta também, o facto de ser um dirigente que era da estima de Mandela. Foi o primeiro dirigente do ANC que avistou Mandela nos primeiros contatos secretos antes do líder histórico sair da prisão. Mandela era fascinado por Cyril Ramaphosa.

 

Neste congresso, a corrente de Jacob Zuma que beneficiou dos grandes negócios estava muito forte e queriam continuidade. Nkosazana Dlamini-Zuma, a concorrente opositora a Cyril Ramaphosa, é de etnia zulu e estes são a maioria.

 

Os dois candidatos estavam em pé de igualdade no congresso. Uma hora antes do acto da votação, o então governador provincial de Mpumalanga, David Dabede Mabuza que era apoiante de Jacob Zuma, anunciou ruptura com o seu amigo fazendo um pacto com Cyril. Apelou votos a Cyril Ramaphosa em troca pediu que lhe dessem a vice-presidência do partido. O apoio do influente David Dabede Mabuza fez toda diferença e Cyril Ramaphosa ganhou com 51,90% dos votos enquanto que Nkosazana Dlamini-Zuma teve 48,10%. A ala de Zuma não perdoa a traição de Mabuza.


CASO VICE-PRESIDENTE DAVID MABUZA

O Vice-Presidente David Mabuza é tido como antecedentes. No passado, já foi acusado de corrupção e envolvimento em fraude de licitações. Em agosto de 2018, o New York Times publicou um artigo investigativo acusando-o de ter “construído uma rede de patrocínio político em Mpumalanga ao conceder contratos corruptos para construir escolas na província durante o seu tempo como governador, construindo assim a sua base de poder dentro do ANC às custas da prestação de serviços de educação pública pelo governo”.

 

O que se diz na África do Sul, é que no último congresso, David Mabuza virou as costas a ala de Zuma apoiando Rhamaposa, para se tornar vice-Presidente e ganhar proteção das acusações que lhe eram feitas. Presentemente, ele dirige a comissão de reforma agraria do país. Tem estado muito calado. Diz-se que é para se esquecerem dele.

LUTA CONTRA CORRUPÇÃO

A África do Sul continua a enfrentar problemas de corrupção tendo em conta que os “barões” ou o grupo ligado a Zuma mantem-se dentro do partido e tem sentido alguma dificuldades em se movimentar visto que no último congresso Rhamaposa, declarou combate contra a corrupção. Por outro lado, o Presidente Rhamaposa tem sido criticado por manter sob a sua saia os “corruptos” ligados ao seu antecessor.

 

No dia 23 de Agosto de 2020, o Presidente Rhamaposa escreveu uma carta aberta (de sete paginas) aos militantes do ANC atacando a corrupção. Rhamaposa pediu uma ação a ser tomada dentro do partido, pelos seguintes pontos a saber:

1.Rhamaposa pediu que todos os membros acusados ou relatados de estarem envolvidos com práticas corruptas para prestarem contas ao comitê de integridade do partido.

2.Aqueles que deixarem de dar uma explicação aceitável, ou que não renunciem voluntariamente os seus cargos enquanto enfrentam ação disciplinar, serão suspensos

3.O partido deve se dissociar publicamente de qualquer pessoa, seja doador, apoiador ou membro, acusado ou denunciado de envolvimento em corrupção.

4.Os membros do ANC devem fazer declarações regulares dos seus interesses financeiros.

5.Auditorias aos estilo de vida para todos os líderes e gestores públicos ligados ao ANC

6.Desenvolver uma política clara de regulamento para os líderes do ANC e seus familiares que fazem negócios com o estado.

7.Dar apoio administrativo e jurídico à Comissão de Integridade do ANC.

A carta de Cyril Ramaphosa provocou reações diversas. O antigo líder Jacob Zuma endereçou no dia 28 de Agosto, uma carta privada respondendo ao Presidente mas ao mesmo tempo pedindo que ela não se tornasse publica. Que fosse apenas partilhada pela estrutura máxima do partido. Foi a primeira vez que um ex-chefe de Estado sul africano atacasse o seu antecessor. A carta vazou para os jornais provocando furor.

REUNIÃO DO PARTIDO.

No dia seguinte após a divulgação da carta de Jacob Zuma, o ANC reuniu o seu comitê nacional executivo (NEC, na língua inglesa) cujas discussões foram afloradas a volta da carta de Cyril Ramaphosa ao combate a corrupção.

 

Ramaphosa reafirmou que a sociedade estava encarar o ANC como um partido de corruptos e que com isso, nas próximas eleições, alguns grupos como as igrejas se sentiriam desconfortáveis em fazer campanha para o partido. Apelou para que os órgãos do partido resolvessem a questão de afastar dirigentes acusados em corrupção. O Presidente foi amplamente aplaudido no discurso de erradicar a corrupção nas fileiras do partido.

 

Por outro lado, nesta reunião, um membro do NEC do ANC, Tony Yengeni apelou a Ramaphosa, a dar ele o exemplo renunciando o seu cargo devido às acusações em torno das doações que recebeu a volta da “campanha CR17”. CR17 é o nome que se da a campanha eleitoral que elegeu Cyril como líder do partido. CR são as iniciais do seu nome e 17 corresponde ao ano de 2017, em que ocorreu o congresso.

 

Tony Yengeni que pediu a cabeça do Presidente, é um membro que no tempo do regime do apartheid recebeu formação militar em Angola, Zâmbia, Bostwana e se formou em ciências sociais na antiga União Soviética, em 1982. Ele é notabilizado pelo seu histórico de detenção e torturas pelo regime do apartheid e também por ser dos raros pesos pesados do ANC que já foi condenado por corrupção, dai a sua “revolta”.

A SUSPENSÃO DO SECRETÁRIO-GERAL

Até ao congresso de 2017, Elias Sekgobelo "Ace" Magashule era o governador provincial da província sul africana de “Free State”. Em Novembro de 2020, ele teve de pagar uma caução para não ser detido devido a uma acusação de desvio de verbas do sector da agricultura ao tempo de governador provincial. No inicio de Abril, o ANC deu 30 dias a todos os dirigentes para que se afastassem voluntariamente dos seus cargos. Terminado o prazo, o comitê nacional do partido anunciou esta semana a suspensão de vários membros com destaque a do Secretário-Geral do partido, "Ace" Magashule. Este rejeitou inicialmente alegando que a sua adjunta, Jessie Duarte que fez a declaração da suspensão não tinha poderes para o faze-lo.


Em forma de contra-ataque, Magashule anunciou também que ele próprio acabava de suspender também o Presidente, Cyril Ramaphosa, levando com que deputados da oposição solicitassem um esclarecimento se de facto a líder do partido no poder estava suspenso do cargo.


O SG do ANC, não tem poderes para suspender o líder do partido. O presidente do ANC só pode ser suspendo por uma maioria de comitê nacional após alguma irregularidade. Depois disso cabe ao SG informa-lo da suspensão. Portanto, a medida de suspensão de "Ace" Magashule contra o líder do partido é invalida. Ele esta sem apoios para mover uma campanha interna para o afastamento do Presidente, Cyril Ramaphosa. Apenas conta com o apoio de dois ministros e do antigo deputado Tony Yengeni.


Este deverá ser o fim político do poderoso Secretario Geral, "Ace" Magashule que não percebeu que desde 2017, o ANC tem um novo líder que se chama Cyril Ramaphosa, e não Jacob Zuma, a quem ele manifesta uma certa devoção.