Luanda - Para esta edição de entrevista com professores de literatura, fomos ao encontro do docente do ISCED de Luanda, o também escritor Abreu Paxe, com ele abordamos várias questões que afligem a literatura angolana, alguns conceitos, polémicas e sobretudo as expectativas enquanto docente.  

 

S.A Professor, como é que faria a descrição da historiografia das gerações literárias angolanas?

 

A.P- Este é um trabalho gigantesco. Não é? Mas, usando a memória e num exercício de quem caminha imprudentemente, podia dizer que existem nas descrições historiográficas da nossa literatura uma primeira e importante fase que caracteriza os momentos primeiros da poesia, ou seja, da literatura angolana. Estes momentos escritos, por um lado, entre os testemunhos de António de Oliveira Cadornega, nos quais se lê que os primeiros momentos da literatura inscrevem-se com os textos em verso de António Dias de Macedo. Por outro, nos testemunhos do historiador Albuquerque Felner que traz dados contrários, ao escrever que os primeiros momentos da literatura inscrevem-se com os Jesuítas ao organizarem o primeiro concurso de poesia e também ao introduzirem a cadeira de métrica em poesia, creio que seja isso, administrada nos colégios de S. Salvador do Congo e de Jesus de Angola, tudo isto com registos anteriores aos fornecidos por Cadornega. Mas, acima de tudo isso, a meu ver, há uma fase fundamental que eu acho mesmo crucial, sei lá talvez seja isso, que foi a fase em que se publica ou se divulga a primeira obra, o ano de 1849, quando José da Silva Maia Ferreira, torna pública pela primeira vez na África Lusófona, senão mesmo na Francófona e na Anglofona, a sua obra poética intitulada Espontaneidade da Minha Alma. Este, e o período que se segue foi marcado com uma intensa actividade jornalística e a literatura desenhava-se nesta mesma actividade até a publicação, num período de mais ou menos quarenta e nove anos, um segundo livro Scenas de África e também o Sorrisos e desalentos de Pedro Felix Machado. Vencidas estas, também, importantes etapas e que duraram um longo tempo, saltamos para os séculos XX e XXI, para podermos reconhecer escritores como Assis Júnior e outros poucos orientados pelo nativismo para depois presenciarmos, então, uma geração que se revelou muito activa e que estruturou e deu larga dimensão àquilo que nós podemos considerar, a nosso ver, assumindo todos os riscos que isto pode suscitar, os aspectos modernos da literatura, falamos da geração de 40 e 50, com o projecto “ Vamos Descobrir Angola!”, passa-se depois para a fase daquilo que precisamente se denomina de literatura de guerrilha. E de forma precipitada o que se veio a denominar por gerações de 70, 80 e 90, e outras gerações como precipitadamente a meu ver foram designadas. Em linhas gerais a literatura Angolana é mais ou menos desta forma que se pode descrever. Ela já tem em minha opinião um rosto, e nós só precisamos é de definir e dar forma própria com os nossos instrumentos a este rosto que nos permitiria vigiar e preparar melhor, aquilo que seriam os aspectos posteriores para a sua correcta leitura.


S.A- Porquê que diz que algumas gerações literárias, foram adjectivadas de forma precipitada e quais são estas gerações professor?

 

Eu acho precipitada, porque a Literatura Angolana como realidade escrita é culturalmente marcada por dois períodos: um primeiro período em que ela é produzida sobre o manto colonial com dois segmentos, por um lado, os reprodutores dos ideais, sonhos e utopias coloniais e, por outro, os nativistas e/ou nacionalistas. E depois, um segundo período que é o do pós Independência não é? E então, como é que se explica ter-se um projecto de literatura surgido no pós Independência propriamente em 1975, e a partir daí criar-se já gerações. Não vislumbro bem isso, não sei, eu acho que é qualquer coisa que os estudiosos deviam se debruçar com mais atenção, cuidado e seriedade e poderem mais ou menos vigiar isto, acho particularmente que qualquer atitude de construir gerações, a meu ver sobre a Literatura Angolana ou qualquer outra, no período 75-90, pode-se considerar precipitada, porque não é num intervalo de dez anos que se pode fazer gerações literárias ou qualquer outra, que se pode construir uma memória identitária, penso. No que se refere a este período, prefiro seguir a proposta de trabalho apresentada por Helena Reiuzova. Na verdade em média faz-se uma geração em 15-20 anos e não, por exemplo neste período, falar-se em duas, três: a transição dos anos 80-90 e a seguinte. 


S.A- Há um outro fenómeno que podíamos depois analisar, que é do período pós independência, isto é de 1975 até a década de 90, Havia uma produção literária com alguma pujança e regularidade, com a União dos Escritores Angolanos a se destacar, a Brigada Jovem de Literatura Angolana, também com um papel decisivo neste domínio, e por vias desta pujança havia também uma crítica literária regular, hoje o quadro é algo diferente, apesar de haver uma produção literária, com o senão de não haver um elemento fundamental e que seria em nosso entender o barómetro para aferir a qualidade literária que é a crítica literária, qual é a sua virtude de razão a este respeito professor?

 

A.P- A crítica literária deve fundar-se sobretudo, a meu ver, na academia não é? Há outras instâncias de validação literária, como os jornais, a Média, de uma forma geral, a própria academia, os júris dos diversos concursos literários. Os concursos literários continuam, embora uns de forma intermitente, a academia está a dar os seus passos. Vamos ver se isto se vem a consolidar e tenho fé que se vai consolidar. Hoje, já são visíveis alguns esforços que estão a ser empreendidos por parte do ISCED de Luanda nos Cursos de Letras e na Faculdade de Letras de UAN. Os resultados que se têm estado a apresentar, incluindo os cursos de mestrados e de pós-graduações, neles podemos antever que num futuro próximo teremos provavelmente especialistas que há-de abordar de forma mais profunda, ou não tanto, mas séria, a Literatura Angolana. O ISCED de Luanda, está a fazer isto, se bem que a actividade do ISCED, não é propriamente de formar investigadores de literatura, mas sim docentes de literatura, embora a actividade deste último também resulte de uma prática de investigação. Ou seja, o ISCED de Luanda tem um curso de Língua Portuguesa cujos perfis de saídas são: linguística ou literatura via ensino, os estudantes saídos em literatura para a ensinarem e como investigadores abraçam, ou a crítica ou a teoria literária ao contrário do que muitos pensam.

 

 Por outra, há um trabalho a registar, feito pela professora Gabriela Antunes, um trabalho feito de forma quase isolada e limitada pelas razões que nós conhecemos, esta iniciativa foi fundamental no curso de Jornalismo no IMEL, tão importante que hoje, pode-se ver alguns resultados deste trabalho. Recuando ainda naquilo que pretendeu saber sobre a pujança da geração de 80, em termos de produção versus qualidade e quantidade e, sobretudo, à crítica, gostaria de dizer que se trata de períodos diferentes. Se estabelecermos a comparação entre aquele e o actual, vemos que o país mudou: saímos do estágio da guerra para o da paz, saímos de um regime de partido único para o multipartidarismo, saímos da economia centralizada para a economia de mercado, entramos na era dos Shopping centers, saímos do processo quinhentos para a era do kandongueiro. E estão a surgir, cada vez mais, desafios maiores para o país, não é? A UEA, não tinha o número de membros que tem hoje, a UEA, não tinha a quantidade de obras editadas em termos de catálogos em relação as que se edita hoje, a UEA, não se confrontava com os desafios do mercado que enfrenta hoje. Então, quer dizer que a própria dinâmica social, também impõe uma certa regra, ou seja, regula determinados procedimentos, este ritmo de produção que diz que é, por um lado, escasso e, por outro, de pouca qualidade surge em primeiro lugar pela herança defeituosa que tivemos no quadro de formação, marcado por este mesmo período a que se referiu; sem escolas, se houvesse escola não havia carteira, se houvesse carteira e escola não havia professores e se houvesse professor a qualidade destes era muito duvidosa, enfim. Trata-se das vicissitudes que o país foi vivendo, não é? Estas foram alimentadas pela guerra e outros males que ainda nos consomem.

 

 Entretanto, a literatura, como se estrutura a partir de muitos destes fenómenos, não podia, não pode, deixar de evidenciar sinais de fraqueza, que parte deste princípio estruturante, por parte dos seus actores sociais, e nisto incluo o próprio processo de produção e abordagem da Literatura Angolana, mas isto não significa que não se esteja a fazer nada ou que nunca se fez nada, em termos de produção artística ou mesmo de crítica literária que possa ser a continuidade daquilo que competentemente foi feito por parte de alguns poucos (da geração de 70 e 80) ou da década de 80 - mais um vez o problema das gerações - aquilo que tentaram apresentar como rosto visível e competente no domínio da Literatura Angolana escrita. É verdade que o exercício crítico a que nos fomos habituando deixou muito a desejar, por ser exercido de forma puramente valorativa, quer dizer, uma espécie de grelha em que o pseudo-crítico se arma de alguns argumentos teóricos que muitas vezes não controla para estabelecer o critério de verdade e de valor por analogia ou comparação, apresentando uns como aceites e outros como não, a partir de uma matriz exemplar forjada de forma dúvidosa. Na verdade, não é por esta via que gosto de ver o exercício da crítica, mas sim pela via em que o crítico se torna naquele sujeito que, por um lado, nos mostra os mecanismos que conferem artisticidade ao texto e, por outro, como estes mecanismos funcionam e se combinam à luz da arte. O inventário destes mecanismos seria o resultado daquilo que conferiria a presença de arte ou não, num determinado texto por mais estranho que este possa parecer e também reduzir o princípio normativista que advoga o princípio de que as peças artísticas por mais diferentes que sejam devam funcionar em padrões pré definidos. Daí, pensar para concluir que não se deve confundir as coisas, porque, na verdade, se o exercício crítico fosse outro de certeza teríamos um trabalho consequente e sistematizado e não um trabalho intermitente, inconsequente, as vezes, como se foi verificando, dando força e vitalidade suprema a crítica praticada no Brasil em Portugal e noutros pontos do mundo pelos estudiosos das nossas literaturas nestes países. 


 
S.A- Quais são os autores que se pontificam nas várias gerações, apesar de não ser partidário das denominações destas gerações que diz serem algo precipitadas, estamos a falar da geração da Mensagem, da geração da Utopia, quais são os autores que mais se pontificam professor?

 

A.P- São sobejamente conhecidos e não estaria a fazer nada de novo se decidisse apresentar em pauta estes nomes. Para mim, isto não se constitui na maior preocupação, eu vou dizer-lhe já, e até porque você disse a pouco, que não há crítica, e não se fazem ensaios, também acho que seria para mim um tanto ou quanto precipitado estar avançar nomes, mas as boas proposta, as muito boas propostas literárias no domínio das várias temáticas, existem e ligam escritores de diferentes períodos num todo coeso e funcional no domínio da arte. Para mim, isto sim, pode funcionar e estruturar melhor a nossa memória literária. De resto seria agrupar amigos, compadres e outras formas de se sentirem integrado em determinado meio, sem o merecer. Podemos ter um conjunto de bons nomes, não é? Se bem que pronto, para aquilo que é a critica literária ou o próprio procedimento de ensaio, há alguns que se destacam mais do que os outros, por meios que por vezes nós não conseguimos controlar ou compreender, mas na verdade, sem cair na tentação de tentar avançar nomes, acredito que o texto literário Angolano desde os seus momentos primeiros de formação literária até aos dias de hoje, continua a ter propostas interessantíssimas em termos de produção literária, aspectos que a meu entender, são dignos de serem exaltados, e inventariados, é uma pena que nós ainda não temos uma academia forte, à altura daquilo que é já a grande produção literária que Angola tem. Mas pode ficar descansado, que nós temos sim bons escritores que podem figurar ou serem estudados em qualquer manual de teoria literária universal.


S.A- Professor, gostaríamos de lhe convidar a abordar o tema da angolanidade na literatura, pode-se falar de angolanidade na nossa literatura, como e porquê?


S.A- Não! Não posso falar disto, porque é um conceito que eu não domino, eu ainda não vi definido este termo. A sua não definição torna perigosa a sua aplicação no campo da literatura ou em qualquer outro, pelo facto de poder proporcionar exclusões involuntárias e pouco sérias, ou mesmo aconselháveis. Para mim, qualquer intenção que se tenha de se construir uma epistemologia com base neste conceito, o que eu gostaria primeiro, é na verdade, de ver este termo definido, dizer o que é isso de angolanidade ao lado do endógeno, por exemplo e ao definirmos angolanidade, entraríamos num terreno ligado à definição de etnicidade, de identidade ou de outras coisas assim parecidas, como olhar a língua portuguesa em convívio com as outras línguas de Angola. Como olhar os traços culturais que herdamos do colonizador em convívio com os outros traços culturais dos antigos reinos desta imensa Angola. Se, se tem dificuldade em se definir angolanidade, poderá haver, de certeza, dificuldades de abordar a literatura angolana na perspectiva da angolanidade, porque angolanidade pode-se fundar na memória histórica, como pode-se fundar nas práticas hodiernas, na contemporaneidade, mas com um sentido de unidade por mais diversificado que sejam os textos culturais que fazem o texto da angolanidade. Ou seja, pode tratar-se de um texto de fronteira, marcado pela fronteira que pode representar a língua portuguesa ou a configuração actual do território que se chama Angola. Vejo isto numa visão semiótico-cultural. Mas o quê que é isto de angolanidade afinal de contas? Enquanto nós não conseguirmos visar o rosto da angolanidade nos seus traços mais peculiares de certeza que vamos continuar a ter dificuldades e vamos de certeza revelar um certo pedantismo, não é? Então e os outros? A portugalidade, a brasileiridade, americanidade, onde é que andam nestas literaturas, se olharmos de uma forma mais genérica para as estruturas antropológicas do imaginário, ou seja, a forma como nos vamos identificando com os outros povos? Na verdade, é preciso ter isso em conta sem se esquecer da própria particularidade em si da nossa Literatura, da nossa História, sem esquecer a nossa especificidade como povo, não é?


 Isto não pode ser visto de ânimo leve, dado que a própria literatura tem um método ecléctico para a sua abordagem, se bem que o valor estético é o primordial, e este valor estético e o próprio processo eclético, que se juntam as vezes aos aspectos ideológicos regulados pela não estéticidade, concorrem precisamente para aquilo que eu diria a busca do universal, porque o homem é um ser universal, um bom poeta em Angola pode ser um bom poeta em qualquer parte do mundo, e que valores determinariam este bom poeta aos olhos do mundo? Seriam os da angolanidade literária? Acho que é preciso que se busque nisso um certo relativismo, regulado pelos princípios universais, ou seja, glocais para que um angolano, um camaronês, um chinês ou qualquer outro escritor, o seja de forma particular e universal, ou seja, deve definir-se ou pautar pelos princípios universais, embora parta sempre do espaço onde ele estiver. Aliás, o princípio que defendo é partir daquilo que nós somos e tentar conhecermo-nos porque nós não nos conhecemos a nós mesmos, por isso é que dificilmente falamos de nós, e quando nós estamos a falar de uma angolanidade, estamos quase a revelar o mesmo desconhecimento que nós temos de nós, porque cada vez que falamos de angolanidade menos nos definimos, menos nos conhecemos, nós sensação. Então, acho que se calhar o esforço seria o de tentar definir isto para ver se pelo menos nos conhecemos e daí partamos seguros para o todo universal.

 

S.A- Há também uma questão algo intrigante, que tem a ver com a comissão multidisciplinar, criada em 2005, para trabalhar na escrita da literatura angolana, que teria de apresentar um draft, em 2009, que infelizmente não foi apresentado e não houve até agora tanto quanto sabemos uma justificação pública, tal com foi amplamente anunciada a constituição da referida comissão, algum dado que nos possa ajudar a dissipar, alguma incompreensão neste domínio ….

 

A.P- Eu faço parte desta comissão sim, ou fiz já não sei, recebi o convite por escrito em forma de carta para fazer parte da comissão, assisti, se tanto, a uma reunião apenas da coordenação geral e umas poucas da subcomissão em que estava. Nunca mais participei em qualquer outra reunião, assisti a outros encontros ligados a este processo, mas nunca tive, pelo menos, oficialmente qualquer tipo de informação a respeito de como é que estariam a decorrer os trabalhos, a informação que você acabou de me dar agora, que teria que se apresentar um draft em 2009, só demonstra que você está no que diz respeito a esta matéria melhor informado que eu, que sou ou fui membro da referida comissão, fora desta informação, não tenho praticamente nada a dizer a volta daquilo que na verdade é o resultado dos trabalhos que decorreram ou decorrem sobre a comissão criada para redigir a história da literatura angolana, porque, sei que fui convidado como membro, mas até ao momento que estamos a falar, não sei se a comissão já foi extinta ou se não, se funciona ou não. E se funciona, como é que funciona, não tenho por parte do Ministério nenhum tipo de informação sobre a qual pudesse fazer juízo, como pretexto de saber como andam ou estão os trabalhos à volta da história da literatura angolana. Por isso, é que devo concordar consigo em que o Ministério da Cultura tem responsabilidades de, publicamente, dizer aos angolanos em que pé anda a história da literatura angolana. Nós precisamos ter esta informação.

 

S.A- Em termos editoriais, nós temos editoras competitivas, que ajudam de alguma forma a criar incentivos aos caloiros da literatura, do ensaio e da própria crítica literária, em seu entender como é que estas editoras deviam agir?

 

A.P- Não! Eu não estou em condições de poder orientar metodologicamente qualquer editora, porque até confesso que não percebo bem este tipo de serviço, o das editoras, mas a literatura funda-se por critérios e métodos não é? Então o escritor deve guiar-se por esta linha, cada um sabe por si só as razões que o levam abordar o mundo da arte, mesmo não dando dinheiro, o mesmo serve para as próprias editoras que também apostam em editar livros neste domínio, também sabem o quê que buscam nisto. Ou seja, não é um problema das editoras ajudarem, se calhar o que eu acho e o mundo tem N, exemplos disso, é que estas não são propriamente instituições filantrópicas, na verdade há escritores que começaram, quase desastrosamente por terem sido rejeitados por determinadas editoras vigiando qualidade por meio de lucros.

 

 Estes escritores muitos vieram a revelar-se como grandes autores da literatura universal. Entretanto, eu não sei bem até que ponto as editoras podem ajudar ou não, pelo facto de vigiar os casos daqueles que foram rejeitados por incompreensão e depois acabaram por ser descobertos como grandes valores, foi precisamente por causa das limitações que a capacidade humana gera que fez com que as editoras sejam sempre assessoradas por mesas de leitura, onde há um corpo de leitores especializados que é instituído para poderem se debruçar sobre a qualidade dos trabalhos apresentados e cada leitor ter os seus critérios, para dizer o que é que vai valer ou deixar de valer, ou seja, o que funciona ou não funciona.


Agora de que forma é que uma editora podia ajudar os jovens? Eu acho que os jovens não precisavam de uma editora como o ponto de partida, quando na verdade se pretender um trabalho oficinal, para este tipo de apoio é preciso que se filiem nas organizações juvenis como a Brigada Jovem de Literatura de Angola, ou então participem de concursos literários que no fundo servem de incentivo para os jovens iniciantes ou ainda ao concurso primeiro livro da União dos Escritores Angolanos, que se realiza todos os anos, onde os jovens podem aparecer e apresentar a sua obra, ou ainda, fundamentalmente participar de oficinas literária de prática de escrita criativa ou de introdução ao texto literário. É evidente que são escasso estes meios, entre nós, sobretudo, por um lado, pela quantidade de jovens que têm vontade de escrever e de se revelar no mundo da arte e, por outro, a forma como o governo ou outras instituições afins encaram esta situação que a nosso ver é muito séria e preocupante. Mas acho que não seria muito prudente, falo isto talvez como resultado da minha inexperiência neste domínio, seria muito imprudente uma editora transformar-se num centro didáctico ou num centro de experimentação literária ou mesmo numa oficina de ensaio ou de experimentações literárias, não é? Apelando a todos os jovens a lá irem para, como quem diz: vamos editar, ou experimentar se os jovens vão dar ou não. Se o próprio produto arte em si, mesmo que tenha qualidade, já não vende tanto, agora imagina colocado na perspectiva de ir ajudando os jovens que queiram se revelar como escritores, não sei se percebi bem a sua questão, mas se a intenção for esta não sei se alguma editora resistira num mercado como o nosso ou em qualquer outro.

 

S.A- Que leitura faz da frase a geração das incertezas, defendida pelo ensaísta literário Luís Kandjimbo?

 

A.P- Não sei, eu acho que o Kandjimbo estaria em melhores condições de explicar isto. Para mim o fundamental é que a literatura tem um princípio de ela ser regulada por método e pelo fundamento. Sempre que se marca uma posição deve-se anunciar o método que se seguiu e os fundamentos que o guiam, não é? Geração das incertezas como é que se pode definir isto? O que é isto de incerteza? Pelo menos o creolismo, por mais contestado que possa ser, está definido e demonstrado na literatura. É, pois, preciso mostrar isto “geração das incertezas” no texto literário e dizer em que ângulo, é que, isto está a ser analisado, se é numa perspectiva sociológica, linguística, semiótica, política, enfim, é uma questão de dar precisão ao conceito operatório que se usa, para se ver se pode ou não funcionar e como é que isto se fundamenta no plano teórico.

 


Por outra, a respeito disso, tive informações mais recuadas de um mais velho que me disse que o fundamento disto estava no facto de os jovens pelo trabalho artístico que estavam a apresentar, se estavam a revelar numa geração de incerteza. Na verdade o país tinha já uma certeza, tinha um rumo e uma direcção, fundadas numa ideologia e o que se podia produzir tinha que se estruturar nisso, os jovens em termos de propostas e práticas literárias quando começam a deixar de seguir este rumo que o país tinha seguido e a ideologia que o orientava quase que numa prática de antecipação política no domínio da prática literária, ou seja, aquilo que se produzia em literatura ajudou a estruturar a orientação política do país. Então começaram a revelar, sob este olhar, incertezas, não sei! talvez seja isto, talvez não. Mas eu acho que se o Luís Kandjimbo trouxe isto, para a cena literária, deveria precisar melhor, porque eu também não consegui perceber bem, a essência deste termo naquilo que seria então o quadro teórico para abordar os textos dos jovens escritores angolanos e não só. Isto que eu disse está, a meu ver, bem definido num trabalho do professor Francisco Soares.


S.A- Enquanto professor, normalmente os professores têm o condão de dar concelhos, que conselhos é que deixaria aos estudantes e os amantes da literatura e que têm como pretensão aderir para crítica literária e a escrita de uma forma geral?

 

S.A- Leituras, só leituras mesmo e fazer sempre um grande esforço de aliar este processo a formação académica. Acredito que não há crítica literária que vinque se não estiver associada a um projecto académico ou de leituras orientadas dentro ou fora destas instituições, os jovens têm que continuar a ler, e continuar a perseguir a formação académica, e que não anulem, as leituras que surjam fora do âmbito académico e do conhecimento, têm que visitar com frequência as bibliotecas, sabemos que são poucas, mas visitem estas poucas que temos, devem também visitar museus, enfim devem estar no centro do saber. Mas a etapa mais prudente de se exercer a crítica ou a própria actividade ensaística ou a produção literária é a leitura associada as actividades académica na área de artes e letras ou outras afins.  


*Cláudio Fortuna